quinta-feira, 3 de setembro de 2009

"Os limites da razão..."

Nosso amigo Cleiton, aqui do blog, participou do I Congresso Nietzsche & Spinoza, que ocorreu no Rio, em 2006. Eu nem sabia disso, mas ele apresentou um texto seu. Como havia vários colóquios ao mesmo tempo, e era necessário escolher de quais palestras se iria participar, não tive oportunidade de assiti-lo. E, apesar de haver indicação de horários para cada uma delas, nem sempre era possível - por atrasos naturais - sair de uma apresentação para assistir a outra.
Para nossa satisfação, seu trabalho foi publicado na "Revista Conatus", havendo, no seu blog, direcionamento para o artigo, cujo título é "Os limites da razão: sobre o inacabamento do Tractatus Intellectus Emendatione".
Li o trabalho com bastante interesse, pois conheço a capacidade de nosso companheiro, através do seu blog. O texto é bem feito, contemplando vários comentadores de renome - não só brasileiros, como Lívio Teixeira e Marilena Chauí, mas também do internacional Ferdinand Alquié. Traçam-se paralelos entre o TIE e a Ética, principalmente no que diz respeito aos "modos de percepção", no primeiro, e "gêneros de conhecimento", no segundo. Ótima foi a percepção, aliás, da não correspondência plena do terceiro modo de percepção do TIE com o segundo gênero de conhecimento da Ética - o que muitos simplesmente deixam passar. Afinal, enquanto o terceiro modo do TIE é verdadeiro, mas não adequado; o segundo gênero da Ética já é adequado, embora não ainda o mais perfeito.
Só posso dar-lhe os parabéns, quanto a isso.
Entretanto, há algumas passagens que percebi como problemáticas. E gostaria de citá-las aqui, até para possibilitar um debate, caso o próprio autor venha a desejar isso.
Vamos lá, então.
Discordei de uma coisa fundamental, a tese de que "por ser um discurso da razão, o TIE não pode alcançar o sumo bem" - que seria "conhecer pela causa" - e, por isso mesmo, o inacabamento seria da própria natureza do tratado. A pensar desta forma, a própria Ética teria que ser inacabada, visto que ela também utiliza a Razão (enquanto segundo gênero) para falar do "conhecimento da união da mente com o Todo", do "amor intelectual a Deus", conhecimento que, na verdade, seria do terceiro gênero. Ou seja, em nenhum momento - e através de nenhuma obra - seria possível fazer com que alcançássemos a "ciência intuitiva", visto que só temos como meio o texto discursivo.
Outro ponto onde penso haver problema no texto é quanto à afirmação de que "o TIE não é uma obra filosófica", baseando essa opinião no fato de que "em várias notas... no TIE, podemos ler que determinados problemas serão resolvidos... em sua filosofia". E a chave para minha divergência é posta no próprio trabalho do Cleiton, na nota 17, quando está dito "A expressão utilizada por ele é 'mea Philosophia'". Seguindo comentador - que já não lembro qual... afinal, foram tantos livros lidos -, penso que "Philosophia" - com maiúscula, ao contrário da tradução que o Cleiton utiliza - era o título provisório da Ética.
Então, penso que o TIE é, sim, uma "obra filosófica", mas que está longe de ser a "obra filosófica definitiva"... como, aliás, também não seria o "Breve Tratado", a se julgar por alguns comentadores, que afirmam que essa obra já existia, então.
De qualquer forma, o TIE acaba por "esgotar-se" em seu próprio projeto, quando Spinoza já preconiza, como bem mostra o Cleiton, o aprofundamento de sua filosofia em outro livro. Eu diria que, conforme o "modismo" da criação de métodos, vigente à época, partindo, inclusive, do "eu" - como também destaca Cleiton, Spinoza sendo similar a Descartes -, poderíamos pensar apenas numa obra propedêutica ao sistema spinozano, que viria a seguir.
Convém reforçar, entretanto, que o texto é muito bom e que as minhas opiniões são apenas pontos de vista, que podem até ser aproximados, através de determinados esclarecimentos do autor.

2 comentários:

Cleitonzm disse...

Ricardo,

obrigado pelos elogios e pelas críticas muito pertinentes.Só agora que tive um tempinho pra dar uma passadinha no blog e vi teu off topic, rsrs. Tenho que resistir para não ensaiar agora mesmo uma resposta, mas estou sem tempo. Prometo que até a próxima semana darei satisfações por aqui. Abraços

Ricardo disse...

Cleiton:
Como eu fiz questão de registrar, o texto é muito bom. Portanto, são desnecessários os teus agradecimentos. Quanto às "críticas", elas são fruto de uma leitura... dentre muitas. Quando puderes, pelo menos, lançar algumas "luzes" sobre essa minha interpretação, talvez, afastando os meus enganos, agradecerei.
Abração.