segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

Luiz Eduardo Soares e seu livro

   Parei tudo para "dar cabo" do livro "Justiça - pensando alto sobre violência, crime e castigo", de Luiz Eduardo Soares - livro do qual, inclusive, eu já tinha falado aqui no blog.
   Para possível nervosismo do meu compadre, gostei do livro. Como se diz dos vinhos que não são maravilhosos, mas que também não decepcionam: "É honesto!". Essa seria, portanto, uma boa definição para o livro.
   Logo na abertura, o autor posiciona o livro em seu nicho - que, é verdade, acaba por ficar amplo demais -, dizendo: "Escrevi para os leitores não especialistas de todas as idades, mas espero que o livro seja útil também para os especialistas, principalmente os da área de direito, mas também para cientistas sociais, psicólogos, psicanalistas, filósofos, teólogos, sacerdotes, jornalistas e artistas". Ou seja, de leigos a especialistas de várias áreas, o livro "está valendo".
   Gostaria de comentar algumas passagens aqui no blog, e é o que me proporei a fazer em posts futuros.
   Uma primeira observação a ser feita, é a de que o livro não para nas críticas à Justiça Criminal, mas propõe alternativas que o autor considera "atraentes e promissoras".
   Outra, é que o autor não está completamente isolado em suas críticas e propostas alternativas. Ele expõe que "o modelo alternativo de fazer justiça que proponho é membro da família do que se convencionou chamar Justiça restaurativa", mas que seu modelo tem "divergências tópicas com algumas abordagens da restauração".
    Feitas essas duas observações, absolutamente superficiais, há que reconhecer que várias informações do livro são apenas constatações desagradáveis da nossa realidade jurídico-punitiva. Eu mesmo, aqui no blog, já questionei o real papel do aprisionamento, identificando uma crueldade desproporcional, muitas vezes, entre o crime cometido e o castigo imputado - não por conta do tempo excessivo que o "criminoso" ficaria encarcerado, mas por causa das condições de aprisionamento. Este ponto é ricamente ilustrado por Luiz Eduardo em seu livro.
   Um exemplo de bom desenvolvimento de argumentos que aparece no livro é o de uma história contada por um taxista que conduzia o autor a uma palestra. Vou abreviá-la enormemente aqui, só para captar-lhe o conteúdo.
   O taxista começa a contar a Luiz Eduardo, como passageiro, que perdeu um grande amigo, motorista de ônibus, num assalto. O ladrão entrou no ônibus; roubou os passageiros e, ao sair, disparou covardemente contra o motorista.
   Grande amigo do motorista do ônibus, o taxista conhecia detalhes de sua vida familiar. Pondera, então, com Luiz Eduardo - certamente, sem conhecer seus pontos de vista -, que o meliante deixara em estado de penúria a mulher e os filhos do amigo morto. Isto porque, a esposa era "do lar", apenas, e os filhos eram muito novos para trabalhar. Reflete, fazendo uma espécie de "futurologia", que os filhos poderiam, com a ausência do pai, e a menor atenção da mãe - então, dedicada a sustentar financeiramente a família -, passar a ter más companhias e acabar se envolvendo com drogas.
   A "sentença" do taxista era de que o ladrão deveria ser linchado, para nunca mais fazer o mesmo, isto é, vitimar tantas pessoas - não só o pai de família, mas também a esposa e os filhos.
   Luiz Eduardo, com muita delicadeza, faz algumas perguntas. Primeiro, reforça o sentimento de que os filhos do motorista eram também vítimas nessa situação. Depois, presentifica a possibilidade de envolvimento de um deles com drogas. Em seguida, consegue a concordância do taxista quanto ao fato de que, eventualmente, um dos filhos do amigo poderia precisar de capital para "investir" no consumo da substância ilícita. E, por fim, ressalta que, no desespero pelo dinheiro, o filho do motorista, vítima na ação pregressa, pudesse vir a ser, também ele, um agressor e assassino de algum trabalhador. A derradeira pergunta é "O senhor participaria do linchamento dele?" - lembrando, apenas, que o taxista era grande amigo da família, e, por conseguinte, das crianças também.
   Dá o que pensar, não é?  

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