Recebi um e-mail de um amigo, solicitando minha participação numa enquete eletrônica no site do Senado, sobre o Projeto de Lei Complementar nº 122, que propõe que a homofobia seja considerada crime... como outras discriminações já o são.
Como, refletindo seriamente, não consigo ver diferença de valor entre pessoas seja por cor, seja por sexo, seja por opção sexual, participei da dita enquete, apoiando a aprovação da lei. Mas me espantei um pouco com o resultado parcial da pesquisa. Afinal, dos cerca de 200 mil participantes, mais da metade não desejaria ver a tal lei aprovada.
É verdade que não conheço o conteúdo exato do projeto, que pode até criar uma "discriminação duplicada", quando se começa a "impor" ao grupo majoritário a aceitação do grupo minoritário; aceitação essa que não existe por algum motivo cultural. Essa convivência, penso, tem que ir aumentando naturalmente, começando com uma respeitosa assunção da realidade da existência do grupo minoritário - seja de que natureza for a "diferença" que os distingue -, até a percepção de que o valor de cada ser humano está em suas atitudes no que diz respeito ao "outro", e não a opções pessoais que não envolvem nenhum prejuízo ao tecido social.
Atentemos para o fato de que não se está falando simplesmente de concordar ou não com a opção sexual, mas de agir contra a integridade física ou moral de um outro ser humano que pensa diferente.
Não por coincidência, por esses dias, o jornal O Dia publicou um artigo do estilista Carlos Tufvesson sob o título "Só por que a Bíblia diz?". O texto começa assim: "Fica difícil entender por que toda vez que um projeto de lei para tutelar os direitos de uma minoria, no caso, os homossexuais, está para ser votado, começa uma grita orquestrada por líderes religiosos para que isso não seja visto pelo que é - um caso de direito civil e humano - e, sim, pela ótica religiosa".
O autor do texto prossegue comparando a situação em questão com a dos negros, e com a existência da Lei Caó, que protege estes últimos. E cita um dado que, se for verdadeiro, é preocupante demais: "No Brasil, um homossexual morre a cada três dias por crime de ódio!".
O supracitado autor propõe que "A Bíblia reflete os costumes da época em que foi escrita. Entre eles, por exemplo, a concordância com que um homem compre escravos, desde que de outro país (Levítico 25,44) e mesmo indica como castigo a pena de morte, tão condenada pela Igreja (Levítico 24,17)". E, por fim, diz: "Diante disso, cabe uma reflexão: devemos mudar a legislação para adaptar o Código Civil às leis da Sagrada Escritura? E, numa sociedade com tantas religiões, como no nosso país, como isso seria?".
Particularmente, eu ampliaria a questão para outros aspectos que estão pedindo uma solução mais "imparcial", como a dos estudos com células tronco, mas, como o post gira em torno do tal projeto de lei, limito-me a comentar o que escreveu Carlos Tuvfesson.
Spinoza, como iniciador da exegese bíblica, já indicava que os regramentos religiosos visavam preponderantemente à boa convivência dentro das comunidades. Sob este aspecto, o Antigo Testamento acerta, por exemplo, impedindo que se tomasse um concidadão como escravo - que se vá buscá-los na África, não é? E isso estaria justificado biblicamente. Mas não podemos deixar de constatar que o regramento social, tanto no nível da legislação, quanto no nível menos "formalmente" determinado, como é o caso da moral, é um constructo humano. Poucos pensadores, atualmente, concebem uma tábua de valores absolutos. Se os valores são "plásticos" - não meramente "relativos", entretanto -, moldáveis de acordo com o tempo e o espaço, não há um motivo real, a menos de uma "teimosia" desmedida - desconsiderando uma possível "má-fé" dissimulada - de, em constatando um fenômeno efetivo, encará-lo segundo o quadro social atual.
Mas, ainda que se mantenha um preconceito interior - o que também deve ser "tolerado" pela "minoria" em questão -, não se pode aceitar a violência física ou moral contra outro ser humano.
Se atualmente se discutem as agressões contra os animais e a natureza, em geral - reflexões impensáveis na época do Antigo Testamento, com todas aquelas "ofertas" sacrificiais ao Senhor e a ideia de que a natureza, incluindo os animais, foi feita apenas para servir ao homem -, como não erradicar agressões a outros seres humanos?
Se atualmente se discutem as agressões contra os animais e a natureza, em geral - reflexões impensáveis na época do Antigo Testamento, com todas aquelas "ofertas" sacrificiais ao Senhor e a ideia de que a natureza, incluindo os animais, foi feita apenas para servir ao homem -, como não erradicar agressões a outros seres humanos?
Juízo, Brasil!
Um comentário:
Primeiro comentário (rápido, pois estou atrasado!) Ótimo texto! Copiei e coloei em um outro blog que tenho, espero que não tenha problema!
Volto à noite para fazer um comentário decente!
Abraços
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