Continuando o post anterior.
"A Era do Neocapitalismo" é o título do texto do professor do Departamento de História da Uff Ronaldo Vainfas. O autor propõe que "neocapitalismo" será um conceito que servirá de alternativa aos ultrapassados "globalização" e "neoliberalismo". O "neocapitalismo" abarcará elementos ligados ao avanço tecnológico, mas "será também definido por sua preocupação em relação ao meio-ambiente e pelos projetos de desenvolvimento sustentável, combinando a reprodução do capital com a preservação do planeta". Mas Ronaldo indica que o aspecto mais notável, segundo os historiadores do futuro, "residirá no paradoxo formidável: a conversão dos regimes comunistas em capitalistas". Então, explica que não está falando de uma renúncia à ideologia socialista, em detrimento do modelo capitalista, mas, como é o caso da China, " um dos países mais integrados ao capitalismo mundial que, no entanto, mantém uma fachada de regime comunista. Um comunismo baseado, internamente, numa forma arcaica de capitalismo mascarado: o capitalismo selvagem".
Outro texto, "O novo Renascimento", é de autoria da pesquisadora Isabel Lustosa. O texto, ao contrário do pessimismo apocalíptico daquele do Francisco Carlos T. da Silva, citado no último post, é bem otimista. A autora indica que o futuro verá nosso tempo como de transição. E transição de um período em que "enquanto o Ocidente... incorporando os valores do pós-modernismo, aliado valioso do neoliberalismo, apostava no 'cada um por si e o mercado por todos', aqueles povos... entregues ao próprio destino abraçaram de forma atualizada e radicalizada, alternativas que se vinculavam às suas tradições mais remotas" para um novo momento em que "assistimos ao renascimento da certeza de que a humanidade, apesar de sua variedade e de suas infinitas possibilidades de organização, é uma só, e que estamos todos no mesmo barco. Renasce, com isto, a certeza de que é preciso agir para minorar o sofrimento do outro; de que é preciso estimular a difusão de uma agenda que recupere a ideia de que a violência só gera mais violência; de que pobreza e desigualdade só geram mais pobreza e desigualdade e de que, portanto, é preciso saber repartir".
Particularmente, gostaria muito de acreditar que seríamos lembrados por isso, mas não acho que seja o caso. Parece-me que nem o futuro conseguirá lidar tão bem com os problemas apresentados no texto. Portanto, muito menos nós seremos aqueles que irão capitanear esse processo.
Por último, temos o texto da brilhante historiadora Mary Del Priore - de quem já assisti a uma entrevista no programa do Roberto D'Ávila, e gostei muito -, cujo título é "A época da aceleração da história e das culturas plurais".
Ao contrário da autora anterior - que é, como Mary, sócia do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro -, este texto mostra uma perspectiva do que já está realmente ocorrendo. Por isso, parece-me mais adequado para "nos" representar no futuro. Chamaram-me atenção alguns trechos.
Num deles, Del Priore diz: "Enquanto marcas se globalizaram, as tradições locais se afirmaram em resposta". O interessante, parece-me, é que o texto reconhece a convivência, ainda que tensa, entre o global e o local, e, mais especificamente, entre a inovação "estrangeira" e a tradição nacional.
Em outro, diz: "As instituições religiosas entraram em declínio, mas a experiência coletiva do sagrado e a imaginação religiosa ganhara caminhos novos". Eu só não sei se esses "caminhos novos" são muito melhores que os "velhos".
Depois, diz: "A família também mudou: seus membros não têm mais papéis definidos e o casal, antes 'fusional', resultou em nova equação: 1 + 1 = 3". Para quem pensa já ter visto isso, significando que "pai + mãe = pai/mãe/filho", engana-se. Del Priore explica: "Cada qual com sua independência, o terceiro lugar sendo aquele das agendas comuns".
Outra parte interessante é quando ela fala de "todos correndo atrás do culto da felicidade" - percebam que não é "... atrás da felicidade", simplesmente, mas do "culto à felicidade - e arremata que "à infelicidade de não ser feliz, somou-se a vergonha de não se ter felicidade".
A autora fala que "o Estado-Nação, antes ator único na luta internacional, cedeu lugar a uma multiplicidade de atores que agem em função de registros políticos próprios" e da "emergência de novas guerras, ligadas à máfia das drogas ou ao terrorismo internacional".
Para nossa sorte, a autora sugere que o futuro nos reconhecerá pelo seguinte: "A ética voltou à pauta: frente à corrupção e à venalidade, propugnou-se a moralização da vida pública". E faz uma pergunta à qual eu responderia um sonoro "Sim!", que é "Afinal, a boa ética não é a solução para a má política?".
Por fim, ao contrário de sua colega de instituição, não indica que seremos vitoriosos sobre o egoísmo, mas propõe a nós "deste tempo" uma pergunta, à qual responde em seguir, fechando seu texto: "O grande desafio destes tempos? Conciliar políticas de reconhecimento da diferença com as de redistribuição de riquezas e, por meio delas, aceder a uma existência feita de plenitude, significação e dinamismo".
Parece-me que Mary Del Priore detectou várias características bastante representativas do nosso tempo, que poderão, no futuro, realmente identificá-lo.
Espero que tenhamos o discernimento suficiente para vencer o "desafio" a que a autora se referiu.
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