É interessante como, mesmo sendo avesso à moral kantiana, eu consiga concordar com a raiz de seu sistema: uma moral baseada em imperativos hipotéticos (do tipo: "faça isso para obter aquilo") não merece valor. Isso é somente troca de interesses, à qual imagino seja indigno dar-se o nome de "moral", ou de "ética". Até Spinoza, quando avalia a "moral religiosa" vigente à sua época, que "faz X para obter Y", critica esse tipo de entendimento.
É verdade que a alternativa de Kant para superar essa "moral de imperativos hipotéticos" não me parece a ideal. Eu não tenho a mesma certeza de Kant de que exista realmente um "imperativo categórico", algo universal e necessário, que pudesse guiar qualquer ação humana, em qualquer local e momento histórico. A mim parece que a moral é sempre "circunstancial". Concordo, entretanto, que devam existir valores que possam ganhar relevo, a fim de que a escolha pessoal se apoie em algum "parâmetro externo", mesmo que esse parâmetro possa ser interiorizado pelo caminho da razão.
A crítica que Bernard Shaw faz à moral kantiana, se for entendida de maneira séria - embora a seriedade não pareça ser o traço mais característico de Shaw -, não é coerente. Shaw repensa o imperativo categórico da seguinte forma "Faça somente aquilo que pode virar uma regra universal, mas antes pergunte ao outro se ele gosta". A pretensão de Kant, muito louvável, era estabelecer uma moral universal. Se a regra só pode ser aplicada se ela agradar ao outro, ela não é universal. Pergunte a um bandido se ele quer ser preso. Ele dirá que não, e mesmo assim deveríamos agir de modo a torná-lo um presidiário.
Mas, como eu disse, a crítica de Bernard Shaw é uma brincadeira inteligente, como tudo o que brota dele. Filosoficamente, há respostas diversas da de Kant, sendo as que me parecem mais coerentes aquelas que relativizam o rigor das regras, mas que tentam "fixar" algo como objetivo, quando mais não seja, para facilitar seu uso prático.
Depois eu volto a isso.
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