Procuro registrar os aniversários dos amigos do blog, mas hoje tenho que registrar o dia do nascimento de nosso mais ilustre "participante"... aquele que dá nome ao nosso espaço, o próprio Baruch Spinoza.
Mesmo não podendo desejar-lhe "muita felicidade" e "muitos anos de vida", dir-lhe-ia: "Desejo que seja cada vez melhor compreendido!".
E... felicidades para todos nós, amantes da Filosofia, que, de certa forma, eternizamos nosso querido luso-holandês neste mundo.
3 comentários:
Dom Manuel, rei de Portugaal, parece ter sido hábil ao decidir a conversão forçada dos judeus ao cristianismo. Durante alguns anos os marranos (conversos) de Portugal gozaram de um certo grau de tolerância, o que veio facilitar o criptojudaísmo. Mas na segunda metade do século XVI, já depois da entrada da Inquisição em Portugal, a fuga de marranos para fora da Península Ibérica foi brutal. Assim, um dos sítios para onde os sefarditas conversos portugueses foram foi Antuérpia. Depois daqui alguns foram para Amesterdão tendo-se tornado comerciantes influentes no fim do século XVI. Entre esses comerciantes de sucesso encontrava-se Miguel de Espinosa, que havia nascido em território alentejano português, mais precisamente na Vidigueira, tendo, todavia, chegado a Amesterdão em 1622. Em 1628 casa em segundas núpcias com Ana Débora, filha de outro comerciante judeu chamado Baruch. E é em Novembro de 1632 que nasce o protagonista desta história – Baruch Espinosa.
Como muitas crianças de Amesterdão, Espinosa era um prodígio na gramática e na leitura da Bíblia. Entretanto familiarizou-se com as ideias heréticas de um tal Uriel da Costa, um judeu aristocrata do Porto, que acabou por se suicidar em 1640 com um tiro na cabeça. Mas nessa altura já sua mãe havia falecido há dois anos e o pai tinha mais em que pensar do que no suicídio de um herege. Tratou de se casar com Ester, chegada a Amesterdão nesse ano vinda de Lisboa. Portugal libertado dos espanhóis, abriu novamente as portas aos sefarditas de Amesterdão. O pai de Espinosa não teve de esperar muito tempo para poder comprar os apreciados frutos secos do Algarve e vendê-los em Amesterdão.
Espinosa tinha uma irmã chamada Rebeca. Foi esta irmã que, quando foi feito o inventário dos bens e das dívidas de Espinosa, após a sua morte, depressa se apercebeu que os seus bens não deviam ser suficientes para cobrir as suas dívidas. Assim, fez entrar no tribunal de Haia um requerimento solicitando a suspensão dos seus direitos e obrigações como herdeira de Espinosa. Desta feita, Van der Spyk, o seu senhorio, foi autorizado a vender em hasta pública as roupas, a mobília e os livros para pagar a alguns credores, bem como recuperar rendas e despesas que Espinosa lhe devia. Mas antes, Van der Spyk já tinha mandado para Amesterdão, cumprindo ordens de Espinosa, a sua escrivaninha com todo o seu conteúdo, a fim de o seu editor, Rieuwertsz, e alguns amigos de Espinosa, deitarem mãos à obra e editarem o que havia para editar. Nove meses após a sua morte apareceu à luz do dia a Ética de Espinosa, em latim e neerlandês. Para segurança do editor, o frontispício não continha nem o nome do editor nem o local da publicação. Mas o nome do autor, esse, desta vez apareceu, pois apesar de não se saber onde parava o seu cadáver, por alguém o ter feito desaparecer de forma misteriosa, não importava porque as autoridades já não lhe podiam fazer nada.
Espinosa dizia que a sabedoria do homem residia na meditação sobre a vida e não sobre a morte. Deve ter aguentado uma insuficiência respiratória, difícil de ssuportar, com estoicismo, dado que a pneumoconiose, provocada pelo pó do vidro libertado no polimento das lentes, não lhe devia ter dado vida fácil, e todavia, nunca fez grande alarde disso. Aplicou à sua própria vida aquilo que preconizou nos textos filosóficos. Faleceu tranquilamente no dia 21 de Fevereiro de 1677 na presença do médico. Quando o senhorio, Van der Spyk, regressou a casa da missa, era domingo, Espinosa já estava morto, e o médico já havia desaparecido com os artigos de prata e algum dinheiro que ele tinha numa mesa. Não há certeza do nome do médico, mas, ou teria sido um amigo chamado Lodewijk Meyer, ou um médico de Amesterdão chamado Schuller.
Amigo Sérgio:
A história de Spinoza é, por si só, muito atraente.
Tive a felicidade de ler a biografia deste filósofo, escrita por Steven Nadler... trazido pela minha mãe aí de Portugal, já que infelizmente não foi publicada aqui no Brasil.
Apenas como curiosidade, lembro que a tal irmã Rebeca tem outra passagem interessante no que concerne a heranças e tribunais, que foi a tentativa de privar Spinoza dos bens familiares, quando da morte de seu pai, sob alegação de que este não pertencia mais à comunidade judaica. O excomunhão, pretensamente, indicaria que ele não poderia ser herdeiro. O valente e valoroso Spinoza vai, então, à Justiça Comum - o que já representava uma ousadia para os costumes judaicos - a fim de exigir sua participação na herança.
Sentença dada, garantindo-lhe os direitos sobre parte dos bens, nosso nobre filósofo abre mão de tudo, solicitando apenas a cama do casal Spinoza - onde provavelmente teria sido engendrado pelo amor de seus pais.
Apenas uma correção sobre o comentário anterior.
O pleito da irmã não foi exatamente após a morte do pai, Miguel, que ocorreu em 1654 - enquanto Spinoza só sofreu o 'herem' em 1656 -, e sim no curso da divisão dos bens do espólio.
Há que se lembrar que Spinoza continuou conduzindo o negócio dos pais, junto com seu irmão mais novo, até a excomunhão.
Aí, sim, sua astuta irmã manifestou sua "gula" sobre a parte que, em teoria, pertenceria a Spinoza.
Reparo feito!
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