Que me perdoem os senhores Günther Anders, Heinrich Blücher - maridos de Hannah -, Martin Heidegger - seu amante -, W.H. Auden e Hans Morgenthau - que a pediram em casamento após enviuvar -, bem como a Sra. Nádia - minha esposa -, mas cada vez me apaixono mais por Frau Hannah Arendt.
Uma de minhas leituras de agora é "Homens em tempos sombrios", de Arendt. Há um posfácio de Celso Lafer, nosso compatriota que foi aluno dela nos EUA, em Cornell. Aliás, que me desculpem todos os anteriormente citados, e mais a esposa do Celso Lafer, mas eu acho que ele também foi apaixonado pela alemã. Rsss.
Obviamente, essa paixão com que brinco aqui não precisa ser heterossexual, nem ao menos precisa se dar intervivos. É uma paixão pela história e pela alma de uma outra pessoa. Aliás, a história de alguém, segundo a própria Arendt, é o conjunto de suas ações e discursos... e como ações e discursos são a própria alma de alguém, poderia dizer que me apaixonei pela alma da Sra. Hannah Arendt... como continuo apaixonado por Spinoza.
Aliás, outro ponto interessante sobre esse sentimento: ele não diminui quando o dividimos. É possível, dessa forma, apaixonar-se por muitos indivíduos, sem privar ninguém da paixão que lhe cabe. Isso é quase o "summum bonum" spinozano! Rsss.
Feita a minha declaração sentimental para a Sra. Hannah Arendt, falo um pouco do livro.
Ao contrário dos livros "teóricos" de Arendt - as aspas indicam um certo saudável paradoxo, visto que a autora alemã sempre mergulhava nos fatos "concretos" para fazer suas reflexões abstratas -, esse é um conjunto de ensaios sobre pessoas. Mas não são exatamente ensaios biográficos. Como indica Celso Lafer: "alguns, como os sobre Jaspers e Heidegger, são evocações e depoimentos. Outros têm a dimensão de uma visão de conjunto de trajetórias. É o caso dos estudos sobre Walter Benjamin e Hermann Broch. Muitos são artigos que, partindo de biografias que Hannah Arendt resenhou, deram-lhe a oportunidade de escrever sobre figuras que a fascinaram, como Rosa Luxemburgo e Isak Dinesen".
Em breve aparecerão posts sobre a figura de Hannah e do que ela escreveu para os oitenta anos de Heidegger.
Antes, porém, eu gostaria de registrar um pequeno trecho do prefácio do livro. A autora nos diz que "Os 'tempos sombrios', no sentido mais amplo que aqui proponho, não são idênticos às monstruosidades desse século [XX, no qual ela escreve], que de fato constituem uma horrível novidade. Os tempos sombrios, pelo contrário, não só não são novos, como não constituem uma raridade na história.... Que mesmo no tempo mais sombrio temos o direito de esperar alguma iluminação, e que tal iluminação pode bem provir, menos das teorias e conceitos, e mais da luz incerta, bruxuleante e frequentemente fraca que alguns homens e mulheres, nas suas vidas e obras, farão brilhar em quase todas as circunstâncias e irradiarão pelo tempo que lhes foi dado na Terra - essa convicção constitui o pano de fundo implícito contra o qual se delinearam esses perfis. Olhos tão habituados às sombras, como os nossos, dificilmente conseguirão dizer se sua luz era a luz de uma vela ou a de um sol resplandecente. Mas tal avaliação objetiva me parece uma questão de importância secundária que pode ser seguramente legada à posteridade".
Aplausos, de pé, para a Sra. Arendt!
2 comentários:
Hannah Arendt é um bálsamo e tem muitos admiradores secretos por aí. Mas puxa, com essa vida amorosa que ela teve, nenhum de nós leva a menor chance!
Deixo aqui um elogio ao blog; uma de minhas maiores frustrações é a falta de uma blogosfera filosófica brasileira, mas pelo visto isso está lentamente mudando.
Diego:
Primeiramente, muito obrigado pelo elogio ao blog, ainda mais por colocá-lo gentilmente numa categoria de movimento de mudança da blogosfera filosófica brasileira.
Se me permitir, entretanto, gostaria de compartilhar esse elogio com alguns dos amigos que frequentam este espaço e que possuem blogs de alto nível. Além desses, vale destacar aqueles que colocam seus magníficos comentários, que alavancam os próprios posts, rumo a um aprofundamento das análises propostas inicialmente.
Sobre a Hannah Arendt, imagino que uma relação amorosa com ela fosse algo complexo; afinal, este tipo de relação teria que ser complementada por uma potência intelectual sem tamanho.
Sobre os admiradores, eles devem ser secretos e declarados. Já que há desses dois tipos, incluo-me como um dos declarados.
Abraços.
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