segunda-feira, 18 de abril de 2016

Discussão vs. Debate


   Vivemos um momento complicado aqui no Brasil. Embora haja problemas de ordem econômica que são muito sérios, penso mais nas questões políticas.
   A maior dessas questões, pelo menos de modo declarado, já que outras andam pelos submundos políticos que não nos são dados a acompanhar, é a do impeachment da presidente Dilma.
   O que tenho visto de pior nesta questão não é exatamente o fato de estar correto ou não proceder ao impedimento da presidente. Isto terá seu local adequado de análise e decisão. O que me parece mais preocupando é que os dois lados "emburreceram", apoiados nas suas crenças. Não há mais diálogo, o que há são meras repetições de clichês elaborados por algum ideólogo. E se segue declarando aquilo vezes e mais vezes, como isto pudesse transformar uma versão em verdade. Mil pessoas falam, mas só se ouvem as mesmas coisas de um lado e de outro. As ideias não foram elaboradas, pensadas e escolhidas, são apenas "mantras". E contra um mantra não há argumentos, só se recita aquilo, como se aquelas palavras tivessem o mágico condão de realizar algo.
   Estive lendo Karl Jaspers, no seu livro muito básico, Introdução ao pensamento filosófico, e me pareceu ter encontrado um texto que explica bem esse nosso momento. O título é "Conhecimento e Juízo de Valor".
   Faço a ressalva, aqui, da confiança, aparentemente, cega na existência de uma "verdade", por parte de Jaspers. Mas o texto admite uma certa flexibilidade interpretativa de nossa parte, sem pretender feri-lo mortalmente. Além do que, o que quero destacar com mais força é a diferença entre "discussão" e "debate".
   Selecionei livremente alguns trechos do texto.
   "A verdade, que é válida para todos, distancia-se muito da convicção, que é a verdade de que vivemos no momento. [...] Não temos o direito de exigir que nossas convicções pessoais sejam admitidas pelos outros. [...] A multiplicidade das convicções em choque nos afeta a todo instante. Confrontados com oposição e hostilidade temos de tomar uma decisão fundamental: admitimos ou não admitimos que todos partilham de uma humanidade comum? Se o admitimos, não há por que tratar os que pensam de maneira diferente da nossa como inimigos. [...] [Se] Nós e o outro não queremos a mesma coisa [...] devemos calar-nos os dois e recorrer à violência - na vida comum, à força física de nossos músculos e, no debate, à violência intelectual, que é o sofisma? Nossa humanidade comum pede algo diferente: se a verdade parece múltipla, devemos tentar esclarecê-la. Isso requer energia intelectual e disciplina. Em vez de nos obstinarmos a afirmar nossa opinião, buscamos razões. [...] Numa discussão hostil entre indivíduos inflexíveis, cada qual busca impor sua opinião ao outro; num debate aberto entre indivíduos esclarecidos, ambos querem assegurar-se da posse da verdade. Esse tipo de diálogo - método civilizado de encontrar caminho comum, mesmo quando há oposição entre os que o procuram - exige o preenchimento de certos requisitos básicos ".
   Jaspers continuará tratando do conhecimento científico, e aí estabelecerá os tais requisitos. Esta parte, contudo, não nos interessa em especial, pois seria metodológica. Priorizamos aqui o aspecto fundacional da questão, a intenção maior em procurar esclarecer o fato em debate, em vez de tão somente discuti-lo violentamente. E, aqui, vale registrar o que Jaspers chama de "violência intelectual", que é o uso de "sofismas".
   Gostei do texto.

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