quinta-feira, 28 de outubro de 2010

Política e Religião

  Em tempos de Política "misturada", propositalmente, com Religião, vale à pena ler o que Ancelmo Góis registrou em uma notinha na sua coluna, sob o título "Voto e religião".
  "Misturar religião com política é encrenca. Em 1932, a seção cearense da Liga Eleitoral Católica transformou-se em partido político e conseguiu eleger a maior bancada de deputados federais pelo estado. Seu slogan, criado por um padre, era o seguinte: 'Um voto para a LEC é um voto para Jesus Cristo'."
  Peraí, pessoal! A gente diz que o brasileiro não sabe votar, agora... mas antes a coisa era muito pior. Eu, particularmente, se fosse da oposição, diria: "Mas Jesus disse que seu reino não era deste mundo. Portanto, para não chatear o pobre Jesus, melhor não votar nele... quero dizer, no LEC!". E os votos dos deputados jesuíticos teriam ido para a oposição.
  Mas a nota continua: "Dois anos antes, autorizado pelo bispo de Fortaleza, o padre assumira a direção do setor de educação da Ação Integralista Brasileira no Ceará. A IAB era um movimento nacional, inspirado no regime fascista de Benito Mussolini.
  Ele se chamava Hélder Câmara e mais tarde viria a ser o pontífice do clero de esquerda brasileiro".
  Será que dom Hélder Câmara se reconheceria nessa nota? Integralista... que foi ícone do "clero de esquerda brasileiro"... pedindo votos para Jesus Cristo... Noooossa! Sem comentários, pessoal!

quarta-feira, 27 de outubro de 2010

"Penso, logo minto"

  "Era uma vez um país em que os candidatos a cargos eletivos anunciavam suas ideias para conquistar o eleitor e transformá-las em políticas públicas. As técnicas de propaganda eram utilizadas para dar um formato final e uma melhor comunicação a essas ideias.
  Se esse país algum dia existiu, ele foi extinto: hoje, o candidato, como qualquer produto, é moldado, em tempo real, on demand, às necessidades do público, pouco importando se o que ele diz corresponde ao que pensa".
  Bastante sagaz - e veraz - a percepção de Arnaldo Bloch, transcrita de sua coluna de O Globo, do artigo com mesmo título deste post.
  Sagaz, veraz... e triste. Não que eu seja um "romântico" da Política... mas ainda teimo em acreditar ser possível uma Política que possa ser escrita com "P" maiúsculo.
   A identificação - correta - do "candidato" como "qualquer produto", que é "moldado em tempo real", de acordo com pesquisas mercadológicas e com a ação dos "craques" dessa arte, os marqueteiros, é realmente desanimadora.
  O artigo continua, indicando que 100% da responsabilidade desse cenário atual, segundo o historiador Antônio Villa, é justamente dos marqueteiros, "os grandes inimigos da política e do eleitor".
  E Leonardo Boff complementa: "O discurso comum da política trabalha uma única intenção: a segunda intenção. Diz uma coisa, mas pensa outra. A retórica do político não está ligada à questão da verdade, mas do poder. Está, quase sempre, a serviço dos meios para alcançá-lo. A verdade só é dita quando interessa a esse fim".
  Acho que o grande mestre Machiavelli está sendo mal utilizado aqui. Afinal, o príncipe do florentino tinha uma quase missão - a unificação de uma comunidade que não se reconhecia enquanto tal - e que, para isso, precisava usar de todos os meios disponíveis. Se esse poderia ser tomado como um exemplo de quando "os fins justificam os meios", isso não deve ser tomado como regra geral... talvez, apenas, como "regra emergencial".
  Boff diz - ou, talvez, infelizmente apenas constate - que "a retórica do político não está ligada à questão da verdade, mas do poder". Bem... desde Platão, já nos acostumamos a ouvir que retórica é justamente isso: fazer um discurso verossímil... sem a necessidade real de que seja verdadeiro.
  Parece-me, entretanto, que há uma lógica perversa aqui, quando um ex-operário nordestino, de infância sofrida, que sabe - na carne - como é difícil lidar com políticos oportunistas que aparecem nos confins mais longínquos só antes das eleições e que manipulam eleitores desinformados para obter deles votos, repete um modelo político que só interessa aos exploradores de toda uma nação. Talvez, o ex-operário, migrado por necessidade de sua terra natal, devesse ser o mais aguerrido defensor de uma inversão desse modelo... inversão, não do "conteúdo", mas do próprio formato. Isso é, não da substituição dos "inimigos" pelos "amigos", mantidas as mesmas circunstâncias... algo como "só mudam as moscas, mas a m... é a mesma". Não! Uma mudança do modo de operar a política, ajudando quem tem necessidades imediatas, que não pode esperar para "aprender a pescar", num primeiro momento, e por isso precisa de um "peixe-bolsa-família", mas que não pode viver de ameaças de que esta ajuda, fundamental naquele instante, possa ser retirada se o adversário ganhar a eleição. Uma mudança que dê claros sinais de que bons programas são suprapartidários - ou, até mais, apartidários, e sim que pertencem ao povo, que deve ter o direito de deles fruir.
  Por último, eu rejeitaria a opinião do prof. Antônio Villa de que os marqueteiros têm 100% da culpa. Só tem esse poder quem atende a um sistema que valoriza o seu serviço. Portanto, políticos mal intencionados, povo desinteressado, mídia tendenciosa, etc., todos "auxiliam" na culpa desses "sofistas repaginados".

sexta-feira, 15 de outubro de 2010

Ufaaa!!! (2)

  O segundo "Ufa!" é para comemorar a saída de todos os 33 mineiros das entranhas da Terra.
  Parabéns a todos os envolvidos nessa bela estória de salvamento. Pena que, enquanto tantos se esforcem por manter pessoas vivas, tantos outros se dediquem justamente a matar, em ataques suicidas, em assassinatos de toda sorte, em chacinas, etc.
  Mas... assim caminha a humanidade... com todas as suas belezas e todas suas mazelas.

quarta-feira, 13 de outubro de 2010

Ufaaa!!!

  Incrível o resgate do primeiro, dos 33, mineiros que ficaram mais de dois meses soterrados no Chile.
  Que felicidade vê-lo sair bem. Tomara que tudo continue correndo da forma esperada.

terça-feira, 12 de outubro de 2010

"O verme de Spinoza"

  Da mesma forma que eu não conhecia o texto de Fichte sobre Machiavelli, nunca pensei em ler um artigo sobre Spinoza escrito pelo autor de "Admirável Mundo Novo" e "As portas da percepção", Aldous Huxley.
  Mas nesses dias, andando por um "sebo" - ou "alfarrabista", para nossos amigos portugueses -, vi na seção de Filosofia um livro de Aldous Huxley chamado "Visionários e Precursores". Fiquei curioso e peguei o livro para dar uma olhada. São vários artigos, sendo o primeiro sobre Pascal, o segundo sobre Spinoza - com o título deste post -, além de outros sobre Baudelaire, São Francisco e etc.
  O título do texto faz referência ao escrito de Spinoza que fala sobre um verme imaginário que habitasse o interior do sangue e tivesse discernimento suficiente para perceber que as diversas partículas sanguíneas formam, em realidade, um "todo". Huxley indica, então, que "o fundo da questão - e este é o fundo de toda a filosofia de Spinoza - é que deveríamos viver, mover-nos, ter a nossa existência no infinito, em vez de a ter no finito; que deveríamos relacionar nossos pensamentos com a unidade universal, não com as particularidades individuais".
  Eu não diria exatamente que Spinoza propôs que deveríamos deixar de "relacionar nossos pensamentos com as particularidades". O luso-holandês dizia que tínhamos que perceber as partes, suas relações mútuas e as relações destas com o "Todo". E as relações com as particularidades são necessárias justamente porque são esses "encontros" que poderão aumentar - mas também, diminuir - nosso "conatus"... trazendo-nos a alegria e a beatitude - ou, infelizmente, a tristeza.
  De qualquer forma, o texto é interessante.
  Uma passada de olhos pelo livro dá uma visão de quanta cultura tinha o Sr. Huxley, dominando assuntos bastante diversos. Com o passar do tempo... e da leitura, registrarei mais algumas coisas.

sexta-feira, 1 de outubro de 2010

"Pensamento político de Maquiavel"

  Já que o assunto é "Política", não poderíamos deixar de lembrar daquele que desfez mitos nessa área, mostrando o que a maioria dos homens efetivamente pretende quando usa essa "ferramenta" chamada "Política"... falo, obviamente de Niccolò Machiavelli.
  O título do post é o mesmo daquele de um livro - também adquirido recentemente por mim. Apesar da minha completa ignorância, até então, sobre esse escrito, não tive dúvidas em adquiri-lo. "Por quê?", perguntarão alguns, "Afinal, há vários títulos sobre Machiavelli no mercado". O que me chamou atenção foi o autor... ninguém menos que Johann Gottlieb Fichte!!!
  Como eu disse acima, não sabia que Fichte havia escrito sobre Machiavelli. Fico pensando, cá com meus botões, antes de ler o exemplar, sobre a afinidade de intenções de unificação dos seus respectivos países que passavam nas cabeças do alemão e do italiano. Apesar de refletir também sobre a diferença de atitudes dos dois - o alemão, arrojado, militante e "agente", enquanto o italiano, meticuloso e "pensante".
  Na verdade, Fichte publicou o ensaio na revista Vesta sob o título "Sobre Maquiavel como escritor e excertos de seus escritos". 
  Na apresentação, o organizador e tradutor Rubens Rodrigues Torres Filho diz: "O ensaio tem a estrutura de uma obra de divulgação (o próprio Fichte, segundo testemunhos da época, estava tendo seu primeiro contato com Maquiavel): compõe-se de uma extensa introdução, com dados biográficos, históricos e enumeração de obras, acompanhados de ocasionais observações (e apenas um capítulo diretamente interpretativo, onde se indaga 'em que medida a política de Maquiavel se aplica aos nossos tempos'); uma seleção de textos de O Príncipe, traduzidos para o alemão e comentados; e uma conclusão geral, onde se trata menos de Maquiavel que de seus leitores atuais".
  Apesar de, possivelmente, básica, parece que o interesse maior que a obra suscita  é por representar o entendimento que um gigante como Fichte tem de outro pensador da envergadura de Machiavelli, que o organizador bem indica desta forma: "Mas a interpretação, a inflexão da leitura que Fichte faz de Maquiavel, permeia o texto do começo ao fim, incidindo sobre a própria tradução e o recorte dos trechos de O Príncipe que inclui. Fichte dá, com isso, um exemplo de escrever sobre um escritor político, o que significaria, já, escrever sobre política e - mais ainda - escrever politicamente".
  Deu água na boca...   

A política e Hannah Arendt

  Aqueles que acompanham o blog sabem o quanto aprecio Frau Hannah Arendt. Por esses dias, numa visita à livraria de dentro da Universidade, encontrei - e, obviamente, comprei - o livro "Hannah Arendt - Entre o Passado e o Futuro", organizado por Adriano Correia e Mariangela Nascimento, publicado pela Editora UFJF.
  A capa não poderia representar melhor o subtítulo do livro. Nela, foram colocadas, lado a lado, as fotos da jovem judia Hannah - de compleição magra, mas transbordando força vital - e da velha senhora Arendt - com um sorriso no rosto, mas que não deixa, também, dúvidas sobre a potência existencial ainda reinante ali.
  O prefácio - que corresponde ao artigo "A presença de Hannah Arendt" -, escrito pelo professor Newton Bignotto, do Depto. de Filosofia da Univ. Federal de Minas Gerais, em certa medida, fez-me refletir novamente sobre a decrença que vivemos em relação à Política, nesses tempos de proximidade de eleições. Aliás, esse sentimento angustiante pode ser percebido no escrito da nossa amiga dos amigos Denise, no seu comentário ao último post.
  Vamos ao que escreve o prof. Bignotto sobre o livro escrito por Arendt em 1958: "A condição humana é um extraordinário elogio da política e uma aposta em sua importância num mundo no qual ela parecia relegada a um segundo plano. Perguntada certa vez se essa atividade ainda fazia sentido, Arendt respondeu que sim, pelo simples fato de que ela se identifica com a liberdade. Sua resposta naquele momento, e talvez hoje também, não tinha nada de óbvia".
  O desencantamento com a política - principalmente com a má política - é um fato, atualmente. Mais curioso ainda é que até o "encantamento" com ela passa por manipulações que são fruto da má política. Ou seja, até o que parece participação, por vezes, é fruto de manipulação, onde o militante é mero joguete na mão de interesses que vão muito além de sua percepção.
  Mesmo assim, como dizia Arendt, a Política - essa, com "P" maiúsculo - ainda faz sentido, porque ela se identifica com a liberdade. Liberdade, entenda-se, que pode se desdobrar em diversos referenciais, além da possibilidade de apresentar livremente nossas ideias, mas também a possibilidade de um trabalho digno, de uma educação séria, de uma saúde presente, de um ambiente seguro... e muito mais.
  Viva a Política! Boa eleição - na medida da possibilidade do nível dos nossos políticos!