Há um livro publicado pela Editora Martins Fontes, em 2007, cujo conteúdo corresponde a duas partes dos "Parerga e Paralipomena" de Schopenhauer, que tem como título "Fragmentos sobre a história da Filosofia".
Schopenhauer não escreveu, nos "Fragmentos...", um simples manual de História da Filosofia. Sua ideia básica foi a de registrar as doutrinas de pensadores/escolas filosóficas que imaginassem o mundo, de alguma forma, segundo a perspectiva da divisão entre "realidade" e "representação" - sejam quais forem os nomes que se deem a esses conceitos.
Não é preciso dizer o quão perspicaz Schopenhauer é em suas análises. Entretanto, algumas ideias suas mereceriam, penso, algumas críticas.
No parágrafo 12, Schopenhauer escreve sobre "A filosofia dos modernos". No texto, aparecerão as ideias de Descartes, Malebranche, Spinoza, Leibniz... e, muito menos, de Locke e Berkeley.
Em sua análise, Schopenhauer questiona o conceito de "substância", do qual partem igualmente Descartes e Spinoza. Indica, o alemão, que Spinoza é um "materialista inconsciente", pois este não percebe que sua conceitualização de "substância" deixa de enxergar que todas as qualidades substanciais são, na verdade, qualidades meramente da matéria. Isso não me parece correto. Afinal, fica claro que Spinoza reconhece claramente as duas instâncias - material e imaterial - se remetendo a uma única "realidade" última, que envolve ambas.
Há um óbvio engano de entendimento de Schopenauer quando este escreve que Spinoza "expõe os dois modos de sua única substância como extensão e representação... divisão errônea, uma vez que a extensão existe apenas para a representação... portanto, não se opõe, mas se subordina a ela". Spinoza chama Extensão e Pensamento os atributos da realidade única, a Substância, e não apenas as modificações/modos desta - que aparecerão em outro momento do sistema spinozano. Uma possível confusão advém do fato de Spinoza chamar a mente de ideia do corpo, imaginando-se que essa "mente" seja uma mera "representação" do corpo. Mas isso não é verdade. Afinal, há que se pensar, pelo menos de modo reducionista, em um paralelo entre corpo e mente... e, mais corretamente, em que ambos os aspectos permitem um entendimento completo daquilo que está sob investigação. Ou seja, ambos são, em si, perspectivas de uma única realidade, não cabendo falar de uma representação de um através do outro.
Por último, uma "triste" incorreção de alguém tão ilustrado quanto Schopenhauer: a ideia de que Leibniz seria o pai de uma espécie de "monismo"... desprezando totalmente a inspiração spinozana que este tomou do luso-holandês. Disse Schopenhauer: "O esforço de Leibniz para estabelecer, como base, um único princípio para o espírito e a matéria merece reconhecimento".
Haveria um certo "patriotismo" nessa opinião... ou apenas uma má interpretação do pensamento spinozano?
2 comentários:
Ricardão, uma off topic pra vc.
Já li por aqui que vc gosta de romances filosóficos. Aí eu te pergunto: Vc já leu 'Martin e Hannah', da Catherine Clément?
O livro saiu aqui no Brasil em 2000 e é da Companhia das Letras.
Não é nada de espetacular. Mas dá pra acompanhar a história dos dois. E tem momentos de muita beleza.
Dá uma procurada e vê se gosta.
SDS
Júlio:
Uma das melhores coisas que encontramos nos blogs, de um modo geral, é a expansão de fontes de informação. Cada um conhece um pouco mais sobre uma coisa, o que nos "arrasta" atrás dessas diversas pessoas.
Essa foi uma ótima dica. Agradeço... e já estou "correndo atrás".
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