terça-feira, 21 de maio de 2019

José Padilha


   José Padilha é o criador da série O Mecanismo, que já vai para a segunda temporada na Netflix. A revista Veja nº 52 publicou uma matéria sobre o lançamento e uma pequena entrevista com o próprio Padilha. Sabemos que o produtor Padilha pertence ao campo ideológico da esquerda, contra o atual presidente Bolsonaro. Por isso mesmo, achei relevantes duas das respostas da pequena entrevista. Nelas, Padilha declara:
   "Quem elegeu Bolsonaro foi a esquerda. Antes das eleições, eu disse que três nomes estavam na disputa: Bolsonaro, Haddad e Ciro Gomes. Só Bolsonaro e Ciro, que não tinham ligações com a Lava-Jato, tinham chances. Mas a esquerda decidiu apoiar Haddad" e
   "O impeachment foi uma enorme farsa, um golpe. Mas quem deu o golpe? Foi o vice-presidente em que todos os eleitores do PT votaram. Foi um golpe interno de quem estava no poder. Uma quadrilha se fracionou em duas. Não foi a direita que derrubou o governo: foi o MDB que estava associado ao PT. Dilma foi uma tragédia para o Brasil. Se ela foi vítima, é porque se aliou ao Temer. Quem dorme com cobra acorda picado".
   Antes de fazer um pequeno comentário sobre essas declarações, quero dizer que não concordo integralmente com Padilha. Mas... vamos lá.
   Falou-se muito, na época da eleição, do erro estratégico do PT em tentar "forçar" a candidatura de Lula, mesmo que alguns, dentro do próprio partido, reconhecessem a pequena probabilidade do TSE acatar a inscrição do ex-presidente. Contudo, quando os números do "sucessor" Haddad começaram a crescer, esse possível engano foi sendo descaracterizado como tal. Quando o segundo turno se desenhou, Ciro Gomes passou a ser pressionado para dar amplo apoio ao candidato do PT - mas não o fez. A "culpa" pela vitória de Bolsonaro, então, caiu no seu colo. Interessante, então, observar que esta culpabilidade migrou, pelo menos segundo a percepção de alguns, para a esquerda, por conta do apoio a Haddad - muito em função do protagonismo do PT junto às esquerdas.
   O segundo comentário diz respeito ao reconhecimento de que o "golpe" - deixei entre aspas para deixar a discussão sobre a real natureza do impeachment em aberto - não foi dado pela direita, mas que foi algo interno. Mesmo relatando sua revisão pessoal com a figura do, hoje ministro, Sérgio Moro - de admirável combatente contra a corrupção a alguém associado à "esgotosfera da milícia no Rio" -, Padilha não bate na tecla dos petistas ortodoxos, que culpam o ex-juiz por favorecer a direita - de modo planejado desde então. Se houve "golpe" - e, para ele, houve -, este foi interno, com certa participação do próprio PT, por escolher mal seus companheiros.
   O último comentário é mais uma observação sobre a contundência de uma das afirmações de José Padilha, quando este diz que "uma quadrilha se fracionou em duas". Nem falo nada...

quinta-feira, 16 de maio de 2019

"A guerrilha no palácio"


   A revista Veja desta semana traz como matéria de capa a presença, ainda que não física, do "ideólogo" Olavo de Carvalho no governo do presidente Bolsonaro.
   Sem a ingenuidade de quem lê a matéria como completamente neutra, no sentido ideológico, faço algumas reflexões. 
   A primeira delas - e é justamente o que me chama mais atenção - é sobre a personalidade de Olavo de Carvalho. Antes de fazer a graduação de Filosofia, já tinha interesse pelo assunto. Além da leitura óbvia de Marilena Chauí e Danilo Marcondes - livros introdutórios de qualidade, utilizados até hoje -, tive a oportunidade de assistir às aulas do professor Olavo de Carvalho, gravadas em vídeo. Polêmico, atacava os "erros" de gigantes, como Kant, por exemplo. As palavras eram até "duras", mas havia uma argumentação... ainda que esta pudesse ser rebatida por especialistas. 
   Portanto, o lado polemista do professor Olavo, eu já conhecia. O que não me foi apresentado foi um vocabulário cheio de palavrões. Sinceramente, isso me decepcionou muito. Nem estou entrando no mérito dos conteúdos combatidos, mas é inimaginável, para mim, ver um "filósofo" usando como argumento palavrões.
   A segunda observação diz respeito a uma curiosidade apenas. Quando Bolsonaro estava disputando a eleição, muito se falava na possibilidade de volta da ditadura militar, visto que havia um claro alinhamento do corpo das Forças Armadas com o candidato. Eis que, agora, os militares podem estar sendo brandos demais... segundo o pensamento de Olavo e seus admiradores. 
   A matéria diz:
  "o guru [Olavo de Carvalho] e seguidores acham que os militares são excessivamente dóceis com os esquerdistas infiltrados nas universidades, nas escolas, na Igreja, na produção cultural, na imprensa e até mesmo nas Forças Armadas".
   Os possíveis "usurpadores do poder, pela via antidemocrática", que seriam os militares, se transformaram em mantenedores do diálogo democrático. Afinal, para eles "Olavo é uma força do extremismo político" - ainda segundo a matéria -, sendo necessária a diminuição de sua participação no governo, a fim de que possa haver uma unificação nacional do povo em torno de um projeto de país.
   Vamos aguardar que essa confusão "interna" acabe da melhor maneira possível para o Brasil

quarta-feira, 8 de maio de 2019

O socialismo como "bom"


   Um dos maiores problemas que há quando se fala em "socialismo" é, numa atitude que poderíamos chamar de ingênua, por ser pouco refletida, dizer que aquilo que o diferencia do capitalismo é que ele pretende o bem das pessoas. Isso lança sobre o capitalismo a pecha de ser aquele que não se importa com o bem das pessoas, admitindo o mal... para não dizer mesmo, desejando-o.
   Noberto Bobbio, por exemplo, no livro Escritos sobre Marx: dialética, estado, sociedade civil, indica:
   "Podemos dizer que uma teoria do socialismo sempre existiu, porque sempre existiram no homem aspirações a uma sociedade melhor, fundada sobre a igualdade dos homens, isto é, sobre o princípio fundamental em que se inspira toda doutrina comunista, de que as desigualdades sociais devem ser eliminadas".
   Isso é uma espécie de juízo de valor que iguala "socialismo" ao  que é "bom". O outro lado, portanto, representando o que é mau.
    Essa é uma visão de senso comum. Fala-se, por vezes, até em um "socialismo/comunismo" reinante entre os grupos cristãos primitivos. Ora, uma coisa é uma coesão social ditada por uma visão mais comunitarista, algo do tipo "solidariedade orgânica", como proposto por Durkheim; outra, é chamar isso de "socialismo/comunismo" - principalmente, se estamos tratando desses temas dentro das Ciências Socias.
   Ainda no mesmo texto, Bobbio diz que: "o socialismo geralmente foi sustentado com razões que podemos dizer sentimentais". Portanto, temos que ter cuidado quando queremos categorizar, com essas "razões sentimentais", algo dentro do campo científico.
   O livro de que tenho falado, escrito por Saturnino Braga, também vai na mesma linha, quando diz:
   "Sim, antes de tudo, o socialismo é uma ética: ninguém é socialista senão por um impulso que fala de justiça, de igualdade, de respeito e valorização do trabalho, de solidariedade e mesmo de fraternidade entre os seres humanos".
   Logo a seguir, explica que:
   "a ética é a meditação, o debate filosófico sobre o bem e o mal, sobre o que é bom para todos, o que faz o bem universal, o que é certo e o que é errado na convivência com os outros [...]; é o conjunto de normas e convicções que constitui a base moral de uma sociedade humana".
   Embora essa parte final do texto - que, lembremos, não é de um filósofo - acabe por identificar "ética" e "moral", o que não parecia ser a intenção inicial, que aparentemente chamava de "ética" a "meditação e debate" sobre o "conjunto de normas", isto, sim,  a moral, percebe-se que o "socialismo" aparece como vinculado ao que é moralmente "bom". Sobrará ao seu adversário realizar, assim, o que é mau. 
    É importante reconhecer que se, como eu mesmo já disse em outros posts, o ímpeto inicial de Marx realmente pareça ter um caráter humanista, não dá para negar que o homem médio, mesmo imaginando ser o capitalismo o melhor modelo de sociedade, também pode ser um humanista, preocupado com o bem-estar dos seus companheiros.

terça-feira, 7 de maio de 2019

O preço da eleição


   Ainda no mesmo livro do post anterior - no mesmo trecho, aliás -, Saturnino Braga fala sobre os serviços dos especialistas em ciência da psicologia eleitoral.
   Diz ele:
  "Tais serviços profissionais, prestados via de regra por toda uma equipe, custam somas vultosas que só os candidatos endinheirados podem pagar. E somas ainda muito maiores custa a cobertura noticiosa que os candidatos conseguem ter nos meios de comunicação, e que constitui outro fator absolutamente decisivo de êxito. A tal ponto que se pode hoje afirmar que o dinheiro é o fator mais importante numa decisão eleitoral de uma democracia moderna."
   Ou seja, por trás da lógica da manipulação "afetiva" dos profissionais em psicologia eleitoral, há o interesse de grandes grupos econômicos.

O voto


   Estava lendo um livrinho de Roberto Saturnino Braga, Entre séculos - textos políticos, publicado pela Contraponto, e me deparei com algo que já discutimos aqui, sobre a questão da racionalidade do voto.
   O texto expressa uma opinião que já defendi. Diz o seguinte:
"... a decisão do voto não é um ato puramente racional do eleitor esclarecido; é influenciada por um conjunto de impressões, emoções e sentimentos que os candidatos vão suscitando em seu espírito no curso da campanha. E a ciência da psicologia eleitoral formou profissionais especialistas na apresentação de candidatos cujos serviços produzem efetivamente resultados na cabeça do eleitor, principalmente no seu coração".