sexta-feira, 24 de abril de 2009

O poder corrompe...

Num artigo com o mesmo título do post, publicado na revista Ciência&Vida - Filosofia, do mês passado, Renato Janine Ribeiro comenta a frase "O poder corrompe; o poder absoluto corrompe de maneira absoluta", atribuída ao historiador liberal inglês John Acton.
Inicialmente, Renato corrige o entendimento popular, mostrando que Acton, em realidade, teria dito o seguinte: "O poder tende a corromper; o poder absoluto corrompe de maneira absoluta".
A partir dessa correção, Renato mostra que Acton pretende dizer que existe uma tendência inerente à posse do poder, que é o de ser corrompido. Mas essa tendência pode ser freada. Entretanto, o poder absoluto sempre leva à corrupção.
Renato Janine Ribeiro explica, então, que "A lição que Acton nos propõe é que existe um meio para que o poder não corrompa... algo como controles e contrapesos... O crucial é que os poderes não estejam unidos, mas se equilibrem de maneira tensa e mesmo conflituosa". Ou seja, não se deve fazer com que os poderes funcionem tão harmonicamente, no sentido de não haver tensão entre eles. O que fará com que não haja a corrupção é a ação antagônica deles, no interesse da correção de atitudes diante do poder que o povo lhes outorgou. Quando os "acordos" minam essa relação conflituosa, tudo virando "um", param de existir os controles efetivos.
Mas o autor da matéria é mais feliz quando nos coloca para pensar profundamente, ao escrever que "todo poder é perigoso... Mas esse veneno pode ser detido... E o que vai detê-lo não precisa ser melhor do que ele! O importante não é opor o bem ao mal... Não é melhor jogar um mal contra o outro? Não será este o segredo da boa administração de um mundo em que o mal é tão frequente? Ou seja, nenhum dos três poderes é uma maravilha - mas é melhor que estejam em mãos diferentes e que possam controlar-se um ao outro...".
O tom da afirmação de Renato Janine Ribeiro pode soar meio "maquiavélico" - no melhor sentido do termo; afinal, corresponde à realidade política com que nos defrontamos - mas me parece uma apreciação de muito valor.
Exemplo maior do que foi dito é que as grandes "falcatruas" políticas vêm à tona justamente quando os próprios "maus" se desentendem e, sentindo-se prejudicados, colocam suas insatisfações no espaço público. Eles não "mudaram de lado", passando a ser os "heróis"; simplesmente estão funcionando como um contrapeso à situação anterior. Este contrapeso, se bem aproveitado, se transforma em controle, através dos órgãos fiscalizadores - como o Ministério Público, por exemplo.
Enfim, é melhor um bandido servindo de dedo-duro dos outros do que todos organizados contra nós! Eita, conclusão dolorosa!

8 comentários:

Clara Maria disse...

Senhor Ricardo!!
Cheguei ontem de um festival de teatro de escolas. Atordoada pelo que aprendi, pela qualidade dos espectáculos e pelo facto de muito pouco ter dormido durante as 3 noites que passei no Porto e pela péssima qualidade dos alunos que levámos que apenas se preocuparam em contrariar o sono e conviver com os dos outros grupos.
O encontro foi fantástico, começou de forma esmagadora , com uma escola que trouxe a cena uma peça de um projecto nacional de teatro. Chamava-se o “Coro dos maus alunos”.Acho que essa gostaria particularmente , por isso aqui deixo colada a sinopse.
“Coro dos maus alunos de Tiago Rodrigues é a história de um velho professor de filosofia com uma “alma jovem”, fã de controvérsias e promotor do espírito crítico dos seus alunos em relação à escola. Acusado de os confundir e de manter com eles relações que ultrapassam os limites de uma relação entre professor e aluno, o professor é submetido a um processo. Esta é uma variação contemporânea sobre o julgamento de Sócrates, ocorrido em plena democracia ateniense. Tal como em Atenas, é pela voz dos alunos que conhecemos, distorcida e interpretada, a vida do velho professor e a história do seu julgamento. Resta aos alunos registar e tornar pública a injustiça que testemunharam. No entanto, é necessário primeiro garantir que são ouvidos por todos.”.
A última peça deixou-me absolutamente parva, colada à cadeira e me fazendo sentir um micróbio face a tão grande qualidade. Como é possível fazerem, numa escola, um teatro de tamanha grandiosidade? Ainda agora estou em estado de choque. E mais o colega faz esse tipo de teatro numa escola do Alentejo…Foi absolutamente demais.
Das outras peças houve uma outra que me tocou. Era praticamente só expressão corporal…tinha muito poucas falas mas foi muito interessante , muito mesmo. Esse colega aborda temas muito diferentes dos demais , só ontem percebi pq…é professor de filosofia…Fez-se luz na minha cabeça…rs
Confesso que perdi o comboio do seu blog, mas realmente venho esmagada com o teatro e penso que durante uns dias viverei em completo off… Precisarei de me penitenciar por isso?
Maria

Clara Maria disse...

A faltade pontuação agora tb me esmagou...Deixo aqui umas ,, ., e ;, o senhor que distribua na mensagem que lhe enviei...Confesso que ainda não dormi nem metade do que necessito.
Maria

mundy disse...

A Clara Maria, em sua intervenção no blog, colocou uma questão dos alunos que se preocuparam em confraternizar com os colegas de outras escolas.Isto me fez lembrar do ano de 1988, Congresso de Economia em Fortaleza, em que a DElegação da UFRJ do Rio de Janeiro, passou a semana inteiro do Congresso, fazendo turismo, congresso que nada, nós estavamos mais preocupados em fazer passeios e conhecer a Noite Cearense , um claro mau exemplo de nossa parte, mas de ótima lembrança para mim no aspecto pessoal, como me divirti na Capital Cearense.

Clara Maria disse...

Caro Mundy!!
O problema não foi eles quererem confraternizar, até nós o fizemos, foi não quererem dormir, ou o quererem fazer em outros quartos que não o nosso..ou simplesmente nem dormirem. Agora imagine ocomo estaria a concentração deles e a criatividade nos ateliês e a atenção aos 8 teatros que vimos...Imagine também que seleccionámos a mais responsável e o que tinha maior aptidão. Zangá-mo-nos várias vezes com as criaturas e eu dormi em 3 noites o que normalmente durmo em 1. Quando não durmo ando zoombie, pouco concentrada, rabujenta e irritadiça. Felizmente fui com uma companhia excelente e conheci pessoas fora de série, com a mesma paixão(ou até mais) pelo teatro que eu tenho.
Enfim...sobrevivi!!!
E o senhor , como está? Já passaram todas as tempestades e todos os vendavais?
Maria

Clara Maria disse...

Uma pergunta deixo eu no ar. Os garotos de hoje têm maus princípios ou simplesmente têm princípios diferentes dos nossos?

Ricardo disse...

Maria:
Não precisas te penitenciares por nada. Sei que a qualidade da tua presença ultrapassa em muito a quantidade com que compareces.
De qualquer jeito, todos nós que fazemos o blog - a múltiplas mãos - gostamos que faças tuas intervenções.
Sobre perderes o "comboio", sei que as passagens - ou será "tíquetes", por aí? - estarão sempre disponíveis para ti. É possível até que o trem diminua a velocidade para tu, como naquelas "teatrais" estórias, o alcances. Rsss.
Quanto ao teatro, sei o quanto tu gostas do assunto. Ficaste surpresa quanto ao professor e à turma que fazem teatro de qualidade no Alentejo? Pois é... eu sempre digo que esses alentejanos são "fogo". Nos vinhos, por exemplo, eles acertam sempre. Rsss.
Como tu disseste, o "Coro dos maus alunos" é uma "versão contemporânea" da "Apologia de Sócrates". Deve ter sido uma ótima peça mesmo.
Quanto ao fato de o professor ser de Filosofia, tens que te apacentar. Afinal, todos filosofamos. E tu não estás tão crua. Os estudos com a tua menina que o digam.
Bom retorno para ti... depois da atualização do sono. Rssss.

Ricardo disse...

Esse Mundy não é fácil, não. Quer dizer que mandam você estudar e você vai farrear, né, malandro? Rsss.
É... bons tempos em que dava para ser assim. O mais curioso é que, se fosse hoje, você pagaria uma fortuna para participar do congresso. Aí, eu garanto que a farra seria menor.

Ricardo disse...

Maria:
Curiosamente, aquela consideração sobre a diferença de princípios ou da simples fraqueza deles, nos jovens, não estava lá quando postei meu comentário. Por esse motivo, não incluí nada sobre isso, quando respondi a ti.
Colocaste uma ótima pergunta. Parece-me que os princípios são sempre referentes ao tempo em que são avaliados; portanto, há uma fluidez constante deles. Por outro lado, acho que existe uma base que possui, ainda que "fluida", uma "viscosidade" maior (isso é coisa de engenheiro, mesmo. Rsss). Ou seja, quero dizer que alguns princípios, ainda que condenados à modificação a longo prazo, permanecerão por mais tempo... "engessados", inclusive, pela nossa própria forma ocidental de ver o mundo.
A "tradição" - essa coisa impessoal na qual nos inserimos desde o nascimento - agrilhoa-nos a uma certa visão de mundo, que está presente, até mesmo, na irrupção de uma revolução. Tanto é que, muitas vezes, vemos a repetição - com nuances - de comportamentos nos "revolucionários" de ontem, quando viram os "tradicionais" de hoje.
O que acha da minha opinião, Maria?