Não é incomum, embora não seja o correto, repetirmos acriticamente informações que vamos obtendo através de várias fontes. Eu não sou exceção a isso... infelizmente.
Uma informação que continuo passando adiante até hoje é a que diz respeito a Hume (1711-1776) ter sido o primeiro filósofo a se assumir "ateu". Escrevo "até hoje" porque ainda não encontrei algo que negasse diretamente a informação inicial... entretanto, também não achei alguma coisa que a validasse definitivamente. Prometo tentar, em leituras vindouras, chancelar essa informação... o que não parece, entretanto, uma tarefa simples; afinal, segundo consta, Hume, apesar de abertamente declarado infiel pela Igreja escocesa, não se manifestou a respeito disso.
De qualquer forma, se não era ateu, certamente um crítico das religiões nosso brilhante escocês era. Isso fica claro em vários dos seus escritos, principalmente em "The natural History of religion", de 1757.
Entretanto, estava eu lendo um pequeno ensaio de Estética, chamado "Do padrão do gosto", de 1757, quando me deparei com duas críticas severas à religião... ou melhor, a duas religiões: o islamismo e o cristianismo.
A primeira delas, se fosse feita hoje, certamente colocaria Hume ao lado de Salman Rushdie como perseguido pela imposição da pena de morte por parte de alguns muçulmanos.
Escreve Hume:
"Os admiradores e seguidores do Corão insistem nos excelentes preceitos morais que se encontram dispersos por essa obra caótica e absurda. [...] Mas como podemos saber se o pretenso profeta conseguiu realmente chegar a uma justa concepção da moral? Concentremo-nos em sua narração, e logo veremos que dá seu aplauso a instâncias como a traição, a desumanidade, a crueldade, a vingança e a beatice, que são inteiramente incompatíveis com a sociedade civilizada [...] cada ação só é condenada ou elogiada na medida em que é benéfica ou prejudicial para os verdadeiros crentes".
Xiiiii... melhor nem comentar essa!
Sobre o cristianismo, nosso filósofo escreve:
"Uma das características essenciais da religião católica romana é que ela precisa inspirar um ódio violento por toda outra forma de crença, e conceber todos os pagãos, maometanos e hereges como objetos da divina cólera e vingança. Tais sentimentos, muito embora sejam na realidade altamente condenáveis, são considerados virtudes pelos fanáticos dessa comunhão, e são representados em suas tragédias e poemas épicos como uma espécie de divino heroísmo".
Aqui, só diminui o impacto da crítica a citação de "pelos fanáticos dessa comunhão", embora isso só apareça depois de ter sido dito que era essencial à religião católica romana "inspirar um ódio...", sem a particularidade do caso dos "fanáticos".
Para alguém que questionou a "causalidade" e o "eu" - duas coisas aparentemente tão óbvias, pelo menos para o senso comum -, não é muito de se estranhar, não é? Rsss.
3 comentários:
Hum, não sei se você já resolveu isso e eu estou aqui tocando num ponto morto do blog, mas tem um livro que explica essa questão; é do Paulo Jonas Lima Piva, "Ateísmo e revolta".
Nele o autor faz um pouco de história do ateísmo, mostrando como desde os gregos ocorrem mudanças no uso do termo, até que alcancem a conotação que temos hoje.
Para ele, o primeiro ateu - inclusive a utilizar o termo como conhecemos - foi o padre Jean Meslier.
Tem um artigo aqui sobre ele:
http://www.fflch.usp.br/df/cefp/Cefp7/piva.pdf
Bruno:
Conheço o livro em questão apenas de nome, mas nunca tive oportunidade de observá-lo detidamente.
Quanto a Meslier, conheço aquela frase referente às "tripas"... que já foi, inclusive, adaptada para os nossos dias. Essa, eu não sei se você conhece. Dizem que os problemas sociais só acabarão quando o último sociólogo foi enforcado com suas próprias tripas. Essa "teoria" é bem problemática. Prefiro deixá-la de lado.
Depois da dica, procurarei o livro com mais atenção.
Obrigado pelo comentário.
Ah... faltou o comentário sobre o texto que você enviou. Obrigado por ele. Procurarei ler logo.
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