segunda-feira, 27 de janeiro de 2014

"Spinoza's Moral Philosophy"


   O título do post é o mesmo de um famosíssimo artigo de Edwin M. Curley.
   Valho-me do artigo para tirar uma breve citação e apresentar um livro brasileiro.
   A citação é a seguinte:
   "It is a rare book on ethics which does not have at least a passing reference to Spinoza. But it is an even rarer book which has more than a passing reference".
   A bem da verdade, livros introdutórios brasileiros de Ética são muitos os que não fazem nem uma "referência passageira" à ética spinozana. Portanto, se a primeira parte da asserção de Curley já se torna complicada, aqui no Brasil, mais raros ainda seriam os livros que correspondem à segunda parte.
   Mas... eis que nos meus passeios por livrarias, encontrei um pequeno livro chamado A Ética como fundamento dos projetos humanos, organizado por Maria Lourdes da Cunha e Lene Revoredo Gouveia, publicado pela Saraiva, em 2012, que tem um capítulo chamado "A ética de Spinoza: da imanência metafísica aos princípios morais", de autoria do prof. Dr. Carlos Frederico Gurgel Calvet da Silveira.
   São menos de quinze páginas sobre o assunto - extensão que não fica muito aquém dos diversos outros capítulos, passando mesmo alguns -, num tom introdutório, mas que tem a relevância de colocar nosso querido filósofo num livro acessível e de grande apelo de divulgação. O artigo cita interpretadores como Matheron e Yovel, o que é uma garantia de abordagem séria. 
   Em que pese o fato de o autor ser especialista em Tomás de Aquino, e não em Spinoza, vale a pena ler o artigo.
   

A atualidade de Spinoza (4)


   Para fechar esse assunto da atualidade de Spinoza, vejamos ainda o que Sir Hampshire diz - no mesmo Spinoza and the Idea of Freedom - sobre o estudo do filósofo luso-holandês atualmente:
    "I do not therefore propose historical accuracy and historical justice as motives for returning once again to the original Ethics [...]. I believe that there is something very relevant to moral and political philosophy at this time to be learnt from an entirely literal, unprejudiced, and uncondescending attention  to Spinoza's idea of freedom"
   Portanto, estudemos Spinoza, gente! Mas não apenas para fazer justiça historiográfica à figura deste filósofo, e sim para que aprendamos mais sobre Filosofia Moral e Filosofia Política!

A atualidade de Spinoza (3)


   Já narrei, num post anterior, o temor de um dos professores da banca de apresentação do meu projeto de Mestrado da minha relação - segundo ele, de uma, talvez, dependência excessiva - com a Filosofia da Mente, ao tentar falar de Spinoza, nos moldes em que meu projeto de organizava.
   Queria, então, colocar uma opinião de Sir Stuart Hampshire (1914-2004), que já apareceu em um post aqui, sobre nosso filósofo e essa questão. Escreve, Hampshire, em Spinoza and the Idea of Freedom:
   "I have the persisting feeling - I cannot properly call it a belief - that in the philosophy of mind he [Spinoza] is nearer to the truth at certain points than any other philosopher ever has been".
   Uau, hein, gente! Apesar de eu pensar isso também, as palavras são de alguém do gabarito de Sir Hampshire!
   

quarta-feira, 22 de janeiro de 2014

Metafísica e botequim

   
   O calor no Rio está demais. Parece que comprei uma passagem para o Inferno... o qual, não se pode negar, aparentemente tem suas vantagens. Rsss.
   Uma dessas vantagens é a cerveja Original - algo como a Antártica das antigas - bem gelada, nos botecos da vida.
   Pois bem... depois de resolver coisas no banco, na papelaria, na livraria, etc. e tal, parei para degustar uma Original. Obviamente, tenho que descansar carregando pedra, e levei comigo o livro Metafísica: conceitos-chave em Filosofia, de Brian Garrett, publicado pela Artmed, em 2008.
   Eis que estava acabando minha cervejinha, quando, concluído o capítulo sobre "Livre-arbítrio", deixei o livro sobre a mesa do bar/botequim. Curiosamente, um homem na mesa ao lado disse: "Metafísica? Tem que beber muito para abstrair a tal ponto!". Eu, rindo, concordei. E disse: "É mesmo, uma cervejinha ajuda esse tipo de leitura". O papo, então, começou. Ele disse que era formado em Matemática, mas que sofrera um acidente de moto onde perdera massa encefálica e que, dali em diante, aposentado, só se preocupava com coisas mais "leves" - por exemplo, beber uma cerveja pela manhã e outra à tarde. E, concluindo o papo, disse que, se continuássemos conversando, eu acabaria jogando fora o meu livro de Metafísica. Eu comentei: "Por enquanto, não! Ainda tenho umas abstrações a realizar!"
   Não é interessante como até a Metafísica pode render um certo papo de botequim? Rssss.

Nietzsche e os estoicos


   Sabemos que o bigodudo Nietzsche tratou do "eterno retorno [do mesmo]" sem dizer que esta ideia já estava presente na Antiguidade, com uma força autoral bastante significativa no Estoicismo. É lógico que todos os nietzscheanos dizem que o conceito estoico não é tão elaborado quanto o do alemão, e que, se neles a percepção é meramente cosmológica, no do bigodudo há ares éticos, principalmente. O fato, entretanto, é que a intuição estoica é bem forte, e parece reivindicar mais originalidade que a do alemão.
   Uma coisa que sempre se diz - ou seria melhor escrever "que os nietzscheanos sempre dizem"? - é que a concepção estoica é fatalista demais, e que só resta ao homem seguir resignado esse retorno do mesmo. Eu sempre caí nesse engodo. Mas, eis que lendo do De vita beata, ou seja, o Da felicidade, de Sêneca, me deparo com a seguinte passagem: "Só a virtude pode chegar lá, passo a passo dominará o caminho, mantendo-se firme, suportando todos os imprevistos, sem resignação, mas com alegria, consciente de que as adversidades da vida fazem parte da lei da natureza" (Grifo meu).
   Percebe-se, portanto, que, além de usurpar o conceito de "eterno retorno" dos estoicos, o alemão também acabou tomando deles algo que poderia ser comparado ao "amor fati", afinal é isso o que o tal "sem resignação, mas com alegria" parece sugerir.
   Esse tal de Nietzsche é bem espertinho, mesmo!

terça-feira, 21 de janeiro de 2014

A atualidade de Spinoza (2)


   Ah... vejam só o começo do Prefácio da revista:
  "Em grande parte graças ao filósofo francês René Descartes (1596-1650), que no século 17 escreveu, em latim, Cogito, ergo sum, temos ao longo dos anos sedimentado a crença de que basta pensar para existirmos. Essa premissa pode até ser reconfortante sob vários aspectos, mas é insuficiente. Não basta raciocinar. O que sentimos se impõe - e influencia o que pensamos. Ou seria o contrário?"

A atualidade de Spinoza


   Quando fui defender o meu projeto para o Mestrado, que versava obviamente sobre a ética spinozana, fiz referência a Freud e às neurociências. Um dos professores da banca mostrou certa preocupação e perguntou se eu não ficaria excessivamente refém de áreas que não pertencem à Filosofia, ou, por outro lado, se não teria que mergulhar muito fundo em Filosofia da Mente para poder dar conta de minha pesquisa.
   Embora eu ainda acredite que um bom conhecimento da filosofia freudiana - particularmente, acho que há teses do vienense que são verdadeiramente filosóficas -, bem como das neurociências, seja muito interessante para o entendimento de algumas postulações spinozanas sobre a mente, acabei me curvando ao já citado componente da banca e reduzindo as referências à Introdução da Dissertação.
   Mas trabalho é trabalho... e diversão é diversão. É lógico que continuo a sentir prazer em pensar nesse jogo de pertencimento das ideias spinozanas a outras áreas que não especificamente a da Filosofia Moral. E a Antropologia Filosófica - se bem que alguns defendam que esta área da Filosofia foi absorvida pela Filosofia da Mente... o que eu não acho - de Spinoza continua me maravilhando.
   O mais interessante é que continuo vendo Spinoza como um contemporâneo, pelo menos em termos de algumas de suas intuições. É certo que defender sua Metafísica, hoje, é mais difícil do que no século XVII - ainda que eu a ache totalmente pertinente -, mas a Psicologia de Spinoza é de uma atualidade espantosa, a meu ver.
   Ontem, fui à banca de jornais e vi uma publicação especial da revista "Mente e cérebro", tratando das emoções. O título é "O desafio das emoções", sendo este o quinto volume de uma coleção. Os artigos que constam da revista são: "O jogo das emoções"; "Sob controle"; "As engrenagens do sentimento"; "Mímica facial"; "Tormentos da ira"; "Alexitimia: a cegueira dos sentimentos" e "De bem com a vida", cada um deles escrito por um determinado especialista. Títulos bastante interessantes, que prometem conteúdos ainda mais instigantes.
   A capa contém o seguinte texto: "Mesmo sem nos darmos conta, na maior parte do tempo, somos influenciados por aquilo que sentimos. Entender como se dão esses processos psíquicos pode ser útil para evitar que eles nos prejudiquem".
   Agora, respondam-me: esse não é o projeto spinozano? Taí a atualidade de Spinoza!!!

segunda-feira, 20 de janeiro de 2014

A correspondência de Spinoza (2)


   Ah... ia esquecendo.
  Vejam a opinião de Goethe sobre a correspondência de Spinoza:
   "His correspondence is the most interesting book one can read in the world of uprightness and of humanity" (Goethe's Gespräche, Edição 1909, Volume I, p. 35).
   Não é só "um dos mais interessantes livros", mas "the most interesting book"!!!
   Esse Spinoza...

A correspondência de Spinoza

   
   Está nos meus planos, um dia, dedicar-me seriamente à leitura da correspondência de Spinoza. Não se trata apenas de uma "bisbilhotice" sobre a vida pessoal do filósofo - até porque, pouco há, em sua troca registrada de missivas, que possa ser visto como dizendo respeito às suas particularidades mais íntimas, confessadas apenas a amigos muito próximos. Existe, sim, é um complemento mais "fluido" de sua doutrina. Portanto, meu interesse é puramente filosófico.
   Ainda que não seja tão "livre" quanto numa entrevista, nos moldes atuais, sigo uma proposta do livro O que os filósofos pensam, de Julian Baggini e Jeremy Stangroom (editores), que, na Introdução, diz:
   "Se quisermos conhecer o que os filósofos pensam, poderíamos supor que o melhor a fazer seria ler alguns livros deles. Todavia, há uma razão muito boa para que esta coleção de entrevistas possa estar mais bem equipada para satisfazer nossa curiosidade. Em poucas palavras, em seus livros publicados, os filósofos não tendem a contar-nos exatamente o que eles pensam a respeito de uma série de questões. Em geral, eles apenas nos contam que possuem argumentos originais e persuasivos para crer a respeito de uma série geralmente limitada de tópicos".
   Imagino que o recorte do que o filósofo "sabe" é mais restrito do que aquilo sobre o que ele pensa. As cartas podem, em alguma medida, revelar sobre o que eles se põem a pensar, sem ainda ter "certezas". Além disso, há um certo exercício, por parte de um grande filósofo, nas cartas, para explicar a quem o acompanha - mesmo que a certa distância raciocinativa - aquilo que lhe vai na mente. E esse esforço pode recompensar a nós, que temos algumas dúvidas sobre os próprios textos ou mesmo sobre como ele pensava o mundo.
   Meu contato com as cartas de Spinoza tem duas versões, uma francesa e outra inglesa. Acho que esta última é a grande referência no estudo da correspondência spinozana, pois se trata do The correspondence of Spinoza, traduzida, editada e anotada por A. Wolf, professor da Universidade de Londres, se não me engano, publicada em 1930. Obviamente, tenho uma versão mais nova... afinal, não sou tão velho assim. Rsss.
   Chamou-me atenção a admiração de Wolf por Spinoza, quando ele escreve na Introdução:
   "The letters contain things of first-rate importance for the correct interpretation of the philosophy of Spinoza; and, above all, they help one to realize something of the greatness and strength of his character - one of the greatest in the whole history of mankind".
   Vejam que não é apenas um dos maiores da História da Filosofia, mas da História da Humanidade!!!!
   Esse tal de Spinoza não é mole, não!

quarta-feira, 15 de janeiro de 2014

Começando a trabalhar de verdade

   
   Vou tratar, no espaço principal, do que foi fruto de dois comentários, um anônimo e outro de nosso novo amigo Sérgio Storch, a respeito do livro de Yalom.
   Esclareço, inicialmente, que os comentários feitos ao ótimo livro de Yalom levam em conta que não se trata exatamente de uma biografia nem de um livro específico sobre a filosofia spinozana. Portanto, reconhecendo que o grau de acuidade de algumas passagens não precisa ser absurdamente alto, compreendo que deve haver uma certa licença poética.
   Mas minha intenção foi tão somente, para aqueles que gostam um pouco mais de Spinoza, de melhorar a precisão de algumas informações.
   De qualquer forma, a obra presta um ótimo serviço àqueles que se aproximam de Spinoza, já que têm nela um caminho gostoso - e, de modo geral, bem correto - a ser percorrido. Eu, inclusive, presenteei uma amiga com um exemplar, que ficou de "circular" por entre outros amigos.
   Quanto à questão do "cherem", agradeço ao Sérgio pela participação tão pronta. A aproximação com o "Xerém" (cidade) foi só uma brincadeira. Eu sei que o "h" é aspirado, como no Latim e no Grego, e que, portanto, ficaria realmente mais próximo ao "jerem", em Espanhol. Ainda assim, particularmente, teria que pesquisar um pouco mais em outros idiomas. No meu "The Cambridge Companion to Spinoza", o primeiro capítulo, que fala da vida e obra de Spinoza, registra "herem". De qualquer forma, deve haver uma transliteração padrão do Hebraico para o Português, como há do Grego, por exemplo - embora, neste caso, ainda se usem variantes, como em "psiché" e "psiké", ou até "psikhé"... embora a transliteração oficial seja a primeira.
   Obrigado aos amigos pelos comentários.

Começando 2014... com mais amigos

   
   Dizem que, no Brasil, o ano só começa depois do carnaval. Embora o blog esteja meio "preguiçoso", vamos adiantar um pouco isso, e "abrir os trabalhos" mesmo não tendo transcorrido a festa momesca.
    Eu já tinha desejado um bom ano para todos os amigos, mas, agora que efetivamente estamos nele, reforço meus votos de muita alegria para todos.
   Quero iniciar 2014, saudando os novos amigos dos amigos que aqui chegam: a Denise, o Sérgio Storch, o Bruno e o Nélson Aharon. 
    Convido todos a se sentirem "em casa", enviando seus comentários sobre os posts, ou mesmo lançando novos assuntos. Aliás, nosso amigo Sérgio Storch já o fez. 
    Digamos que está realizada oficialmente a "cerimônia de abertura de 2014" aqui no blog... que, prometo, será mais movimentado este ano.
   Grande abraço a todos!