sábado, 31 de outubro de 2009

Primeiras impressões sobre "Espinosa e o cartesianismo"

Ao contrário do que eu pensei, o livro de Homero Santiago não é lançamento recente. Ele foi publicado em 2004. Mas era totalmente desconhecido por mim - o que é raro, no que se refere a obras sobre Spinoza -, até a indicação de sua existência por parte do amigo Guilherme.
O livro, segundo o autor, retoma sua dissertação de mestrado, defendida em 2001, que versava sobre a ordenação geométrica com que Spinoza produziu seu "Princípios da Filosofia Cartesiana".
O Prefácio começa tratando da expansão da filosofia cartesiana no seu começo. Interessante destacar, conforme escreve Homero Santiago, que é na Holanda que o cartesianismo é estudado no meio acadêmico formal. Na França, "a doutrina dissemina-se à margem das universidades e escolas, sendo discutida nas casas de nobres". E, justamente por "frequentar" o meio acadêmico, é na Holanda que "já ao final da década de 30 do século XVII inflexões cartesianas fazem sentir-se".
Em 1663, Spinoza faz publicar seu "Princípios da Filosofia Cartesiana", a partir das aulas dadas por ele a um jovem universitário. Conforme diz Homero, "seu objetivo primeiro, anunciado pelo título e sobre o que insiste o prefácio, é a exposição dos princípios da filosofia cartesiana segundo a maneira geométrica". Aliás, a famosa "ordem própria dos geômetras" foi definida pelo próprio Descartes nas Segundas Respostas. Disse ele: "as coisas que são propostas como primeiras devem ser conhecidas sem a ajuda das seguintes, e as seguintes devem depois ser dispostas de tal forma que sejam demonstradas só pelas coisas que as precedem". Ou seja, é o ideal da clareza e distinção! Entretanto, Descartes não conseguiu fazê-lo. E Spinoza?
Se o "jovem" Spinoza não conseguiu a perfeição na sua tentativa, pelo menos, esta o prepara para a tarefa futura, que seria a de realizar o mesmo encadeamento, só que com o seu próprio sistema... que vem à luz com "Ética".
O livro de Homero Santiago parece bem "denso". Para os spinozanos, penso que vale à pena ser comprado. Ainda que não sirva como introdução ao pensamento do nosso querido filósofo, pode fundamentar o entendimento de como ele pretendia estruturar um sistema segundo uma "ordem geométrica". Além disso, é a melhor forma de entender a doutrina cartesiana - mas que os cartesianos não nos leiam. Rsss.

sexta-feira, 30 de outubro de 2009

Sugestão de leitura para os iniciantes



Comprei, ontem, o livro "Simples filosofia - a História da Filosofia em 47 crônicas de jornal", de Pablo Capistrano, pela Ed. Rocco. O subtítulo "História da Filosofia em 47 crônicas" me parece um pouco "ambicioso" demais. Eu colocaria algo como "Simples filosofia, em 47 crônicas". Mas o livro é muito agradável de ser lido. Penso que atende muito bem àqueles alunos que se interessam pela Filosofia e que desejam ir um pouco além do livro básico escolar.
O mais importante é que, ao lado de situações absolutamente quotidianas - e bem brasileiras -, o autor deixa "desfilar" pensadores como Heráclito, Parmênides, Kant, Nietzsche, Wittgenstein, Heidegger e outros. Na contracapa, um pequeno comentário  "Questões essenciais pensadas pela Filosofia de maneira original. É o que oferece este livro àqueles que não se deixam influenciar por preconceitos intelectuais e ainda guardam em seu coração uma pitada de humor, imaginação e desejo de ultrapassar o feijão com arroz da reflexão diária".
O autor, que é mestre em Filosofia pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte, entende que "é possível falar simplesmente de coisas profundas", e produz textos interessantes. Pela pequena extensão dos escritos, penso que ele consegue fazer um ótimo trabalho. Ele chega até a levantar reflexões que fogem à mesmicie dos textos didáticos comuns.
Numa das crônicas, por exemplo, ele explica que "a rigor a Grécia não existiu até 1820, quando houve a guerra de independência contra os turcos... antes, a Grécia (ou Hélade) não era um país, no sentido moderno, mas um amontoado de cidades-estado, mais ou menos independentes, com regimes políticos próprios, deuses particulares, composição étnica e jurídica distintas... Por isso, é muito impreciso dizer que 'a Filosofia começou na Grécia'. Primeiro porque Tales, o mais antigo filósofo... morava em Mileto, na costa da Turquia. Então, mais exato seria dizer que a Filosofia começou na Turquia". E Pablo complementa de modo muito bem humorado "Porém, dizer uma coisa dessas é perigoso. Poderia gerar sérios problemas políticos, porque os gregos e turcos têm uma relação um pouco menos amistosa do que a de brasileiros e argentinos às vésperas de uma final de Copa América".
Nessa mesma crônica, ainda discute se a Filosofia não teria uma gênese real no Oriente, ou pelo menos se não haveria um "influência" oriental sobre os primeiros filósofos gregos. E, em pouquíssimas três páginas, tem espaço para indicar que "Mas... Diógenes Laércio, eurófilo militante, defendeu a ideia de uma espécie de 'milagre grego'. Assim, a Filosofia teria surgido repentinamente... sem antecedentes... sem nenhuma influência do Oriente".
Em outra crônica - e, destaco novamente, apesar do reduzido espaço -, o autor nos mostra que a "Lei dos Três Estágios", sempre referida a Auguste Comte, no século XIX, teve como referência um trabalho do francês Anne Robert Jacques Turgot (1727-1781), escrito em 1750, sobre uma teoria de estágios de desenvolvimento social do homem. Pablo mostra que, segundo a dupla Turgot-Comte,o estágio filosófico teria substituído o estágio mitológico, preparando o estágio científico, e afima que essa visão da "Filosofia surgida a partir de uma ruptura inicial com a mitologia... acabou por se tornar um dos 'dogmas de livros didáticos de Ensino Médio'".
Portanto, recomendo a observação do livro pelos amigos do blog que são professores, a fim de que este possa ser sugerido aos alunos... e o mesmo serve aos amigos que são iniciantes na Filosofia, e gostam de uma leitura leve e com conteúdo.

quinta-feira, 29 de outubro de 2009

Novo amigo dos amigos

Cada vez que abro o blog e percebo um novo "amigo dos amigos" fico satisfeito. Como sempre, cumpro meu ritual de, além de dar as boas vindas, abrir o espaço aos comentários que este nosso novo amigo, o reverendo Ronaldo Mendes, julgue pertinente registrar.
Seja bem vindo, Ronaldo, e fique à vontade para apor suas considerações sobre os diversos temas. Os debates "desarmados" são sempre interessantes de serem levados adiante e são uma constante por aqui.

Mais uma comemoração spinozana


Apesar de não ter certeza sobre a data de lançamento do livro "Espinosa e o cartesianismo", de Homero Santiago, publicado pela Editora Humanitas, sobre o qual só tomei conhecimento hoje, através da informação do nosso incansável "buscador" Guilherme, registro que há mais um motivo para nós, spinozanos, comemorarmos... afinal, lança-se mais uma luz sobre o pensmento do nosso querido filósofo luso-holandês.
Ainda que o livro já tenha sido lançado há algum tempo, visto que a divulgação não nos deu acesso a ele, comemoremos seu "nascimento" agora.
Amanhã colocarei as mãos no meu exemplar. Aos amigos spinozanos, prometo comentários em breve. E, ao amigo Guilherme, novo agradecimento.

"Caim", de Saramago, lido

O livro é relativamente pequeno, aproximadamente 170 páginas, e a leitura flui bem. Portanto, não foi difícil chegar ao mim desta obra do fantástico autor que é Saramago.
A conclusão é que Saramago foi muito criativo e muito perspicaz na narração da sua história de Caim. 
Considerando que há uma ideologia antirreligiosa como pano de fundo - o que o próprio Saramago parece deixar claro em suas entrevistas sobre o livro -, não se pode deixar de parabenizá-lo pela escolha das "armas" com que enfrentará seus adversários. Estas "armas" - sem nenhum espírito beligerante - são as estórias que constam do Livro Sagrado, a Bíblia.
A estória se desenrola, após o assassinato de Abel pelo irmão Caim, com diversas viagens do assassino através do tempo, levando-o a presenciar vários dos acontecimentos narrados no Antigo Testamento. O objetivo de nos colocar para pensar em que tipo de Deus poderia produzir tantas barbáries é plenamente alcançado através das escolhas de Saramago. Vemos, então, junto com Caim, Abraão quase matar o próprio filho Isaac - aliás, o pedido de explicação de Isaac ao pai, sobre o porquê daquela atitude chega a ser emocionante -; acompanhamos Lot se propondo a entregar suas duas filhas para serem abusadas sexualmente por uma turba, a fim de proteger os anjos que estavam em sua casa, em Sodoma, e posteriormente esta ser destruída, junto com Gomorra, levando à morte crianças totalmente inocentes; testemunhamos a ira de Moisés quando descobre que um bezerro de ouro foi confeccionado para servir como um deus, invocando os levitas a lançarem mão das espadas e irem ao acampamento e matarem o irmão, o amigo e o vizinho; relembramos que, após a queda de Jericó, homens, mulheres, crianças e animais são exterminados - crianças e animais, aparentemente, sem nenhuma culpa, apenas por pertencerem a um determinado povo... isso é um ponto a ser refletido, pois esta foi a mesma "culpa" dos judeus na época do nazismo -; assistimos ao castigo do fiel Jó, apenas para que Deus prove a Satã que o pobre homem não abandonaria sua  fé, mesmo que lançado ao inferno em vida - quiçá seja o primeiro caso de um homem que é castigado por ser bom demais.
Ou seja, presenciamos todas as iniquidades que compõem o livro dito "sagrado"... e Caim, mesmo assumindo a culpa do seu ato vil, se questiona por que Deus também não deveria culpar-se, a si mesmo, pelos próprios atos.
Mas nem só de desgraça se compõe o livro de Saramago. Como é típico deste autor, aparecem lances da mais fina ironia. O caso mais expressivo disso, na minha opinião, diz respeito à passagem em que Josué, no meio da batalha, se dá conta de que precisa "prolongar" o dia, a fim de não deixar os inimigos se evadirem, podendo executar a todos. Eis um resumo do trecho em questão, respeitando o estilo saramaguiano de escrita:
"Josué, vendo que o sol declinava... levantou os braços ao céu, já com a frase preparada para a posteridade, mas, nesse instante, ouviu uma voz que lhe sussurrava ao ouvido, Silêncio, não fales... nada, reúne-te comigo... josué... dirigiu-se rapidamente ao lugar do encontro. Sentou-se... e disse, Aqui estou, senhor, faz-me saber a tua vontade, Suponho que a ideia que te nasceu na cabeça, disse o senhor..., foi pedir-me que parasse o sol, Não posso fazer o que me pedes. Um súbito pasmo fez abrir a boca de josué,... Não podes fazer parar o sol, perguntou, e a voz tremia-lhe porque cria estar proferindo, ele próprio, uma horrível heresia, Não posso fazer parar o sol porque parado já ele está... desde que o deixei naquele sítio... Algo se move realmente, mas não é o sol, é a terra... [Diz Josué:] Então, se assim é, manda parar a terra, que seja o sol a parar ou que pare a terra, a mim é-me indiferente desde que possa acabar com os amorreus, Se eu fizesse parar a terra, não se acabariam só os amorreus, acabava-se o mundo, acabava-se a humanidade... todos os seres e coisas que aqui se encontram, até mesmo... árvores, apesar das raízes que as prendem à terra, tudo seria lançado para fora como uma pedra quando a soltas da funda".
Josué, mesmo assim, solicita a Deus alguma providência. Este diz que pode limpar as nuvens do céu, a fim de que este fique mais claro, mas que Josué terá que ser rápido com a batalha. Antes de Josué voltar, porém, eles combinam que o guerreiro, para infundir moral nos soldados, invocará o Senhor e solicitará que Este detenha o Sol até o fim da batalha. Assim, a história registrará, como diz Saramago, que "houve um dia... em que o senhor, porque combatia por israel, deu ouvidos à voz de um homem".
O fim do livro é surpreendente... mas eu não vou contar.

quarta-feira, 28 de outubro de 2009

Inovando o blog

Graças a uma dica do amigo Guilherme, dada indiretamente, consegui colocar um cantinho para os últimos comentários. Garante-se assim que não perderei comentários feitos em posts mais antigos... como já aconteceu algumas vezes. Desta forma, comentários novos de assuntos que já "passaram" podem trazer o tema de volta ao blog, a fim de ser discutidos sob uma perspectiva atualizada. Além disso, os amigos poderão ver se já respondi seus comentários, a partir do tal cantinho dos "últimos comentários".
Obrigado, Guilherme!

terça-feira, 27 de outubro de 2009

"Contra-história da Filosofia" - Introdução

Concluída a leitura do livro "Contra-história da Filosofia", de Michel Onfray - ou, pelo menos, a parte que me propus a ler, que dizia respeito à Introdução, ao pensamento spinozano e à Conclusão -, faço alguns comentários sobre o livro.
Neste post, pretendo falar exclusivamente da Introdução.
Recordo que o livro "encaixava" o pensamento spinozano no movimento dos libertinos barrocos. Mas o que poderíamos chamar de libertino? Onfray explica que "o termo libertino... no início, desacredita um homem, um pensamento: o libertino denomina, de outro modo, o ateísta, como se dizia na época... o heterodoxo, o herético... que não crê no Deus dos cristãos com o fervor... exigido pela Igreja católica... A etimologia...: o libertino - o libertinus romano - define o 'emancipado'".
Depois, Onfray faz uma distinção entre os "libertinos eruditos" e os "libertinos de costumes". O primeiro tipo corresponderia a um modo "emancipado" de pensar, enquanto o último a uma visão mais próxima do que o senso comum chama de "libertinagem", ou seja a qualidade de agir amoralmente.
Se o termo "libertino" está explicado, por que do "barroco"? Onfray alega duas percepções para o termo. A primeira diz respeito ao "jogo da luz no escuro", tão bem representado pelo quadro "Filósofo ao pé da escada", do vizinho de Spinoza, Rembrandt. Ou seja, "o filósofo libertino, o libertino barroco, o pensador emancipado trazem luzes num tempo tenebroso". A outra diz respeito ao estilo "torneado, burilado... retórica de volutas, ... jogos de forças e contraforças, ... repetições... efeitos de espelho", como o de Pierre Charron, por exemplo, ou "a arquitetura more geometrico de um Spinoza, cuja 'Ética' propõe um castelo de formidáveis potencialidades existenciais".
Onfray admite que há que se fazer uma certa "adaptação" para que os pensadores em questão entrem no universo libertino barroco. Essa é uma honestíssima confissão, e ela é feita de modo a não nos sentirmos meros "rotuladores" de um pensamento. E, mais do que isso, conseguimos compreender que o pensador em questão não se resume àquilo que é apresentado. Isto é um aspecto reduzido de todo o vigor pensante do filósofo analisado... mas haverá sempre muito mais a descobrir. Diz ele: "Descreve-se a configuração geral, apreendem-se de longe os contornos, apaga-se o detalhe para melhor traçar uma figura legível. Assim, força-se a entrar nos limites de algumas páginas a vitalidade transbordante de pensamentos e de pensadores cujo valor reside justamente em sua irredutibilidade".
Onfray demarca o período "libertino barroco" segundo sua subjetividade, mas explica de modo aceitável seu ponto de vista. Dirá, então, que o período se inicia com a morte de Montaigne e se encerra com a morte de Spinoza. A escolha de "mortes" como marcos não é à toa. Onfray nos explica, até poeticamente, que "a morte física de um pensador assinala a data do nascimento do devir do seu pensamento".
Ao fim da Introdução, Onfray estabelece rigidamente o seu conceito do personagem que será analisado. Diz ele: "Os libertinos barrocos procedem de condições históricas semelhantes: primeiro, pertencem a uma genealogia montaigneana; segundo, propõem uma epistemologia singular, que ativa um método de desconstrução cética; terceiro,... promovem uma ética imanente e, quarto, avançam considerações inéditas sobre as questões da religião, lançando as bases de crenças religiosas fideístas".
O primeiro ponto, além de dizer respeito ao início histórico escolhido por Onfray, indica algo sobre uma filiação de vários filósofos franceses, principalmente os que gravitam em torno de Descartes - este, também, com uma genealogia montaigneana.
O segundo ponto, ainda mantém alguma ligação com o primeiro. Afinal, o ceticismo ganha expressão, novamente, com Montaigne. Entretanto, um destaque de Onfray é que "o libertino barroco recorre a um método cético. Um método, nada mais... Mas ninguém conclui pela suspensão do juízo ou pela incapacidade de concluir... Duvida-se, mas por uma tábula rasa útil e necessária à reconstrução" - novamente, a lembrança de Descartes nos ocorre.
Envolvendo o terceiro e o quarto pontos, embora o autor esteja a citar especificamente o terceiro, Onfray indica que "a Verdade, a Lei, a Religião, a Moral e outros ídolos maiúsculos, mas também os ídolos minúsculos - os costumes, os modos, as crenças - passam pela decapagem crítica".
Ainda no que se refere à ética, Onfray destaca que "a moral deles não é prescritiva, mas consequencialista. Esse além do Bem e do Mal, em benefício de um Bom e de um Mau, se encontrará na 'Ética' de Espinosa". Eu, particularmente, teria registrado esse "bom" e "mau" com minúsculas, mas... o autor é ele.
Por último, Onfray destaca que "nenhum libertino barroco é ateu". Segundo ele "Não está na hora do ateísmo. Cedo demais". Diz ainda: "Ninguém parte em guerra contra Deus. Deixam-nos lá... pensam-no... descuidado do destino dos homens. Essa maneira de abandonar esse tema contribui para a separação... da Fé e da Razão".
Já próximo ao fim da Introdução, Onfray escreve um trecho sob o título "Arrematar e consumar a libertinagem", onde faz uma observação interessante: "Enquanto poupam a religião católica..., enquanto respeitam Deus e os princípios da monarquia francesa, para evitar desordens e guerra civil, os libertinos barrocos limitam suas potencialidades radicais e críticas.
Para se desfazer do Deus dos católicos - ... onipotente, onipresente e onisciente... - e do rei, encarnação de Deus na Terra, era necessário um filósofo que não fosse francês, que não fosse formatado pelo pensamento cristão... Esse filósofo existe... Baruch de Espinosa... Seu vigor e sua potência conceitual rebaixam e superam os libertinos barrocos... Com Espinosa, se arremata um momento filosófico, enquanto se prepara a imensa aventura das Luzes".
Ou seja, já na Introdução, fica claro que Onfray não vê em Spinoza apenas mais um libertino barroco, mas já um ultrapassamento deste conceito em nosso querido filósofo. Esta opinião ficará mais perceptível ainda, na Conclusão do livro.
Por ora, gostaria apenas de ponderar que não me parece totalmente justo imputar a desconstrução do Deus católico ao fato de Spinoza estar fora de uma tradição francesa... e cristã. Afinal, talvez, mais forte do que o "Deus cristão" fosse o "Deus judaico". E, desse, Spinoza começou a se livrar ainda no seio de sua comunidade judaica. Ou seja, Spinoza já se movimentava na direção de um questionamento do plano transcendente desde muito cedo. Eu poderia imaginar - e realmente é só um exercício especulativo - que Spinoza fá-lo-ia, da mesma maneira, caso tivesse nascido na na tal tradição francesa.
Em relação ao aspecto político, realmente, Spinoza parece estar mais à vontade para defender a democracia republicana a partir da experiência da sua Holanda, onde, mesmo sob forte tensão, coexistem os movimentos republicano e monarquista, alternando-se.
Depois eu falo de um engano de Onfray, na parte referente ao nosso querido Spinoza.

segunda-feira, 26 de outubro de 2009

Míriam Leitão e "O destino do Rio"

Na última sexta-feira, fui a uma festa infantil. Entre algumas brincadeiras, tive a oportunidade de conversar assuntos "sérios" com amigos. Papo vai, papo vem e caímos em Míriam Leitão. Tive que me conformar em ser voto vencido quanto à afirmação de que a achava boa articulista. Outros dois amigos - um deles, meu compadre - mantiveram-se firmes em suas convicções de que ela era uma jornalista volúvel, que defendia suas opiniões ao sabor dos ventos econômicos que soprassem.
Coincidentemente, neste fim de semana, li um artigo da jornalista Míriam Leitão que poderia justificar minha opinião. O assunto, é verdade, não era economia, mas uma reflexão sobre o Rio e seus problemas de segurança.
Gostaria de utilizar apenas um pequeno trecho do artigo intitulado "O destino do Rio", publicado no jornal O Globo.
"A semana passada foi difícil. A derrubada do helicóptero da Polícia Militar pelo tráfico de drogas, a morte do Evandro do AfroReggae e o comportamento criminoso dos policiais militares trouxeram de volta a consciência dos fracassos e os dilemas nacionais em relação à segurança pública.
Conversei com pessoas em pontos diferentes desta questão, e a única conclusão geral é que estamos prisioneiros de várias armadilhas.
A Polícia sente que briga em condições desiguais. Não tem armas, os salários são baixos... Enquanto isso, os traficantes compram armas potentes por telefone... A solução é simples: equipar a Polícia.
A tragédia do AfroReggae lembrou que nada é simples. Que polícia vamos armar? A que deixa agonizandte na calçada um cidadão, rouba o fruto do roubo e libera os assassinos?"
O artigo é bem maior, e traz outros pontos passíveis de serem objeto de reflexão, entretanto, essa parte é suficiente para minha proposta.
O ponto chave da minha discussão gira em torno da afirmação de que "nada é simples". Eu me limitei a citar dois dos aspectos abordados por Míriam - o das armas e o dos salários -, porque esses, que pareceriam saídas simples para o problema, já se transformam em um ponto polêmico se atentarmos para a pergunta feita a seguir pela jornalista: "Que polícia vamos armar?"... e, extrapolando, "Que polícia vamos aumentar?".
A questão das armas envolve não apenas a maior possibilidade de ação da instituição "Polícia" - o que é favorável ao cidadão -, mas também envolve a maior disponibilidade de poder de fogo para ser usada no abuso de poder pelo mau policial - ou seria melhor dizer, pelo "pseudopolicial"? Realmente, este é um dilema.
O segundo aspecto versa sobre "salário". Outro ponto delicado.
Num debate sobre Segurança Pública, ao qual assisti há pouco tempo, um ex-comandante falava sobre o absurdo que é um policial militar ingressar nos quadros percebendo remuneração de pouco mais de oitocentos reais, o que, em certa medida, justificaria os "bicos" como segurança de lojas, por exemplo, com um "salário extra" em torno de mil e quinhentos reais - quase o dobro da remuneração oficial.
Num primeiro momento, pensamos algo como "Ah... mas ele não está prejudicando ninguém... e ainda, de certa forma, está prestando um serviço à comunidade, visto que protege as redondezas do negócio!".
Logo depois, veio um estudioso no assunto e nos fez pensar um pouco mais criticamente. Ele propôs a seguinte pergunta: "Será que se um policial que faz serviço de segurança particular, ganhando seus R$ 1.500,00, se passar a ganhar de soldo R$ 2.000,00, cessará sua atividade 'oficiosa'?". Sua conclusão é de que muito provavelmente, não. O dito policial simplesmente chegará à conclusão de que pode gastar um pouco mais. Isso porque, são difíceis os casos em que policiais se contentam com o soldo. O nosso pesquisador afirmou que já existe uma certa "vocação" institucional para o "bico"... pelo menos no Rio de Janeiro e em algumas outras localidades. Dados foram apresentados sobre Estados em que os policiais percebem remunerações menores que aqui e que não se inclinam a participar de atividades "extras", ainda que "lícitas" - as aspas são por conta de que, em termos legais, o policial tem dedicação exclusiva ao seu trabalho na instituição, não podendo trabalhar externamente ao quadro da Polícia.
Há uma lógica, clara, ainda que moralmente incorreta, de que não basta ter um segurança particular ágil, inteligente, assertivo... melhor é ter alguém que pode desfrutar de uma estrutura oficial, ainda que utilizada de maneira "silenciosa", a favor do contratante particular.
Pior ainda é quando essa "estrutura oficial" não está apenas à disposição do comerciante, mas do infrator. Aí, então, a lógica do aumento de salário vai mais para o "ralo", ainda. Vejamos, o tal policial que tem soldo de oitocentos reais e se farta com cinco mil do seu "contratante infrator", mesmo que passe a ganhar três mil oficiais, não desejará afastar-se da sua maior fonte de renda... ainda mais quando sabe que haverá vários "colegas" dispostos a substituí-lo nesse "emprego".
Prova maior de que a remuneração, como fator único - embora importante-, não pode vincular a atuação do policial à estrita legalidade é a de um administrador do Estado Maior da Polícia Militar, que, mesmo tendo soldo de coronel, responde a processo por deixar de reprimir ilicitudes quando era capitão, comandante no Batalhão de Jacarepaguá.
Pior ainda, parece-me, é o caso do rapaz do AfroReggae, que foi "assaltado" duas vezes, pelos ladrões, que o atingiram mortalmente, levando-lhe os pertences, e por um capitão, que mesmo com remuneração bem maior do que a citada anteriormente, "assaltou" os assaltantes, privando-lhes do fruto do roubo anterior. Ou seja, um capitão - que já não ganha tão mal - furtando um casaco e um par de tênis.
Como disse Miriam Leitão: "Nada é simples".


domingo, 25 de outubro de 2009

Primeiras impressões do "Caim", de Saramago

Embora eu tenha lido apenas um terço do livro, já dá para ter uma ideia que ele é.
Duas coisas chamam logo atenção: a incrível criatividade do autor e - esta, tomando a liberdade de invadir uma área que não é minha, a do estilo de composição - uma certa flexibilização na radicalidade da pontuação, que sempre foi o estilo do Nobel português.
O tema escolhido - uma estória bíblica - realmente dá margem a muitas criações, afinal, o texto original lança um olhar intencionalmente perspectivado, o que deixa aberto um sem número de outras possibilidades de visada. E Saramago se aproveita de outras dessas perspectivas para inventar a "sua" estória de Caim. Mas, mesmo antes de abordar especificamente o mais famoso fratricida de todos os tempos, a inventividade do português já dá suas piruetas. O romance tem início, ainda no Jardim do Éden, quando Deus percebe que não dotou suas criaturas humanas, Adão e Eva, com uma "voz" - no texto, os outros animais já tinham lá suas "vozes". E Saramago escreve: "Teve de ficar irritado consigo mesmo, uma vez que não havia mais ninguém no jardim do éden a quem pudesse responsabilizar". Num movimento dos mais inteligentes, o autor indica que "Num acesso de ira, surpreendente em quem tudo poderia ter solucionado com outro rápido fiat, correu para o casal e... enfiou-lhes a língua pela garganta abaixo".
Detendo-nos rapidamente nessa passagem, é interessante avaliar como o escritor - assumidamente ateu, e talvez mais inteligentemente ateu do que Richard Dawkins, por exemplo - faz um exercício de lógica, atacando não Deus diretamente, mas o conceito estabelecido de Deus, através de uma espécie de "negação pelo absurdo". Ora, é certo que um ser onipotente nunca, como está registrado na Bíblia, se arrependeria da sua criação. Isso seria uma dupla imperfeição, tanto por ter criado algo mal planejado - apesar de sua oniciência -, quanto por um certo sentimento de insatisfação consigo mesmo - o que não pareceria pertencer à perfeição divina.
Saramago não explora essa passagem, como eu fiz, mas reflete, no romance, sobre a irritação de um ser perfeito quanto a um planejamento mal executado e sobre a estranheza deste ser não corrigir o problema apelando apenas a um novo "faça-se", como o que dera início ao próprio Universo.
Outra passagem interessante, ainda no início do livro, já depois de Adão e Eva terem comido do fruto proibido, lança um comentário irônico sobre esse evento, citando "a imprevidência do senhor, que se realmente não queria que lhe comessem do tal fruto, remédio fácil teria, bastaria não ter plantado a árvore, ou ir pô-la noutro sítio, ou rodeá-la por uma cerca de arame farpado".
E olha que ainda nem falei de Caim, ainda...
O outro aspecto que citei, a de uma certa diminuição na radicalidade estilística da pontuação, pode ser apenas uma impressão pessoal. Aliás, parece que com a evolução no próprio texto, a coisa se modifica um pouco. Seriam as escritas diárias no blog - que não conta com a mesma estrutura estilística -, que teriam diminuído a presença de uma pontuação "maluca" no texto saramaguiano? De qualquer forma, percebo frases mais curtas, com mais pontos. Continuam as separações não muito formais através de vírgulas apenas e a ausência total de pontos de interrogação. Mas... realmente senti uma certa modificação. Impressão? Talvez...
Depois eu conto mais.

sábado, 24 de outubro de 2009

Ah... essa não deu para resistir

Eis que eu estava passando por uma das minhas livrarias preferidas da cidade, quando me deparei com o título "História da Filosofia - de Tomás de Aquino a Kant". Seria apenas mais um livro de História da Filosofia, entre tantos que há no mercado - muitos deles  até de boa qualidade -, não fosse o autor... o diferenciado professor Martin Heidegger.
Pensei: "Ops... Heidegger?! Vamos entrar para ver". Pensei num sobrevoo do mestre alemão sobre diversas figuras do período histórico em questão... e, obviamente, imaginei poder haver um "espacinho" para nosso querido Spinoza.
Engano meu... Ainda bem!!!! O livro contemplava basicamente cinco filosofias: a de Tomás de Aquino (com 68 páginas), a de Descartes (com 42 páginas), a de Spinoza (com 34 páginas), a de Leibniz (com 24 páginas) e a escola de Wolff, que chegaria até o período pré-crítico de Kant (com 16 páginas).
Não havia como deixar de comprar um livro desses, não é?
Por enquanto, só dei uma rápida folheada - nem é preciso dizer que fui direto à parte de Spinoza -, e só vi uma apresentação histórica. Mas o livro promete...

sexta-feira, 23 de outubro de 2009

Agradecimento ao Existenz

Desde o primeiro "aparecimento" do amigo Existenz neste nosso blog, eu comemorei. Não era apenas a chegada de mais um amigo - o que, por si só, sempre me enche de alegria -, mas a retomada de um contato que começou no "mundo extra-nético", prolongou-se pela troca de e-mails e acabou "desembarcando" aqui no blog.
Em todos esses "locais", a participação do Existenz sempre agregou muito valor. Aliás, nossas primeiras conversas exigiram que eu aprofundasse meus estudos em Kant. A continuidade de nossas correspondências exige sempre um retrabalho de conceitos heideggerianos. Na última carta dele, inclusive, a fundamentação baseada nos textos de "Ser e Tempo" foi fantástica - e aproveito esse post para dizer que ainda terei que suar um pouco para responder-lhe. E, agora, suas contribuições no blog têm sido sempre muito interessantes, expondo um pensamento "encarnado", algo que não se afasta do "mundo" - que eu sei que é justamente o modo como ele gosta de filosofar.
Por certa falta de tempo, ainda tenho uma dívida com ele, que é a de uma percepção mais adequada do pensamento de Merleau-Ponty, a fim de tornar-me um bom interlocutor no que concerne a esse pensador. E, apesar de admirar muito o espanhol Jose Ortega y Gasset, tenho que dedicar-me mais a ele... mas já tenho me aparelhado para tal, também a fim de podermos avançar nas conversas sobre projetos fenomenológicos "alternativos".
Dito isto, passo ao agradecimento mais específico, que diz respeito ao final de um comentário seu, feito no último post sobre a imprensa. Ele escreveu: "Continue com seu grande trabalho com esse blog, pois em muito você enriquece a vida das pessoas que tem o privilégio de acompanhar seus escritos".
Vindo de uma pessoa que conheço mais de perto, com toda a sua capacidade "filosofante", eu chego a ficar envaidecido com o elogio - mesmo reconhecendo que a "vaidade" não é um dos melhores sentimentos. De qualquer modo, permitindo-me algo não "politicamente correto", agradeço pelo elogio; faço votos que continue gostando e, principalmente, participando do blog, com seus sempre valorosos comentários.
Mil "obrigados"!
Esse é mais um "bom encontro", como diria Spinoza, o que aumenta meu conatus, e representa "alegria"!

Comemoração dos spinozanos


Regozijai-vos, spinozanos... foi lançado mais um livro sobre o nosso querido luso-holandês!!! Já perdi até a conta de quantos foram este ano... seis, talvez... Lancemo-nos às estatísticas! Rssss.
E, desta vez, far-se-á a felicidade dos nietzscheanos, também. Para o nosso amigo Guilherme, que é apreciador dos dois filósofos, nem se fala!
O livro é "O mais potente dos afetos: Spinoza e Nietzsche", organizado por André Martins e publicado pela Martins Fontes.
A estrutura do livro é a seguinte: uma apresentação do próprio André Martins, professor aqui da UFRJ; a famosa carta de Nietzsche a Franz Overbeck, onde o primeiro se revela totalmente "maravilhado" com a descoberta da filosofia spinozana; uma introdução feita pela nossa caríssima Scarlett Marton; seis textos temáticos, onde aparecem os escritos dos diversos autores, sempre sob a dupla óptica - de Spinoza e de Nietzsche - e um anexo, que contém o testemunho fúnebre de Peter Gast para Nietzsche.
Os títulos dos seis textos, que compõem o corpo principal do livro, são:
1) "O conhecimento como o mais potente dos afetos" - trabalhado por Pascal Sévérac, do lado spinozano, e por Olivier Ponton, do lado nietzscheano;
2) "A negação do livre-arbítrio" - trabalhado por Marilena Chauí, do lado spinozano, e por Oswaldo Giacóia Jr., do lado nietzschano;
3) "A negação da teleologia e das causas finais" - trabalhado por Christophe Miqueu, do lado spinozano, e por Céline Denat, do lado nietzscheano;
4) "A negação da ordem moral do mundo" - trabalhado por Homero Santiago, do lado spinozano, e por Blaise Benoit, do nietzscheano;
5) "A negação do desinteresse" - trabalhado por Marcos Ferreira de Paula, do lado spinozano, e por Patrick Wotling, do nietzscheano; e
6) "A negação do mal" - trabalhado pela fantástica Chantal Jaquet, do lado spinozano, e pelo ótimo André Martins, do nietzscheano.
Tudo isso em pouco mais de trezentas páginas... será o suficiente? Só lendo para saber. O fato é que, pelo menos observando os títulos, o trabalho toca temas interessantes e bastante produtores de significado nos dois pensadores em questão.
Ai, ai, ai... O "Caim", do Saramago, ainda nem foi aberto e já há esse concorrente de peso a enfrentá-lo!!!

quinta-feira, 22 de outubro de 2009

Mais amigos... Que bom!

Escrevo, hoje, para registrar a entrada de mais dois amigos em nosso "clube" dos amigos de Spinoza. É... os amigos dos amigos estão aumentando.
Primeiramente, como sempre, desejo as boas vindas ao professor Thiago Minnemann e à Flávia Shimanski. Dito isto, coloco-os à vontade para participarem do blog com comentários... o que, aliás, atende ao maior propósito deste espaço: permitir a troca de percepções sobre um mesmo tema.
Agradeço aos dois pela primeira entrada e espero que gostem e participem ativamente da confecção do blog.
Especificamente ao professor Thiago, coloco os posts do blog totalmente à disposição para serem usados em seu espaço - que, como já citei, lá mesmo, gostei muito -, quando você achá-los interessantes.

Spinoza, por Onfray... bem breve

Ainda estou lendo o "Contra-história da Filosofia", de Michel Onfray. Li a introdução e "voei" para a parte referente a Spinoza. O livro é bastante interessante e Onfray conseguiu delimitar e definir bem precisamente seu universo de estudo, "os libertinos".
A parte sobre Spinoza, ainda que não traga novidades espantosas sobre o luso-holandês, é bem desenvolvida e acrescenta conteúdo, por dar relevo ao pensamento spinozano sobre este pano de fundo "libertino".
Mesmo antes de fazer um comentário mais extenso sobre o texto, gostaria de registrar um parágrafo - apenas um, por enquanto - para aguçar o espírito e suscitar questionamentos nos amigos do blog.
"Estranho Espinosa! Seu materialismo sem matéria; seu Deus sem transcendência; seu hedonismo sem corpo; seu epicurismo sem átomos; sua ética sem moral; sua religião sem dogmas; sua eternidade sem além-mundos; sua liberdade sem livre-arbítrio; seu desejo sem carne; suas virtudes sem dever: eis um estranho pensamento oximórico! Logo, barroco".
Boa inspiração, pessoal!

quarta-feira, 21 de outubro de 2009

Hannah Arendt (1)

Normalmente, não começo posts lançando-lhes o número um no título. O que acontece é que, após o primeiro, quando o assunto ainda demanda algum pensar - e isso normalmente acontece -, esses outros da sequência é que ganham uma numeração.
Neste, entretanto, eu já percebo que o desejo de expressão precisa de uma sequência, ainda que ela não ocorra de modo imediato.
Meu compadre Mundy, em um comentário de um post passado, questionou-me se eu tomara conhecimento do lançamento do livro "Alienações do mundo", de Rodrigo Ribeiro Alves, doutor em Filosofia pela PUC-RJ. Além desse questionamento, havia outro, que dizia respeito ao que penso de Hannah Arendt.
Começo dizendo que tomei conhecimento do lançamento do supracitado livro, bem como - respondendo ao questionamento de outro amigo nosso, o Júlio - de que comprei o romance "Hannah e Martin". Comecei a lê-lo, inclusive. Achei que, do ponto de vista histórico, ele ilumina as curtas biografias que lemos nos livros de Filosofia, acrescentando um pouco de afetividade em algumas informações que obtemos de modo muito "seco". Entretanto, do ponto de vista filosófico, por enquanto, achei o livro "estéril", incapaz de nos levar a gerar algum conceito próprio com as sementes arendtianas.
Dito isto, e antes de começar a dizer efetivamente o que penso da filósofa - título que ela mesmo recusava - Hannah Arendt, quero registrar que tive uma aula espetacular sobre esta alemã e judia, na Casa do Saber. O professor foi Eduardo Jardim, que conta, inclusive, com um livro publicado sobre ela. Talvez, entretanto, o que tenha marcado mais foi uma entrevista, do ano de 1964, com Hannah Arendt, a um programa da televisão alemã. A tal entrevista tem aproximadamente trinta minutos de duração e é legendada, de modo meio "rápido demais", em espanhol. Para quem quiser, ela está disponível no You Tube, em três partes:
Esse seria o primeiro registro que gostaria de fazer: o convite para que os amigos assistam ao vídeo e observem a força da presença dessa pensadora política.

terça-feira, 20 de outubro de 2009

Ainda, a Imprensa

Ainda devo uma resposta mais elaborada ao nosso amigo Existenz a respeito da manipulação das notícias, pela Imprensa, com a intenção de conduzir a opinião do senso comum sob uma perspectiva ideológica. Nesse post não pretendo fazer isso ainda.
O que pretendo é ampliar um pouco mais a discussão, ao constatar como uma notícia - ainda sob as sombras da dúvida - pode se tornar uma "verdade" e como esta "verdade" pode afetar emocionalmente nosso juízo, "embaçando" nossa capacidade crítica.
Cito, então, o caso da brasileira que teria sido atacada por um grupo neonazista em Zurique, em fevereiro deste ano. Ataque este que teria causado o aborto dos gêmeos que ela estaria esperando. Para quem ainda não se lembrou do caso, recordo que os agressores teriam marcado o corpo da brasileira com a sigla do partido que apoia ideias de xenofobia na Suíça.
Imediatamente, no mundo todo, as pessoas minimamente sensíveis se chocaram com aquele tipo de violência, ainda mais perpetrada contra uma jovem grávida... mais ainda pela futilidade da motivação. O caso foi manchete por alguns dias. Chocados, como estávamos, passamos à revolta quando a Polícia suíça sugeriu que tudo poderia ser uma farsa, planejada pela própria brasileira. Imaginamos logo um segundo caso Jean Charles - neste, a Polícia britânica executou um inocente e tentou eximir-se da responsabilidade, usando de argumentos totalmente inverídicos.
Mais informações vieram à tona... e passamos a perceber que a brasileira também não tinha uma saúde mental das melhores, ainda que não fosse completamente insana, o que dificultaria um julgamento simplório do caso, conforme fizéramos num primeiro momento. Até a própria gravidez, confirmada pela imagem de uma ultrassonografia enviada, por e-mail, a amigos, teria sido forjada, sendo obtida em um site dos mais pesquisados na rede, conforme se constatou posteriormente.
Pois bem... o fato é que o Ministério Público suíço denunciou a brasileira pela farsa. Faltam-me mais subsídios para afirmar qualquer coisa, mas constato que se não é tão fácil estabelecer um veredicto sobre algo que necessariamente é verdade ou não, imaginem algo que depende de interpretações que envolvem mais "sutilezas"... e, talvez até, um descortinar de certa má-fé ou, quando mais não seja, de uma motivação ideológica diante das notícias.
Ainda assim, mesmo neste caso, que é daqueles em que necessariamente há uma verdade ou uma mentira por parte da brasileira, não podemos negar que haveria um interesse do governo suíço em não deixar transparecer uma ideia de insegurança e de barbárie dentro de suas fronteiras.
Sei que devo uma maior reflexão sobre o tema "Imprensa", mas acho que uma possível solução de partir, preconceituosamente, com uma opinião predeterminada sobre a fonte da notícia, antes de ir à própria notícia, se é boa em termos práticos, certamente não é a ideal em termos teóricos.

segunda-feira, 19 de outubro de 2009

O último livro de Saramago

O caderno Prosa & Verso, do jornal O Globo, deste sábado trazia os comentários sobre o novo livro de Saramago, “Caim”- aquele do mais famoso fratricídio da humanidade. Juan Arias escreve o artigo. Ele que é, inclusive, autor de um livro sobre o Nobel português – “José Saramago – o amor possível” -, além de “A Bíblia e seus segredos” e “Jesus, esse grande desconhecido”.

Comenta Arias que “mais do que a história romanceada de Caim, o escritor aborda em seu livro o absurdo de um deus – sempre registrado com minúscula, por Saramago – que na Bíblia aparece mais cruel e caprichoso que o pior dos homens.”
Ainda segundo Arias, “em todo o texto, no qual Caim é protagonista e narrador das atrocidades do deus bíblico, o irmão de Abel não nega seu crime e aceita sua vida errante como uma espécie de castigo. Não aceita, contudo, ser mais criminoso e cruel que deus. Se ele matou seu irmão – segundo Saramago, na realidade, ele queria matar deus – esse deus cometeu muito mais crimes que ele... A dialética de Caim com deus é impecável: se eu pequei, tu pecaste mais. Se eu matei meu irmão, tu mataste, ou mandaste matar a muitos mais”.
O último parágrafo da análise de Arias é bastante interessante. Escreve ele: “Para Saramago, deus não é mais que um pretexto para que as religiões possam melhor escravizar a consciência humana. Com ‘Caim’, ele trata de deitar, literariamente, sobre o tapete do mundo, esta crua realidade. Ao mesmo tempo, e apesar do seu ateísmo, devemos a ele uma das definições mais poéticas da divindade: ‘Deus é o silêncio do universo, e o homem o grito que dá sentido a esse silêncio’, afirmou ele em certa ocasião. Afinal, deus não é para ele tão indiferente como possa parecer. ‘Caim’, definitivamente, é também um grito contra todos os deuses falsos e ditadores criados para amordaçar o homem, impedindo-o de viver, em total liberdade, sua vida e seu destino”.
Ao lado do artigo sobre o livro, há uma pequena entrevista com o próprio Saramago. Gostaria de citar três das questões feitas, bem como as fortes respostas.
JORNAL: “O Caim que o senhor constrói é a voz da razão, da clareza de raciocínio, mostrando um Deus tão tirano e incompreensível que torna qualquer crença patética. Qual sua intenção ao escrever o livro?”
SARAMAGO: “No fundo, o problema não é um Deus que não existe, mas a religião que o proclama. Denuncio as religiões, todas as religiões, por nocivas à Humanidade. São palavras duras, mas tenho que dizê-las”
JORNAL: “Outros ateus convictos, como Richard Dawkins e Christopher Hitchens vêm dedicando seu tempo a uma cruzada antirreligiosa. Como vê esse movimento?”
SARAMAGO: “Por mim, não o faria. É praticamente impossível convencer alguém a virar as costas às suas crenças. Limito-me a escrever o que penso do assunto e deixo aos leitores a inteira liberdade de fazer o que entendam. O único que peço para mim é respeito”
JORNAL: “O senhor acredita que ainda é possível a existência de um mundo sem religião? O pessimismo de Caim em relação à Humanidade é também o seu?”
SARAMAGO: “Penso que não merecemos a vida, penso que as religiões foram e continuam a ser instrumentos de domínio e morte. Em suma, Caim teve razão para tentar impedir que outra humanidade substituísse a que teria morrido no dilúvio. Afinal, se a primeira era má, esta é péssima...”
Fazendo uma breve análise, eu acharia pontos de concordância e de discordância com o português.
Como Saramago, também acho que o maior problema não é a existência, ou não, de Deus. Os maiores problemas vêm da necessidade vital das autoridades religiosas de manterem Deus vivo – ainda que ele não exista. E essa necessidade não é meramente moral, como pensava Dostoiévski, mas envolve, também, o desejo de poder, como melhor o percebera Lutero – que, infelizmente, criou algo que depois sucumbiu a esse próprio desejo.
Ainda em relação à primeira resposta, não concordo com Saramago sobre as religiões serem nocivas à Humanidade. Penso que, da mesma forma que as fábulas com conteúdos morais, as religiões servem a um bom propósito, na idade mais tenra do homem, incutindo-lhe valores morais, que nesse início precisam de um referencial transcendente. À medida que o homem se torna adulto, ele pode perceber que a vida em sociedade precisa de referenciais que, apesar de não serem mais absolutos, servem às circunstâncias factuais.
Novamente, penso que Saramago acerta ao dizer que “é praticamente impossível convencer alguém a virar as costas às suas crenças”. Eu diria que é praticamente impossível convencer um crente, usando de argumentos racionais. Respeito, também, a opinião pessoal de Saramago, ao dizer que não faria uma “cruzada antirreligiosa”. Entretanto, não posso deixar de constatar o fato de que muitos que têm dúvidas acerca das religiões – estejam sobre que rótulos estiver: ateus, agnósticos, céticos, etc. – precisam perceber que há mais gente assim. Quando digo que não acredito em Deus (grafado com maiúscula não por respeito à sua figura, mas como clara referência ao constructo religioso dessa entidade), fico até constrangido em certos meios, onde as pessoas me olham com um misto de decepção, espanto, abominação, sei-lá-o-quê-mais.
Sobre a frase mais explosiva de Saramago – “Penso que não merecemos a vida” -, discordo totalmente. Não acho que, de antemão, possamos afirmar isso. Imagino que devemos, justamente, fazer por merecê-la. E também não acho que o fenômeno religioso, necessariamente tenha a ver com isso. Há religiosos que justificam e merecem suas vidas em função da religião, como há os que não... da mesma forma que há não religiosos que o fazem, e isso também não ocorre em função de sua “arreligiosidade”.

quinta-feira, 15 de outubro de 2009

Michel Onfray

Esse filósofo francês vem tendo publicado no Brasil, já há algum tempo, uma série de livros seus chamada "Contra-história da Filosofia". Este ano de 2009 contou com lançamento do terceiro volume, "Os libertinos barrocos - século XVII".
Onfray é um filósofo "diferente"... e nada mais adequado ao seu jeito do que o título "Contra-história...", ao invés de "História da Filosofia". Para mostrar o quão diferente é o estilo do autor, basta dar uma olhada no índice do livro. Lá vemos, "Charron e 'a volúpia prudente'"; "La Mothe Le Vayer e 'o gozo de si mesmo'"; "Saint-Évremond e o 'amor à volúpia'"; "Pierre Gassendi e 'Epicuro que fala'"; "Cyrano de Bergerac e 'o livremente viver'" e "Espinosa e 'o que leva à alegria'". Desses, como filósofos, conheço Gassendi e Espinosa e, muito mal, Charron... mais pela sua amizade com Montagne.
Como gosto de conhecer a opinião de todos os bons pensadores sobre Spinoza - mesmo aqueles que não são especialistas no luso-holandês -, comprei este último volume da série.
Para dizer a verdade, ainda não li nada do livro. Mas prometo fazê-lo em breve. Nem é preciso dizer que começarei os comentários por Spinoza.
Aguardem...

Feliz Dia dos Professores!

Alguns dos amigos que visitam o blog pertencem a essa maravilhosa categoria dos professores... E que categoria, hein! Rsss.
Sempre destaco o valor dessa classe, que carrega sobre os ombros a responsabilidade de tornar o material humano desse país um pouco mais crítico. Mas, ao lado desse peso, carrega também o orgulho de ser agente ativo de uma possível mudança positiva nos rumos do pensamento desse nosso Brasilzão. Aliás... não posso me limitar às nossas fronteiras, visto que há uma amiga nossa, também professora, que mora além mar... lá em Portugal.
Incluídos todos os professores... Parabéns pelo Dia dos Professores!!!!!!

quarta-feira, 14 de outubro de 2009

O papel da Imprensa

No post "Olimpíada de 2016", sem querer, "esbarrei" num tema que me parece merecer um post: a Imprensa.
De certa forma, fiz um juízo de valores quando destaquei a publicação do jornal "O Globo" no dia seguinte à vitória como sede olímpica de 2016.
Nosso amigo Existenz sinalizou, muito acertadamente, que devemos ter um certo cuidado com as análises da Imprensa sobre os diversos acontecimentos. Ele disse: "não faria mal ter certa 'malícia' na hora de se defrontar com as 'notícias' (que, para mim, nada mais são do que descrições e 'informações' sobre ocorridos entranhadas de juízos, valores, intenções e afetos, como boa parte das conversas cotidianas que cada um tem na nossa vida social) anunciadas por essas fontes".
Lembrando Nietzsche, sobre o fato de que "não há fatos, somente interpretações", acho difícil que alguma coisa veiculada na Imprensa seja totalmente "isenta", no que diz respeito às ideologias de quem as escreve. Entretanto, acho que foi justamente esse o ponto alto de "O Globo", ou seja, enquanto todos eram simplesmente tomados pela euforia da vitória - que, lembro, também está carregada de "ideologia" -, este jornal, sem deixar de noticiar - e até participar da comemoração pelo sucesso do acontecido -, alertou-nos para o "outro lado" da estória. Acho que essa é uma postura crítica que combina muito com o que tentamos fazer neste espaço - filosofar.
Agora, fica a pergunta: qual é o papel exato da Imprensa? Ela deve ser uma mera "informadora" dos acontecimentos ou deve ser "formadora de opiniões"?
E surgem perguntas mais profundas: se o papel deve ser de mero "informador", há possibilidade de fazê-lo com plena isenção, sem nenhum aparato ideológico de fundo? E se o papel é de "formador de opinião", seria a opinião veiculada mais adequada que a do leitor?
Parece-me que existe, na verdade, um misto de "informador" e "formador" (de opiniões). Se Nietzsche estiver certo, cabe a nós, leitores, a decisão sobre a "interpretação" com a qual compartilhamos. E essa "interpretação" que recebe um reforço valorativo nosso só pode "nascer" a partir da análise das várias opiniões veiculadas... até porque nós também temos as nossas "ideologias" pessoais - ou, pelo menos, que nós pensamos ser "pessoais"/"individuais".
De qualquer forma, continua valendo a reflexão, proposta pelo nosso amigo Existenz, sobre o "peso valorativo" das opiniões veiculadas em todos os meios de comunicação.

terça-feira, 13 de outubro de 2009

Spinoza e Kolakowski

Há algum tempo eu prometo a visão de Kolakowski sobre alguns dos filósofos que aparecem na pequena coleção de livrinhos lançada recentemente. Hoje, gostaria de falar um pouco do filósofo que "comanda" esse blog... nosso querido Spinoza.
Kolakowski se põe em marcha para avaliar o pensamento de um filósofo de poucos escritos e que concentra sua grande filosofia em um único texto, a "Ética". Pareceria, então, tarefa fácil. Mas não é. Spinoza, apesar de filósofo de sistema, onde tudo tem que se encaixar perfeitamente, e de um "moderno", onde a Epistemologia e o Método seriam as ideias chave, não se deixa apreender facilmente.
O "rígido" modelo matemático adotado por Spinoza, diz-nos logo Kolakowski, deixará transparecer que algumas certezas são artificialmente derivadas dos axiomas com os quais o luso-holandês trabalha inicialmente.
Pessoalmente, acho o modelo spinozano muito bem estruturado, mas a verdade é que a "intuição" da certeza que advém do conjunto de algumas proposições não é tão "imediata" como aquelas provenientes da própria Geometria, de onde o método pretende partir.
Kolakowski, novamente com perspicácia, indica que a pretensão maior do sistema spinozano é a questão ética, mas o que "fica" de Spinoza para a História da Filosofia é sua posição acerca de Deus.
O polonês percebe que Spinoza parte de uma posição parecida com a de Santo Anselmo e Descartes, postulando a existência de Deus pela necessidade de sua própria essência e conceito... mas demonstra que, pelo menos a partir de um certo ponto, o "Deus spinozano" se afasta completamente do "Deus judaico-cristão".
Kolakowski indica que, nas suas próprias cartas, Spinoza reconhece que não resolveu "satisfatoriamente a questão da relação entre Deus e as coisas criadas".
Nas pouquíssimas dez páginas dedicadas ao pensamento de Spinoza, o polonês ainda tem "coragem" para discutir o chamado "panpsiquismo" de Spinoza. O tema é espinhoso - sem qualquer trocadilho com a família "Espiñoza", que parece ter dado origem ao sobrenome de nosso pensador! -, mas Kolakowski o enfrenta em "míseras" sete linhas. Obviamente, fica muito por dizer. Mas é importante registrar a tentativa do polonês de refletir sobre o difícil tema.
Ele escreve: "Cada coisa particular é tanto corpo como ideia. Ser ideia não significa, no entanto, que ela possua vida psíquica própria, mas que é ideia, no sentido de que foi pensada por Deus... Ideia e corpo são, na realidade, uma coisa só. O que ocorre em um também ocorre em outro".
Certamente, o tema mereceria mais espaço. Mas o importante é registrar que ser "extensão e pensamento", ao mesmo tempo, para todas as coisas, não pode ter o mesmo sentido de ser "corpo e alma" como para o ser humano. O "pensamento", aqui, não é simples coleção de "conteúdos mentais", mas uma instância real paralela à física - que diz respeito à extensão.
Como eu disse, o tema não é simples. Aliás, Spinoza é atacado pelo seu "panpsiquismo".
Alguns defensores do luso-holandês sugerem que o que Spinoza quer dizer é que há um nível de realidade que não é meramente material - algo como "forças" ou "energias" -, que estariam presentes em toda a Natureza. Seria uma boa forma de "fugir" aos detratores de Spinoza, mas ainda não acho uma boa saída. Afinal, todas as forças que conhecemos são "físicas" - inclusive é na ciência positiva "Física" que elas são estudadas. Aliás, o que é material deve sua "materialidade/extensividade" ao que é "não material". Isso não é novidade... Fritjof Capra já falava disso no seu "Ponto de Mutação", explicando que há muito mais "vazio" num pedaço de qualquer coisa do que "matéria", em sentido estrito.
Depois eu continuo...

segunda-feira, 12 de outubro de 2009

Olimpíada de 2016

É difícil deixar de torcer pelo Brasil em alguma coisa... até em "cuspe a distância". Entretanto, em alguns casos, uma reflexão menos "apaixonada" nos leva a não querer que o Brasil vença. Um desses casos é o das Olimpíadas de 2016.

No dia seguinte à escolha do Rio como sede olímpica em 2016, os jornais, de um modo geral, estampavam nosso orgulho e festa por bater Estados Unidos, Espanha e Japão. Compreensível. O Globo, ainda que compartilhando da euforia, foi o único a colocar, ao lado da alegria pela escolha, algumas considerações sobre a viabilidade real de atendimento do que foi proposto. Uma dessas considerações, por exemplo, foi a da inauguração de uma estação de metrô por ano; outra, a da despoluição da Baía de Guanabara. Nós cariocas ouvimos que haveria mais duas estações de metrô na época do Pan... e não vimos isso sair do papel. O que ganhamos como legado desses jogos das Américas foi uma faixa alaranjada em algumas vias, que seriam vias seletivas para as diversas delegações de atletas seguirem rumo aos locais de competição. Nossa querida e linda Baía de Guanabara já vem sendo "despoluída" há anos... e vivemos lendo notícias de poluição nas praias, de degradação da flora e fauna aquática.
No caso do Pan, nem vou citar os "elefantes brancos" que ficaram abandonados ou, na melhor das hipóteses, subutilizados aqui no Rio. Não falarei, então, do Parque Aquático Maria Lenk e do Engenhão. Entretanto, vou citar um outro "legado", que compensaria muito: a Vila Olímpica. Construída para abrigar os atletas, seria depois vendida aos cidadãos. Por problemas de construção e de administração, os prédios se tornaram o desgosto dos compradores, com vários deles entrando na Justiça para reaverem os valores investidos.
Será que o Brasil aprendeu a lição do que não fazer num evento desse tamanho, a fim de fazer o certo? Será que um país que prima pelo "jeitinho" assumirá realmente que, para tudo dar certo, tem que se lançar ao trabalho sério muitos anos antes de 2016? Será que um país que não consegue, sequer, tomar conta de provas do Enem realmente tem competência para um desafio de tal monta?
Quem viver verá! Continuemos torcendo até lá.

domingo, 11 de outubro de 2009

Ralph Waldo Emerson

Nosso amigo Guilherme sempre posta matérias interessantes no seu blog. Não é à toa que o mantenho no topo da lista dos meus "links favoritos".
Desta vez, entrentanto, além do próprio post, há uma citação de que gostei muito - e que não conhecia - de Ralph Waldo Emerson. Diz ele: "É fácil viver no mundo conforme a opinião das pessoas. É fácil, na solidão, viver do jeito que se quer. Mas o grande homem é aquele que, no meio da multidão, mantém com perfeita doçura a independência da solidão”. 
Sobre a citação, comentei, no blog do amigo: "Eu não conhecia essa citação do Ralph Waldo Emerson que está no blog... e gostei muito.
'Viver no mundo conforme a opinião dos outros' é realmente fácil. Não 'dá trabalho', não 'gera atrito'. Com isso, também não se cresce, não se pensa e não se vive originariamente.
'Na solidão, viver do jeito que se quer', também é 'mole'. Eu vivenciei isso na minha 'fase' budista, quando inúmeros mestres só eram budistas de verdade quando em retiro.
'Mas o grande homem é aquele que, no meio da multidão, mantém, com perfeita doçura, a independência da solidão'. Esse é um retrato do nosso caro Spinoza!!! Rsss".
Acho que temos a obrigação de propagar o que aparece de bom na net - afinal, há tanta porcaria!
E essas boas ideias com as quais nos deparamos - como é o caso do Guilherme, e da nossa nova amiga Marise - têm que ser divulgadas.

Mais uma amiga dos amigos

"Passeando" pela net, acabei encontrando mais um blog interessante. E fiz questão de registrar minha simpatia para com a "dona" do blog. Para minha surpresa, pouco depois de meu comentário, descobri que tínhamos uma nova "amiga dos amigos".
Feliz por recebê-la, Marise, desejo que tome esse espaço como seu; lançando os comentários que considerar pertinentes aos assuntos postados e "desafiando" os amigos com assuntos que julgar de interesse do grupo ou que imaginar interessantes de compartilhar.
Seja bem vinda!

sexta-feira, 9 de outubro de 2009

Nietzsche e o "eu"

Nietzsche, embora não tendo sido o primeiro, também atacou a "intuição imediata" da ideia de um "eu". Talvez até, Hume o tenha feito com mais precisão argumentativa. Entretanto, Nietzsche filosofa mais com o martelo do que com a caneta. E é com seu martelo que ele, em "Além do Bem e do Mal", lá pelo parágrafo 16 e seguintes, ataca esse conceito, referindo-se inicialmente a Descartes - e ao seu "ego cogito, ergo sum". Um pouco depois, aquele que "filosofa a marteladas" se volta contra a Vontade schopenhaueriana e conclui que "... L'effect c'est moi" - o texto em francês está no original alemão.
E aqui cabe uma pergunta: se eu sou o efeito dessa construção de inúmeras forças, que, portanto, precedem meu "eu", como fazer uma filosofia da existência, sem primeiro entender o que são essas "forças" em relação às quais eu não sou livre para ser "eu", já que são justamente elas que me fazem "eu"?
Mudando um pouco a perspectiva dessa ideia... e até o filósofo que a teve, eu lembro que Schopenhauer já dizia que temos todas as escolhas, menos a de nos escolhermos a nós próprios - o que deixaria os olhos de Sartre mais esbugalhados e tortos ainda.
Mas realmente, se "o efeito sou eu", como disse Nietzsche, é certo que só posso escolher a partir desse efeito ter se "consolidado", ou seja, "eu" não posso me escolher como aquele efeito que sou em função de forças primárias, e fundantes de mim. Só posso escolher a partir delas cessarem seu jogo - ainda que temporariamente -, encontrando essa "resultante" que sou "eu" mesmo.
A partir dessa assumpção de mim mesmo como resultante e efeito não escolhidos, posso me julgar livre para selecionar alternativas que se apresentam a mim... isso é o livre arbítrio.
Mas... será que esse jogo cambiante de vontades e forças, do qual sou efeito, se fixam totalmente, param de devir? Se a resposta for "Não" - como eu penso que é -, em que nível eu posso realmente dizer que esse que escolhe, que sou "eu", não está novamente sendo o efeito e sua ação não é só um efeito do efeito... nada tendo de liberdade em si?

quinta-feira, 8 de outubro de 2009

Minha mãe e o conatus spinozano

Como bom spinozano, recuso-me a identificar no ser humano a existência de uma "pulsão de morte" - conforme Freud a conceituou. Só consigo enxergar a "pulsão de vida"... que eu costumo aproximar do conatus spinozano.
Aliás, interessante demais é perceber que, em Freud, a "trieb" ("pulsão") não tem uma instância meramente corporal... algo que seria mais próximo a um instinto. A pulsão tem uma dimensão física e psíquica... como me parece ocorrer também com o conatus.
Além dessa diferença com Freud, o conatus spinozano guarda oposição também com a ideia de Heidegger de que a morte é um elemento estruturante do homem. Ou seja, para o alemão, a morte estaria já dentro do homem, que é um "Sein zum Tod", segundo ele. Já para Spinoza, o homem é um "Sein zu Leben" - invencionice minha, só para provocar os que gostam do idioma alemão para filosofar! -, o homem tem como fundamento ontológico o "existir"... o resto vem depois, como a ação empreendida para existir; a tentativa de entender o que o cerca, permitindo-lhe escolher melhor como existir; etc. e tal.
O texto, penso, não caminha mal... mas o que isso tem a ver com a minha mãe? Eu respondo - e o faço em um dos posts mais pessoais que já coloquei neste blog: "Algo" externo parece querer tirar minha mãe da existência! O "esforço" interno parece não estar mais sendo suficiente para deixá-la totalmente ancorada nesse mundo... de vivências... e de convivências!
Seus olhos verdes já não tem mais aquele brilho de quem olha os problemas como possibilidades de vitória... não pelo problema ser pequeno, mas por haver confiança em sua própria "potência" interior, mas sem arrogância... sempre com "paixão" - não no sentido spinozano do termo, mas naquele que se refere a uma "explosão sentimental" vigorosa.
Seu caminhar, que nunca foi atlético, mas que sempre foi decidido, transforma-se num penoso e vagaroso deslocamento arrastado.
Sua argumentação forte e, quase sempre vitoriosa - que, quando não pela força da retórica, acontecia pela energia da personalidade - torna-se vacilante... e, principalmente, imprecisa.
Vacilante e imprecisa... termos difíceis de serem agregados à minha mãe... mas que, agora, cabem...
Uma doença a ataca, silenciosa e matreira, desligando minha mãe do mundo.
Mas esse processo de "redução" do conatus, da potência diminuindo, inicia-se quando da ida do meu pai. Sem querer, meu pai, o grande amor dela, levou consigo uma parte da própria vida da minha mãe. Ele, que sempre foi um músico que fez a "base harmônica" na vida do casal, acabou levando embora parte do virtuosismo da solista, que ela sempre foi.
A morte vem de fora, diria Spinoza, quando as forças opostas a nós superam nossa potência de existir. E eu percebo que, se o amor de filho traz algum conforto, talvez só "O Amor" traga o próprio "élan vital" necessário à manutenção de uma existência em um corpo-alma desgastado pela própria existência, ou seja, só aquele "Amor" seria capaz de resgatar-lhe o que a natureza insiste em retirar dela... o "esforço de perseverar na existência"...

quarta-feira, 7 de outubro de 2009

Opinião de Schopenhauer sobre Spinoza

Há um livro publicado pela Editora Martins Fontes, em 2007, cujo conteúdo corresponde a duas partes dos "Parerga e Paralipomena" de Schopenhauer, que tem como título "Fragmentos sobre a história da Filosofia".
Schopenhauer não escreveu, nos "Fragmentos...", um simples manual de História da Filosofia. Sua ideia básica foi a de registrar as doutrinas de pensadores/escolas filosóficas que imaginassem o mundo, de alguma forma, segundo a perspectiva da divisão entre "realidade" e "representação" - sejam quais forem os nomes que se deem a esses conceitos.
Não é preciso dizer o quão perspicaz Schopenhauer é em suas análises. Entretanto, algumas ideias suas mereceriam, penso, algumas críticas.
No parágrafo 12, Schopenhauer escreve sobre "A filosofia dos modernos". No texto, aparecerão as ideias de Descartes, Malebranche, Spinoza, Leibniz... e, muito menos, de Locke e Berkeley.
Em sua análise, Schopenhauer questiona o conceito de "substância", do qual partem igualmente Descartes e Spinoza. Indica, o alemão, que Spinoza é um "materialista inconsciente", pois este não percebe que sua conceitualização de "substância" deixa de enxergar que todas as qualidades substanciais são, na verdade, qualidades meramente da matéria. Isso não me parece correto. Afinal, fica claro que Spinoza reconhece claramente as duas instâncias - material e imaterial - se remetendo a uma única "realidade" última, que envolve ambas.
Há um óbvio engano de entendimento de Schopenauer quando este escreve que Spinoza "expõe os dois modos de sua única substância como extensão e representação... divisão errônea, uma vez que a extensão existe apenas para a representação... portanto, não se opõe, mas se subordina a ela". Spinoza chama Extensão e Pensamento os atributos da realidade única, a Substância, e não apenas as modificações/modos desta - que aparecerão em outro momento do sistema spinozano. Uma possível confusão advém do fato de Spinoza chamar a mente de ideia do corpo, imaginando-se que essa "mente" seja uma mera "representação" do corpo. Mas isso não é verdade. Afinal, há que se pensar, pelo menos de modo reducionista, em um paralelo entre corpo e mente... e, mais corretamente, em que ambos os aspectos permitem um entendimento completo daquilo que está sob investigação. Ou seja, ambos são, em si, perspectivas de uma única realidade, não cabendo falar de uma representação de um através do outro.
Por último, uma "triste" incorreção de alguém tão ilustrado quanto Schopenhauer: a ideia de que Leibniz seria o pai de uma espécie de "monismo"... desprezando totalmente a inspiração spinozana que este tomou do luso-holandês. Disse Schopenhauer: "O esforço de Leibniz para estabelecer, como base, um único princípio para o espírito e a matéria merece reconhecimento".
Haveria um certo "patriotismo" nessa opinião... ou apenas uma má interpretação do pensamento spinozano?


terça-feira, 6 de outubro de 2009

Kierkegaard e Pessoa

O professor Karl Erik, que ministrou a aula sobre Sören Kierkegaard na Casa do Saber, sugeriu que o dinamarquês pudesse ser considerado um precursor de Fernando Pessoa, pelo fato de escrever vários livros, com estilos absolutamente diferentes, contendo opiniões até conflitantes, sob diversas autorias. Este fato, segundo ele, indicaria que Kierkegaard teria diversos "heterônimos". Apesar de não concordar com a opinião do mestre, preferi não polemizar. Entretanto, nesse espaço, a opinião é livre.
Será, realmente, que o fato de escrever usando outros nomes, ainda que com estilos e até opiniões diferentes, é suficiente para se estabelecer que são "personalidades" múltiplas que estão em ação? Parece-me que isso não é condição suficiente, embora seja necessária, para que se fale em "heterônimos".
Pessoa é muito mais "rico". A "duração" de seus "heterônimos", e a convivência entre eles, penso, é que indica que são "entes" reais, pelo menos, psicologicamente. Além disso, Pessoa criou uma história de vida para cada um deles.
Kierkegaard, ao que parece, criava um "personagem" de durabilidade restrita àquele momento em que escrevia. Esse personagem tinha a função de expressar o momento existencial do pensador dinamarquês, não tendo a "duração" existencial dos heterônimos pessoanos.
Que acharia a nossa especialista em Pessoa, Maria, da minha opinião? E os amigos?

segunda-feira, 5 de outubro de 2009

Sobre "rótulos", ainda...

Outro rótulo com o qual não concordo - e meu amigo Existenz discutiu muito comigo sobre ele - é o de "idealismo", para a filosofia de Kant. Em que pese a tradição dizer que o idealismo alemão começa com Kant, acho que o "Criticismo" kantiano tem uma amplitude filosófica muito maior do que o limitado rótulo que lhe querem imputar, mesmo que se observe apenas a "Crítica da Razão Pura".
Entretanto, ao contrário de Spinoza, que tive que defender  do rótulo limitante apenas contando com comentadores simpáticos à minha ideia, Kant falou por si mesmo.
Nos "Prolegômenos" (parágrafo 13, observação 2), ele diz: "O idealismo consiste apenas na afirmação de que não existe outro ser senão o pensante; as demais coisas, que acreditamos perceber na intuição, seriam apenas representações nos seres pensantes, às quais não corresponderia, de fato, nenhum objeto fora deles. Eu afirmo, ao contrário: são-nos dadas coisas como objetos de nossos sentidos, existentes fora de nós, só que nada sabemos do que eles possam ser em si mesmos, mas conhecemos apenas seus fenômenos, isto é, as representações que produzem em nós ao afetarem nossos sentidos".
Viu, Existenz? Não sou eu que estou dizendo, não! Quem se defende do incômodo rótulo de "idealista" é o próprio Kant!
A verdade é que nós, leitores posteriores, acabamos por ler o pensador segundo uma perspectiva dos seus seguidores mais próximos. Após Kant, vieram os pós-kantianos... idealistas. Realmente, uma interpretação de Kant pode assumir um viés mais idealista, mas não me parece que essa fosse a intenção do próprio filósofo.
Aliás, eu mesmo tenho que me desculpar com Existenz, pois sempre tendo a falar sobre Merleau-Ponty perspectivando-o a partir do Husserl, pelo (reducionista) rótulo, que serve a ambos, de fenomenólogos. Com isso, acabo interpretando o francês sob uma óptica idealista, também.
Parece que, como os "símbolos", os "rótulos" são maus necessários: ao mesmo tempo que nos permitem um acesso rápido, identificando um cenário circunstancial que nos indica prontamente o que se pretende dizer, falham ao deixar de lado todas as matizes e detalhes que envolvem aquela mesma "mensagem".

sábado, 3 de outubro de 2009

Kierkegaard, na Casa do Saber

Dessa vez, o encontro na Casa do Saber foi sobre o dinamarquês Kierkegaard. A coisa começou a se mostrar ótima já na apresentação do professor: Karl Erik Schollhammer, dinamarquês, que leciona na PUC-RJ.
Isso mesmo.... um dinamarquês apresentando outro.
A primeira lição foi quanto à pronúncia correta do nome do dinamarquês mais famoso. Estamos acostumados a ouvir "Kirkgard", ou até "Kirkgaaaaard" (Rsss). Entretanto, o correto é "Kirkgórd". Já até me acostumei, após tanto ouvi-lo na aula.
Outra informação inimaginável para mim, que sempre vejo uma lista de, no máximo, uns dez livros do dinamarquês, foi saber que a primeira edição dinamarquesa de suas obras contava com 26 volumes. Mas, como havia ainda muito material inédito, a próxima publicação, que está em fase de conclusão, está sendo planejada em 55 volumes!!!! Só os diários têm cinco mil folhas!!!
O Soren humilhou nosso Spinoza, cujas obras completas - incluindo correspondências -, em francês, conta com apenas quatro volumes... excluindo-se apenas a "Gramática hebraica".
E não se esqueçam que o homem morreu mais novo que Spinoza, que se foi aos 44 anos, enquanto o dinamarquês faleceu aos 41.
Essas são apenas informações "periféricas". Pretendo colocar alguma coisa mais. 
De qualquer forma, dá para contar que, no intervalo, enquanto bebíamos um gostoso vinho português, aproveitei um instante de isolamento do mestre para traçar paralelos entre Kierkegaard e Heidegger - aproximação que sempre aparece, em vista do dinamarquês ser considerado o "Pai do Existencialismo". Ponderei sobre o alcance do conceito de "angústia" em Kierkegaard, que, pelo exposto na primeira parte da aula, diferia bastante da consideração ontológica de Heidegger. Aliás, o alemão sempre fazia questão de dizer que sua "angústia" - não dele, pessoalmente, mas de sua filosofia (Rsss) - não tinha um cunho apenas psicológico. O professor Karl confirmou que, em Kierkegaard, a "angústia", embora "estruturante" da existência humana, tinha apenas uma perspectiva psicológica. Inclusive, disse-me ele, Kierkegaard afirmava, por vezes, que estava fazendo uma consideração socio-psicológica existencial. Ou seja, no dinamarquês, estávamos sempre dentro de uma dimensão antropológica e psicológica, ao contrário da dimensão ontológica pretendida pelo alemão.
Para "apimentar" a conversa, perguntei: "E Heidegger conseguiu manter-se suficientemente afastado dessa dimensão psicológica, atendo-se somente à ontológica?". Ao que o professor respondeu: "Eu acho que não!".
É esse o ponto em que eu sempre entro em atrito com Heidegger - que ele não me escute: o "ontológico", segundo um ponto de vista "estruturante" da existência humana, penso, é a presença de uma psiquê. Heidegger toma as dimensões psicológicas da sua análise, evita propositalmente falar na tal psiquê, e sobe um nível, tomando "efeitos psicológicos" - ônticos, portanto -, que sempre estão presentes na estrutura da "natureza humana" - que, aliás, ele sempre nega haver - fazendo, portanto, obviamente parte da totalidade dos "Dasein" e os utiliza como se eles é que fundassem esses mesmos "Daseins".
Será que consegui dizer algo de forma mais clara que Heidegger? Rsss.
Depois eu volto ao "Kirkgórd"!


sexta-feira, 2 de outubro de 2009

O "Heidegger" de Kolakowski

Nosso amigo Júlio perguntou sobre a descrição do pensamento de Heidegger, no livro do Kolakowski.
Prometo que coloco um post mais caprichado, mas, por enquanto, fica uma espécie de provocação. Lá vai, então, o segundo parágrafo da parte referente a Heidegger.
"Heidegger é, de fato, um escritor incômodo e, muitas vezes, irritante. No entanto, não é difícil nos convencermos de que um esforço considerável , necessário à leitura de suas obras, não é inútil e que seus confrontos com a palavra, bem como sua intraduzível prosa alemã, não resultam de um capricho, mas são uma tentativa de nos dizer algo que é importante, porém, às vezes, oculto ou esquecido".
Particularmente, concordo com a opinião de Kolakowski. Aliás, sinto a mesma coisa, no que diz respeito a "Ser e Tempo": Heidegger nos "incomoda", como escritor, mas há uma mensagem importante que ele pretende transmitir. E, justamente por isso, vale à pena lançar-se ao texto.
Depois eu escrevo mais.

quinta-feira, 1 de outubro de 2009

Um novo sebo

Nem só de lançamentos vive um interessado em Filosofia. Nosso árduo trabalho de garimpo, em sebos, por vezes, traz uma felicidade ímpar. Este, aliás, foi o caso do livro do professor Alcantara Nogueira, que comprei em um "alfarrabista" - para usar o termo de Portugal - e que chamo de "tesouro spinozano".
Por esses dias, descobri um novo sebo aqui na minha cidade - novo sebo... sebo novo, embora essas palavras não guardem uma harmonia tão perfeita, sigo com a estória. Entrei, perguntei pela seção de Filosofia e... babei.
Resumo da ópera: "Cinco lecciones de Filosofia", de Xavier Zubiri; "História da Filosofia - volumes 4 e 5", do François Châtelet; "Descartes e o Racionalismo", de Geneviève Rodis-Lewis; e o esgotadíssimo "Aprendendo a pensar - volumes I e II", de Emmanuel Carneiro Leão.
Só de digitar isso, já fico com um sorriso nos lábios!