sábado, 30 de maio de 2009

A "dúvida hiperbólica"

Interessante a ponderação de Foucault sobre a "dúvida cartesiana". Descartes se propôs, em função de seu método, a radicalizar intencionalmente sua dúvida. Para isso, foi duvidando, e duvidando, e duvidando. Conseguiu, como sabemos, duvidar até do seu próprio corpo, embora reconhecesse a sua existência.
Bem... disso, já sabemos. Mas, Foucault questionou a radicalidade da dúvida cartesiana, pois Descartes vai tirando suas conclusões sem, em momento algum, perguntar-se se ele estava mentalmente sadio. Ou seja, desconsiderando essa hipótese, Descartes fica sem a possibilidade de estabelecer o seu "ponto arquimediano", pois todas as suas conclusões podem ser falsas, não por estar sendo enganado por um "gênio maligno"/"Deus enganador", mas por estar sendo ludibriado pelo próprio "eu enganador".
Coitado do Descartes... foram tantos a descobrir seus "furos". Se bem que é sinal da qualidade de um pensador o fato de precisar ser "derrubado" tantos séculos mais tarde.

sexta-feira, 29 de maio de 2009

Casamento vs. Filosofia

Eu postei ontem aquela dos "causos" filosóficos sobre casamentos. Fui investigar os filósofos mais antigos a fim de eliminar essa má reputação do casamento junto aos filósofos.
Lembrei, de pronto, que Aristóteles foi casado, tanto assim que dirigiu um escrito ao seu filho, "Ética a Nicômaco". Se bem que não tenho informações sobre seu casamento.
Depois, veio-me à cabeça Marx, sobre quem eu já até escrevi, num registro do amor pela sua esposa. Biiiingo!
Se considerarmos Freud um filósofo - o que, na minha opinião, ele também foi -, teremos mais um exemplo de bom casamento. Outro ponto!
A coisa começou a ficar difícil... apelei, então, para a internet. Não tive muito sucesso. Minha busca terminou em uma frase de Nietzsche: “Um filósofo casado só pode ser personagem de comédia, e mesmo Sócrates só poderia ter se casado ‘por ironia’” - no que Nietzsche apela para um traço muito destacado na sua filosofia, que era a ironia.
Voltei, portanto, quase ao começo. De qualquer forma, continuarei procurando. Quem puder, que me ajude. Mas não valem esses mais contemporâneos. Aí, não tem muita graça.

quinta-feira, 28 de maio de 2009

"Causos" filosóficos sobre casamentos

Na aula sobre Descartes, uma senhora perguntou se o filósofo francês era casado. A partir da resposta negativa, ela disse "Esses filósofos gastavam tanto tempo pensando que nem podiam casar". Ela não estava de todo errada. Afinal, o próprio Spinoza, depois de uma suposta paixão pela senhorita Clara Maria Van den Ende, afirmou que um casamento, principalmente com filhos, atrapalharia sua condição ideal para pensar.
Mas há mais casos curiosos na Filosofia sobre casamento.
Sócrates é um dos quais a esposa é tida como uma das maiores responsáveis pela filosofia do marido. Afinal, conta-se, Xantipa era tão "insuportável", que ele preferia ficar pelas ruas refletindo sobre tudo do que ficar em casa com ela.
Na época da Filosofia Medieval, temos o triste evento de Pedro Abelardo, que apaixonado, casou-se e... foi emasculado pelo tio da moça. Esse deveria ter pensado como Spinoza!
Ainda nessa época, temos os diversos pensadores de batina, que obviamente não podiam se casar. Embora eu não saiba se levavam isso tão a sério.
Descartes é um caso especial. Apesar de manter relacionamento com uma mulher que lhe deu uma amadíssima filha - que infelizmente faleceu ainda criança -, não pôde assumir essa relação por conta do desnível social entre ele e a mulher, que era uma espécie de empregada doméstica.
Sobre Kant, não há o que dizer, em relação ao casamento. Afinal, comenta-se que o homem morreu virgem!
Nietzsche não casou - apesar de apaixonado por Lou Salomé -, o que lhe causou muitos transtornos afetivos.
Heidegger e Hannah Arendt - um, iludido inicialmente pelo nazismo; a outra, judia - formavam um belo casal. Mas, como ele já era casado e ela fugiu da Alemanha, não puderam contrair matrimônio.
Sartre e Simone de Beauvoir eram um-tanto-quanto-casados... se bem que o fato de ela arranjar um "terceiro elemento" feminino, diferente de uma filha, para "acalorar" a relação, não soa muito "maritalmente correto".
Temos Michel Foucault. Mas, desse, também não dá para falar exatamente em casamento. Afinal, ele se separou do seu marido, por ciúmes excessivos desse último. Se bem que viveu com um outro marido por mais de vinte anos. Sei lá se esse deveria contar como casamento...
Nem vou falar do Louis Althousser, que enforcou a esposa e a deixou em baixo do sofá da sala.
Caracas... será que meu casamento resiste à faculdade de Filosofia?

quarta-feira, 27 de maio de 2009

Sócrates vs. Nietzsche (2)

Eu escrevi, há poucos dias, sobre a opinião do professor Fernando Muniz de que Nietzsche teria interpretado mal Sócrates, ao indicá-lo como o iniciador de uma tradição que separava a vida prática do pensamento teórico. Minha opinião é a mesma. Acho que, se alguém tem que ser acusado disso, esse alguém seria Platão - em sua fase madura, portanto já um pouco mais afastado do pensamento socrático mais "puro".
O fato é que, por esses dias, lendo sobre Sócrates, em "Introdução à Filosofia", organizado por Susana de Castro, vejo meu ponto de vista - e o de Fernando Muniz - corroborado, quando ela afirma: "Não devemos atribuir a Sócrates a teoria platônica das ideias; sua filosofia era uma filosofia da imanência, voltada, nos moldes sofísticos, para uma investigação do ser humano concreto, dos indivíduos, seus anseios e perspectivas. Propunha em seus ensinamentos indicar a melhor forma de cada jovem direcionar sua vida de maneira satisfatória. TEORIA E VIDA NÃO SE SEPARAM PARA SÓCRATES". (GRIFO MEU)
Portanto, se nosso querido Nietzsche fosse mais contemporâneo do que extemporâneo, podendo assistir às aulas de Fernando Muniz e ler esse livro, publicado pela Editora Vozes, teria evitado cometer uma injustiça contra a "Mosca de Atenas", o nosso querido Sócrates.

terça-feira, 26 de maio de 2009

Mais um livro autografado

Ontem, tive mais uma aula na Casa do Saber. Estamos, agora, falando sobre Descartes. Para minha sorte, o professor, desta vez, é Marcos André Gleizer, doutor pela Universidade de Paris IV, com a tese "Noções de verdade e certeza em Espinosa".
Como já sabia disso... e, tendo o livro que "nasceu" desta tese - "Verdade e certeza em Espinosa", da L&PM Editores -, foi impossível conter-me, e não pedir um autógrafo no livro. O detalhe é que nunca vi esse livro em livrarias. Para minha sorte, um catálogo da editora "caiu" em minhas mãos e eu encontrei o título. Fiz o pedido diretamente à editora... e já guardava meu exemplar havia algum tempo.
O fato é que vim, todo feliz, com meu pequeno tesouro, de volta para Niterói.
É... Spinoza deve ter ficado feliz com mais essa "sincronicidade"!
Sobre a aula, escrevo depois.

segunda-feira, 25 de maio de 2009

Um novo livro sobre Spinoza

O mercado brasileiro possui mais um livro sobre nosso ilustre amigo Baruch Spinoza. Trata-se de "Corpo, um modo de ser divino", de Márcia Patrizio dos Santos, Ed. AnnaBlume.
Meu exemplar, devidamente autografado pela autora, ainda não teve a leitura iniciada formalmente. Por enquanto, apenas algumas passadas d'olhos, aqui e acolá, para perceber o que me espera e a forma com que se abordaram os conceitos spinozanos.
Logo de cara, temos a alegria de encontrar um prefácio assinado por P-F. Moreau. Isso já é garantia de que o livro é sério. Afinal, monsieur Moreau é um dos reconhecidos especialistas internacionais no nosso querido luso-holandês.
Folheando mais um pouco, percebo que a forma - e o mesmo vale para uma percepção superficial do conteúdo - é muito bem estudada. A autora, já na primeira parte do livro, mostra-nos um pouco da história do pensamento na época imediatamente anterior a Spinoza. Com isso, permite-nos perceber os questionamentos que estavam "no ar", quando do florescimento deste pensador. Apresenta-nos, ainda nesta parte, o ponto de vista de Spinoza, comparando-o ao de Descartes, justamente para apartá-lo intelectualmente deste.
O que me parece ser, entretanto, a magna tese do livro é que "Spinoza é um filósofo do corpo". Aliás, este é praticamente o título do primeiro capítulo da primeira parte. Parênteses, aqui: o livro tem previsão de ter uma segunda parte. Espero que, ao contrário de muitos outros, essa segunda parte não se perca em um "limbo editorial", deixando-nos órfãos de boas publicações.
Fechados os parênteses, continuo.
Tese que sempre defendi, inclusive no blog, é que, ao contrário do que se afirma, não foi Merleau-Ponty, nem, antes dele, Nietzsche, que iniciou o movimento de valorização do corpo - invertendo um processo corrente na Filosofia Ocidental -, mas sim Spinoza. Já afirmei essa minha tese, também, em um dos cursos da Casa do Saber, quando o assunto era Nietzsche como precursor dessa valorização.
A autora escreve, muito apropriadamente: "Para este filósofo, o homem é essencialmente psicofísico, ou seja, essencialmente corpo-mente". Perceba-se que não é "corpo e mente", como se fossem dois conteúdos dentro de um mesmo "invólucro". Ao contrário, a associação "essencial" de ambos é que é o "homem".
De início, então, ficou uma boa impressão do livro. Coloco mais posts sobre ele no futuro.

domingo, 24 de maio de 2009

sábado, 23 de maio de 2009

O pensamento de Spinoza(2)

Paramos na Substância...
Spinoza afirma que a Substância se estende como fundamento de tudo. Não há algo que seja "não-Substância". Ou seja, apesar de uma aproximação que já fiz do "Ser" de Heidegger com a "Substância" de Spinoza, não há algo que não seja "fundado" na "Substância". Portanto, não há o "Nada", ou o "Não-Ser", se aproximarmos os dois pensamentos. Isto é, mesmo não havendo o "ente", a "Substância" está lá.
Essa "totalização" do conceito da Substância exige que ela seja única e infinita. Não há mais de uma substância - como pensava Descartes, com suas res cogitans, res extensa e Deus - e nem há limites para a Substância spinozana.
O interessante é que, se existem corpos materiais e imateriais, tem que haver algo na Substância que responda pela "produção" desses tipos de "entidades". Esse "algo" são "propriedades". Há um ato "subversivo" de Spinoza, aqui: ele coloca a propriedade "Extensão" na Substância. É como se ele dissesse que Deus é corpóreo, entre outras propriedades que tem. Xiii... que confusão que você aprontou, hein, Spinoza!
Aqui, começamos a perceber uma diferença fundamental em Spinoza e nos outros "modernos". Se há um "substrato" comum entre as propriedades "extensão" e "pensamento", a "comunicação" entre essas propriedades pode se dar justamente através desse nível de existência.
Só para pensar. Podemos, então, dizer que mente e corpo estão no mesmo nível de importância.
E fechamos este post...

sexta-feira, 22 de maio de 2009

A ética spinozana

Meu amigo Júlio já cobrou mais de uma vez o assunto "ética spinozana". Não é fácil falar sobre isso em um post... aliás, nem em vários. Rsss. Decidi, então, ir lançando posts, numa tentativa ousada de aproximação ao pensamento de Spinoza. Esses posts, sem pretensão de serem algo tão profundo, podem ir ajudando a explicar o livro "Ética", do Spinoza, e a nos esclarecer um pouco da sua visão de ética.
O primeiro, então, começa assim...
O livro "Ética" não é uma coletânea de regulamentos morais, como poderia passar pela cabeça de alguns. Ele é um tratado, escrito ao longo de vários anos, que demonstraria, portanto, o pensamento mais maduro do luso-holandês, versando sobre vários temas, como metafísica, epistemologia, psicologia e ética.
O tratado é dividido em cinco partes, mas os títulos de cada uma podem enganar um pouco o que se espera do conteúdo.
Spinoza abre a primeira parte falando da "causa sui". O que é isso? Ele explica que é aquilo que é causa de si mesmo. O conceito pode parecer meio estranho, mas na verdade expressa algo que não tem causa, o incausado. Esse conceito é importante porque acaba com uma possível cadeia infinita de causalidade, o que implicaria um desconhecimento de tudo; afinal, para Spinoza - como já o tinha sido para Aristóteles -, conhecer é conhecer pela causa.
Dito isto, poderíamos pensar nesse incausado como Deus. É verdade... e Spinoza faz uma aproximação desse tipo. O problema - para os teístas - é que Spinoza despersonaliza esse incausado através do conceito de Substância (com "S" maiúsculo). O termo latino "substantia" é muito apropriado, já que indica aquilo que está "sob" o "lugar" que vemos. A substância é, portanto, o apoio que subjaz ao ente. Aristóteles já tinha percebido que todos os entes têm "algo" que é o seu fundamento, que está sob tudo o que se manifesta a nós. Esse algo seria, para Aristóteles, a substância dos entes. Spinoza dá uma dimensão maior a esse "algo", já que ele fundamenta o Todo, chamando-o de "Substância".
Fico por aqui... por enquanto.

quinta-feira, 21 de maio de 2009

Clonagem

Todos devem lembrar do sucesso da clonagem da ovelha Dolly. A experiência deixou os cientistas eufóricos, pois uma célula especializada - no caso, da glândula mamária - de uma ovelha de seis anos forneceu o material para sua "duplicação", possibilitando, entretanto, a formação de todos os tecidos da nova ovelha, a Dolly.
Uma coisa comentada posteriormente é que Dolly envelhecia rápido demais e com seis anos apenas, a metade da expectativa de vida de uma ovelha da sua raça, ela já estava com artrite degenerativa. Dolly, então, foi submetida à eutanásia.
É certo que o homem conseguiu enganar a natureza, partindo de uma célula especializada e, iniciando todo um processo de divisão celular, produzir um embrião, que viria a ser a simpática ovelhinha Dolly. Será, entretanto, que esse "passar a perna" na natureza fez com que esta fosse totalmente ludibriada? A resposta é "Não"!
Para surpresa dos cientistas, apesar de ter nascido com a aparência de qualquer bebê ovelha, a nossa Dolly apresentava uma estrutura celular, chamada "telômeros", mais curta que o normal para sua idade biológica. Essas estruturas são responsáveis, ao que parece, pela proteção e reparação das células. E, quanto mais envelhecemos, mais curtos eles ficam. Isto quer dizer que, apesar da aparência de seis anos, ela já tinha os tais telômeros de uma "velhinha" de doze anos - fim de sua vida, portanto. Ou seja, a natureza não se deixou fazer de boba totalmente.
Portanto, ao contrário do que se pensou possível, ao "duplicar" um ser humano para eternizá-lo, e ir fazendo isso indefinidamente, percebemos que a primeira "cópia" de uma pessoa de quarenta anos, por exemplo, ao completar os "seus" quarenta já teria uma idade "celular" de oitenta. A segunda cópia, se feita aos quarenta, provavelmente morreria antes dos "seus" vinte.
É difícil enganar a natureza, hein!

quarta-feira, 20 de maio de 2009

A história da Filosofia em 40 filmes


Começou sábado passado, e continuará acontecendo por vários sábados, um evento chamado "A história da Filosofia em 40 filmes". O local é a Caixa Cultural, no Centro do Rio.
A proposta do projeto parece ser bastante interessante. Um filme é exibido, a partir de um tema que se pretende pôr em questão. Após a exibição, o filósofo Alexandre Costa ou seu colega Patrick Pessoa faz uma palestra integrando o que foi visto ao tema filosófico da vez.
O Alexandre Costa já foi citado em posts no blog, que falavam sobre o curso "Convite à Filosofia", do qual participei, na Casa do Saber.
Para melhorar, só dizendo que a entrada é franca... E é! Mais informações no site www.caixacultural.com.br

terça-feira, 19 de maio de 2009

Aula sobre Aristóteles

Dia 18, ocorreu a última participação do professor Fernando Muniz no curso "Os pensadores", da Casa do Saber. Sua aula foi sobre Aristóteles. Só para antecipar o clima da aula, cabe registrar que, ao final, os alunos aplaudiram o professor.
Além de verdadeiro conhecedor do pensamento platônico e aristotélico, Fernando Muniz é dono de grande simpatia e carisma. Suas aulas são pontuadas por "paradas reflexivas" estratégicas, que ele faz lançando um misto de pergunta-desafio-afirmação. Além disso, ele usa, em determinados momentos, de um tom "divertido", que alivia a tensão de encarar de frente um determinado filósofo com pensamentos pesados. Gostei muito. Melhor ainda é que o homem é professor da Universidade Federal Fluminense e, se tudo correr bem, é para lá que eu vou, quando for a hora do meu tão esperado curso de Filosofia.
Agora... chega de "puxa-saquismo", e vamos ao comentário sobre o curso. Rsss.
Como alguns já sabem, sou fã incondicional de Aristóteles. Portanto, era mesmo de se esperar que eu já tivesse lido muito sobre ele. Com isso, não posso dizer que houve muitas novidades no que ouvi. Aprendi mais sobre determinados termos em grego que são traduzidos de forma meio "reducionista". Mas eu diria que a afirmação que mais me marcou na aula é a que Fernando Muniz resumiu nessa frase : "Aristóteles é o filósofo de Ética mais importante dos nossos tempos".
Embora o professor tenha abordado várias facetas do pensamento aristotélico, a ênfase foi na Ética. Isso, porque ele acredita, como a frase anterior demonstra, que o Estagirita não tem uma ética ultrapassada, mas plenamente atual, que nos coloca constantemente para pensar nossa vida... e, principalmente, para pensar se nossas ações são conformes com nossas crenças. Porque justamente aí está a possibilidade da eudaimonia, que traduzimos por "felicidade".
E, como dizia Sócrates: "Uma vida que não é analisada não vale a pena ser vivida".
Acho que esse assunto valerá mais posts.

Sócrates vs. Nietzsche

Ainda na aula sobre Platão, o professor Fernando Muniz se revelou um apaixonado por Sócrates, ao defendê-lo da acusação de Nietzsche de que a Filosofia ocidental teria iniciado seu declínio justamente com a "Mosca de Atenas".
A acusação de Nietzsche era de que Sócrates teria se distanciado da vida para se preocupar meramente com conceitos.
O professor Fernando lembra - e seria impossível Nietzsche não saber disso - que, na época de Sócrates, as ações virtuosas justificavam uma vida, ou seja, indicavam que ela valia a pena ser vivida. Sócrates, ao inquirir sobre as virtudes, não estava se preocupando apenas com conceitos "vazios". Ele pretendia, ao contrário, valorizar o viver, justificando-o através das ações virtuosas. Mas... para agir virtuosamente, era necessário saber o que significa cada uma das virtudes. Até porque, eventualmente, duas aparentes ações virtuosas podem entrar em conflito, sendo necessário um julgamento correto para que a vida não perca seu valor.
Imaginemos o famoso julgamento de Salomão, onde uma mãe abre mão de permanecer com seu filho, a fim de que o poderoso rei-juiz não divida a criança em duas partes. Uma argumentação simplória poderia ver como "virtude materna" a ação de nunca entregar o filho para outrem. Entretanto, o "abandono" da criança, pela mãe, embora doloroso em si mesmo, era necessário para salvaguardar a vida do próprio ser que tanto se ama, e o qual não se deseja abandonar.
Esse é um exemplo simples, mas há problemas éticos de uma profundidade abissal, que necessitam que realmente se estabeleçam e se analisem com extremo cuidado os valores em jogo. Era essa possibilidade de viver bem que Sócrates queria alcançar, depurando o máximo possível o que se pensava ser determinada virtude, imaginada como apreensível através de fatos concretos apenas.
Seria muita ousadia dizer que Sócrates fez uma Fenomenologia? Afinal, suspendendo o conhecimento do fato, do dado na prática, Sócrates buscava algo que era a "essência" - o eidos - daquela determinada virtude, para não confundir a "ação virtuosa" - que obviamente continha a essência de determinada virtude - com a própria "virtude".

segunda-feira, 18 de maio de 2009

Outra da aula sobre Platão

Outro questionamento que surgiu na Casa do Saber, na aula sobre Platão, foi se as "Ideias" platônicas não poderiam ser justamente a tal "síntese" daquela "dialética platônica", entendida sob um olhar hegeliano.
O professor Fernando Muniz explicou que não se deve confundir o momento em que as Ideias aparecem (já na segunda fase, a dos "Diálogos da maturidade") com aquele dos primeiros diálogos (os "Socráticos").
Pode-se até imaginar, andando ao contrário no tempo, que Platão já pensasse numa saída para as aporias que apareciam na primeira fase, e que apenas quis mostrar como seria necessário "desconstruir" os falsos conhecimentos, para depois caminhar da ausência de conhecimento até o conhecimento verdadeiro - do Bem (final), como Ideia. Mas isso não é garantido.
O que parece ter acontecido é que Sócrates pensava conforme os primeiros diálogos, com uma preocupação voltada especificamente para os valores humanos - deixando, inclusive, de lado as abstrações metafísicas -, e que Platão, como bom discípulo, fez questão de registrar isso nos seus primeiros escritos. Posteriormente, já filosofando por conta própria, e não mais se atendo somente às influências socráticas, mas também possivelmente às de Pitágoras, Heráclito e Parmênides, com uma visão já metafísica, Platão teria tentado resolver o problema das aporias com uma solução de alcance bem maior do que a própria pergunta inical. Desta forma, teria pulado de questões apenas sobre valores humanos alcançando também uma solução cosmológica e ontológica.

sexta-feira, 15 de maio de 2009

Dialética(s)

Os termos, em Filosofia, vão se modificando ao longo do tempo, como ocorre com quaisquer palavras, mas, além disso, cada filósofo vai se apropriando do vocabulário filosófico de sua época e vai "torcendo-o", até que se ajuste ao seu pensamento.
Na última aula na Casa do Saber, o assunto era Platão. O professor Fernando Muniz explicava a priméria série de diálogos platônicos - os chamados "Diálogos socráticos" -, mostrando como Sócrates embaraçava seus interlocutores com seu típico método de inquirição; até que o pretenso especialista reconhecesse que não sabia quase nada sobre o que pensava saber. O professor explicou que, através dessa dialética (platônica), o fim dos diálogos era sempre uma aporia, ou seja, um "beco sem saída". Portanto, não se chegava à conclusão sobre o que Sócrates inquiria; havendo apenas um "conhecimento negativo", do tipo "só sei o que X não é"... em vez de saber o que X é.
Determinado ouvinte do curso perguntou: "Mas essa dialética só tem tese e antítese! Onde está a síntese?". O professor reforçou a ideia da falta de conclusão do diálogo como algo, de certa forma, intencional. Afinal, Sócrates estava reforçando a sua ideia "Só sei que nada sei!".
O problema, a meu ver, foi que o aluno pensou na "dialética hegeliana", tentando encaixá-la nos diálogos platônicos. O movimento de tese, antítese e síntese era autônomo, natural, para Hegel. Tese "gerando" antítese, e essas duas, em tensão, "gerando" a síntese, que ao contrário de ser uma resolução pacífica para o conflito tese-antítese, em que apareceria um terceiro elemento "inerte", era apenas um momento de resolução "borbulhante". O conflito continuava a existir, estando os dois elementos iniciais efervescendo de possibilidades criadoras, mas momentaneamente resolvidos... uma espécie de revolução que tem uma solução pactuada. Na verdade, os antagonismos continuam, mas "apacentados" momentaneamente pelo pacto.
Já na "dialética platônica", o que há é uma opinião pretensamente verdadeira, que submetida a um método específico de crítica vai se mostrando não tão rigorosa ou fixa, como se imaginava inicialmente. Sócrates não opunha uma opinião a outra, ele analisava a própria "tese" - se assim quisermos chamar, para aproximar a instância inicial da outra dialética -, a fim de perceber impropriedades lógicas dentro dela mesma.
Além disso, não precisa haver um par de polos antagônicos. Podemos dialogar criticamente partindo de várias opiniões. Elas podem se antagonizar, mostrando seus erros lógicos, sem que se harmonizem necessariamente em uma síntese final.

quinta-feira, 14 de maio de 2009

Transição e ceticismo

Já comentei aqui que acho os momentos de transição muito ricos em possibilidades de estudo. Disse que a presença de uma tradição confrontada com um pensamento revolucionário que se expande com certa maturidade revela uma tensão muito interessante para quem se dedica ao estudo do pensamento.
Volto ao assunto, agora, para mostrar que há uma escola filosófica que sempre sai ganhando nesses embates: o Ceticismo.
Normalmente, adversários se reúnem para combater um "inimigo maior", ainda que aqueles que se uniram não tenham tanta admiração uns pelos outros. Essa é uma forma de poderem trazer à luz suas ideias, normalmente sufocadas pelo "inimigo maior" e, posteriormente, estarem livres para convencer seus ouvintes das suas próprias verdades, em detrimento daquela dos seus "ex-aliados", no momento futuro novamente adversários.
Para quem olha o tempo em que dura essa co-existência conflituosa entre tradição e "revolução", fica a impressão de que o chão está tremendo. Os "pontos fixos" de até então vão se esboroando e as incertezas aumentando. A crise se instala.
A palavra grega krisis tem justamente o sentido de "escolha, seleção, decisão". E, para decidir, é preciso investigar as possibilidades, ou seja, é preciso ser um skeptikós - aquele que investiga, que analisa com cuidado. Nesse embate entre muitas escolas, entretanto, pode-se chegar à conclusão que, rejeitada a tradição, não há certeza sobre nenhuma das alternativas apresentadas. Neste ponto, pode ser necessário realizar uma epoché, ou seja, uma suspensão do juízo sobre a melhor escolha, e continuar refletindo continuamente sobre ela.
Então, imagino que, pelo menos nos tempos de revolução do pensamento, melhor do que largar o que "sabemos-que-não-é", agarrando-nos imediatamente ao que "não-sabemos-se-é", é melhor adotarmos uma postura de adiamento proposital da decisão... isto é, adotarmos o Ceticismo.
Essa posição foi a de pensadores como Montaigne e Erasmo, na época do Renascimento, quando se instalou uma crise existencial (os homens percebendo que o mundo poderia não ser finito e que eles poderiam não ser centro de nada); uma crise religiosa (com a Reforma Protestante propondo novas interpretações da doutrina, tirando a força da Igreja Católica) e uma crise política (quando o Sacro Império Romano Germânico e várias instituições tradicionais vão perdendo força para unidades mais "nacionais", com novas relações sociais). O ceticismo filosófico foi, então, uma alternativa "saudável" para essa falta de referências.
Pergunto-me se, no momento atual, em meio a tantas "certezas" diferentes e conflitantes, não seria o momento de retomarmos, pelo menos metodologicamente, o Ceticismo.
São tantos "ismos" apelando pela nossa adesão... todos tão parecidos com os "ismos" que se vão... que é melhor assumir nossa momentânea indecisão teórica.

quarta-feira, 13 de maio de 2009

Uma verdade inconveniente

O post não se refere, apesar do título, ao livro de Al Gore, que virou documentário. O assunto aqui é a coluna de Dom Eugênio Sales, arcebispo emérito do Rio, publicada aos sábados no Jornal do Brasil e aos domingos em O Globo.
Na última coluna escrita, cujo título é "A essência da religião", Dom Eugênio expõe, sempre se valendo de trechos de textos "canônicos", o que é o "coração" da religião católica.
Numa passagem, D. Eugênio escreve de modo bastante claro: "Na sua essência, religião é o relacionamento com a divindade e não um instrumento para favores terrenos, busca de solução aos problemas econômicos, restabelecimento da própria saúde ou atendimento das aspirações que lhe vêm ao coração". O problema é que essa é "uma verdade incoveniente" de ser dita. Afinal, se o Catolicismo explicasse a todos os seus "fiéis" - tanto aos que vão às suas igrejas e principalmente aos que fazem promessas aos seus santos - que o que devem ter em mente, e no coração, quando pensarem em religião, é aquilo que o arcebispo emérito conceituou, estariam perdidas praticamente todas as "ovelhas do seu rebanho".
A verdade é que todos os católicos que não estudam a teologia, os católicos "populares", em sua simplicidade, querem justamente o oposto do que D. Eugênio disse, ou seja, querem benesses e proteção terrenas em troca de sua devoção.
Outra dessas "verdades inconvenientes" diz respeito ao que D. Eugênio explica em trecho posterior, ao referir-se especificamente ao "anseio por desvendar o futuro", "tentativas de contato com o além" e "práticas mágicas" de um modo geral. Ele escreve: "O progresso da ciência... poderia dar uma direção a essas atitudes... Com os maiores avanços técnicos, convive a busca de soluções em doutrinas que não se coadunam com o nível intelectual de nossos dias". Faltou, entretanto, o nobre arcebispo indicar que a própria religião que ele professa foi - para não dizer que ainda é - um local de embates insanos com "o progresso da ciência" e que este mesmo catolicismo poderia estar listado entre as "doutrinas que não se coadunam com o nível intelectual de nossos dias". Afinal, uma das justificativas cristãs utilizadas para rebater essa possível "cegueira" da ciência já vem lá do profeta Isaías, quando diz "Se não credes, não entendereis". Com isso, foram queimando - metaforicamente... ou não - muitos dos que apresentavam um "nível intelectual" mais próximo dos nossos dias.
Eu achava melhor quando a fé não apelava à razão para se justificar. Mas isso faz muito tempo. Quando São Paulo foi ao Aerópago, tentar explicar cristianismo aos gregos, o "mingau começou a criar caroço". Rsss.

terça-feira, 12 de maio de 2009

100 posts

Puxa vida... o Thiago Neves jogou com a camisa número 100, pelos seus cem jogos no Fluzão, e eu nem comemorei o meu centésimo post aqui.
Então, fica o registro e o agradecimento aos amigos pelos comentários.

segunda-feira, 11 de maio de 2009

Esqueci...

Xiiii... esqueci de parabenizar as mães pelo seu dia. E fico com uma dívida maior porque temos duas colaboradoras que já tornaram um fato o sublime dom da maternidade.
Parabéns, então, Maria e Déia... bem como a todas as outras mamães que passem por este blog.

"Estou me lixando..."

É verdade que foi muito "problemático" saber que o deputado Edmar Moreira tem um castelo de R$ 25 milhões. É verdade, também, que foi muito "embaraçoso" o tal agente público não declarar esse bem, como qualquer cidadão comum tem que fazer. É verdade, ainda, que ser informado que essa mesma autoridade gaste dinheiro público com segurança particular, contratada junto à empresa de sua propriedade, também é bem "complicado".
Não bastasse tudo isso, entretanto, o mais "desagradável" foi assistir ao relator do processo instaurado na Comissão de Ética da Câmara dos Deputados, deputado Sérgio Moraes (PTB - RS), dizer que pensava em encerrar o tal procedimento, antes mesmo de ser julgado. Mas, como o "Inferno Brasileiro" sempre pode ser pior, a tal autoridade, quando inquirida sobre a recepção de sua atitude junto à opinião pública, disse: "Eu estou me lixando para a opinião pública! Até porque, a opinião pública não acredita no que vocês escrevem. Vocês batem, batem e nós nos reelegemos mesmo assim!". O "nobre" deputado fala com experiência, não só no que se refere à imprensa, quanto ao que diz respeito a órgãos governamentais; afinal, responde a oito processos no Supremos Tribunal Federal.
Depois de tanta surpresa de minha parte, ao ler a matéria do jornal O Globo, e reconhecendo que o "Inferno Brasileiro" sempre pode ser pior, só restou a constatação de que o sujeito está correto em pelo menos uma coisa: eles se reelegem mesmo assim.
A única arma para a qual o cidadão comum tem porte livre é o "Título de Eleitor"; mas se, na hora "H", ele atira no próprio pé, só cabe a mim admirar a realidade do mundo político, constatada por um especialista no assunto, como S. Exa., o deputado Sérgio Moraes, de que não sabemos votar.

sexta-feira, 8 de maio de 2009

Mais um curso interessante

Começou, quarta-feira passada, mais um curso interessante na Casa do Saber. Infelizmente, esse, eu não poderei fazer. Antes mesmo de registrar o nome do curso, quero informar o do ilustre mestre, que é o professor Danilo Marcondes. O professor Marcondes é autor de um livro introdutório ótimo, chamado "Iniciação à história da Filosofia - dos pré-socráticos a Wittgenstein". Agora sim, o nome do curso: "O mundo de cabeça para baixo: a formação do pensamento moderno". O modernidade é apresentada como um período de transição entre a tradição e o Humanismo renascentista e a época Contemporânea. E são abordados assuntos como a Descoberta do Novo Mundo, a Revolução Científica e a Reforma Protestante.
Ainda que a época Moderna possa ter uma sua autonomia, não representando apenas uma transição entre duas épocas distintas, eu ainda pensando sobre o quanto é importante entender os períodos de transição. Durante esses períodos, de alguma forma, convivem dois pensamentos e hábitos antagônicos... convivem em tensão, é verdade. Mas eles estão lá, simultaneamente. Vencida por um lado, essa "guerra", por vezes, é desconstruída de nosso imaginário, e tendemos a encontrar uma determinada "batalha" que significa um marco fictício de início desse novo tempo. Esquece-se que aquela "linha" fronteiriça é, na realidade, uma "faixa" larga, em que se parte de um "mais isso e menos aquilo", caminhando-se pela transição, até chegar ao "menos isso e mais aquilo" do outro lado.
O mesmo ocorre com o próprio nascimento da Filosofia, que é colocado como um contraponto radical ao mito, mas, muitas vezes, diminuindo o fato de que muitos dos antigos eram tão "míticos" quanto os próprios referenciais antifilosóficos. Só para ficar num dos muitos exemplos, cito Pitágoras, cuja figura é tão "estranha", que nem se sabe se existiu mesmo, e que cultuava os números como deuses transcendentais.
De qualquer forma, o estudo desse momento de transição é que nos permite apreciar os embates mais vigorosos entre os dois tipos de pensamento - o da tradição e o da revolução, por assim dizer - e que nos coloca no "coração" de cada um deles. No momento onde a tradição está cristalizada, os pensamentos revolucionários ainda são muito incipientes e não desfrutam de um amadurecimento suficiente; e, no momento pós-revolução, o pensamento revolucionário faz de tudo para caricaturar o da tradição, fazendo deste pensamento um mero não-revolucionário, ou seja, imputando ao pensamento da tradição a característica principal de não se "comportar" segundo os ditames do que é atualmente aceito como correto.
Lancemo-nos às transições!

quinta-feira, 7 de maio de 2009

Gripe suína

Nesses tempos de gripe suína, houve logo um pânico em relação à carne de porco e aquelas "adoráveis" linguicinhas. No Egito, trataram logo de eliminar uma vara - viram como eu conheço o coletivo de "porcos"? Rsss. Pouco tempo depois, vários "especialistas" apareceram para explicar que a carne do porco, se bem preparada, não oferecia risco nenhum de contágio ao ser humano. Aliás, diga-se de passagem, a boa preparação da carne suína é aconselhada não só para fugirmos da gripe "porcina" - aha... muitos não sabiam que "porcina" também dizia respeito a porco, hein! Rsss -, como para evitar diversas outras doenças.
Depois disso, repudiamos a ação do Egito, considerando-os ignorantes, e, para salvar a reputação dos simpáticos porquinhos, até se trocou o nome da tal doença para "Gripe H1N1".
Até aqui... tudo bem.
O problema começa quando, hoje, o jornal O Globo publica que o diretor do Departamento de Segurança Alimentar, Zoonoses e Doenças Transmitidas por Alimentos, da Organização Mundial de Saúde, não descarta a possibilidade de transmissão do tal vírus H1N1 através da carne de porco, independentemente do congelamento e do aquecimento durante o preparo.
É verdade que ele fala que "a carne de porcos doentes ou de porcos encontrados mortos" é que "não deve ser processada ou usada para o consumo humano, sob quaisquer circunstâncias", mas como eu não estou lá, acompanhando a criação dos porcos, como é que vou saber se algum deles está usando lenços descartáveis ou tomando medicamentos antigripais?
Pelo sim, pelo não... acho melhor cortar a linguiça do churrasco de domingo que vem!

quarta-feira, 6 de maio de 2009

Derrida

Achei muito bonita a ideia de Derrida sobre a necessidade de uma radicalização dos movimentos que tentam corrigir as polarizações que assumimos no Ocidente. O exemplo dado pelo professor Rafael Haddock-Lobo foi o do par homem-mulher. A sociedade machista supervaloriza o polo masculino e conceitualiza mulher como "aquilo que é não-homem". Aliás, isso é comum nas polarizações - o louco é o não-normal, o bárbaro é o não-educado, etc.
Continuando o exemplo, foi discutido o movimento feminista, que, em meio à defesa dos direitos de um grupo de pessoas, acabou por instituir a troca do polo mais importante para a mulher.
Derrida dizia, então, que a luta das mulheres era importante, mas que não adiantava regozijar-se com as conquistas de empregos iguais, salários iguais, direitos iguais, apenas. Enquanto ainda se precisasse discutir direitos de homens e mulheres, a guerra não estaria vencida. Era necessário, isso sim, que não houvesse mais a discussão comparativa entre homens e mulheres, mas que se falasse apenas de pessoas. O importante é que todos tenham direitos iguais, independentemente de serem homens ou mulheres e negros ou brancos.
Outro fato interessante é que Derrida dizia que ele assinaria qualquer documento de defesa de direitos de pessoas, desde que essa defesa não fosse absorvida por um grupo e virasse um "movimento". Isto porque, ao se transformar em movimento, essa defesa de direitos acabaria por eleger verdades a defender, perdendo-se, então, como uma repolarização da relação, apenas com troca do polo supervalorizado.

terça-feira, 5 de maio de 2009

Foucault e Derrida

Ontem, tive a última aula do curso "O homem - um problema para todos os tempos". O assunto do professor Rafael Haddock-Lobo foi a abordagem de Foucault e Derrida sobre o ser humano.
Eu, particularmente, não conhecia quase nada desses pensadores. Por esse motivo, já imaginava que fosse me colocar como mero ouvinte... uma espécie de esponja, absorvendo cada "migalha" de informação, sem o mínimo senso crítico. Não foi muito diferente disso, mas ainda consegui construir algumas "pontes" com outros pensadores que conhecia um pouco mais, o que possibilitou um mínimo de crítica ao que recebia.
O que me chamou atenção, entretanto, foi a disposição dos ouvintes em geral, que tiveram um comportamento bem parecido com o meu. Fiquei refletindo, então, se já houve um afastamento temporal suficiente para absorção das ideias de pensadores tão próximos de nós, a ponto de eles já terem sido "digeridos" pelos críticos filosóficos e "repassados" para os não-filósofos - como nós, que assistiamos à aula.
Pelo meu desconhecimento prévio, pelo pensamento intricado de ambos e, talvez, também por uma recusa à sistematização nos seus pensamentos, fiquei com a impressão de ter sido simplesmente apresentado aos dois, depois de algumas horas de aula... algo como aquela apresentação em festas, onde se diz "Esse é o fulano-de-tal; ele faz isso e isso! Você sabia que ele tem até um livro, onde fala sobre tal assunto?". E nós "Ah, é?! Que interessante!". Trocam-se algumas palavras sobre o pensamento e depois se fala "Nossa! Que vinho gostoso! Será que é francês ou chileno?".
De qualquer forma, abriu-se uma porta para um pensamento novo. Para quem vê na ética a veia principal a alimentar o corpo filosófico, acho que é uma boa pedida estudar esses que pensaram a importância do outro - como Levinás, Arendt, Foucault e Derrida.
Eu já estou fazendo esse movimento, mas ainda de forma muito lenta, enquanto ainda enfatizo a fase anterior a essa, marcadamente com Heidegger.
Por falar em Heidegger e ética... quero dizer que não deixei passar em branco a "provocação" do Júlio sobre um "resumo" da ética spinozana. Espere aí, que eu faço um post sobre isso.

segunda-feira, 4 de maio de 2009

Parabéns ao Flamengo

Sabendo que temos um amigo flamenguista que acompanha o blog... e educado que sou, como todo bom tricolor, quero parabenizar o Flamengo pela conquista do Campeonato Carioca.
Dói-me o coração, entretanto, registrar que, com esse feito do Fla, a hegemonia tricolor foi superada, e agora quem tem mais títulos no campeonato regional - 31 contra os nossos 30 - é justamente o time rubro-negro.
De qualquer forma, fica o reconhecimento de que o Fla mereceu, principalmente por, mais uma vez, fazer valer o dito de que é um "time de chegada".

sexta-feira, 1 de maio de 2009

Veríssimo historiador

Veríssimo nos conta, ainda no livro "O mundo é bárbaro...", que há uma estória - talvez lendária - que narra a indignação de uma mulher cujas roupas postas para secar no varal, nas cercanias de onde ocorreria a famosa batalha de Waterloo, teriam ficado empoeiradas, por conta da movimentação das tropas, sem perceber que estava ocorrendo ali uma batalha que mudaria a história da Europa.
Depois, Veríssimo nos apresenta as estatísticas de mortalidade entre a população civil na Primeira e Segunda Guerra Mundiais, 5% e 65%, respectivamente. A variação é espantosa, e Luís Fernando Veríssimo indica a causa: o bombardeio de populações civis foi adotado como "legítima" tática militar, para atingir o moral do inimigo.
O autor conclui o texto de forma bastante sensível: "Cada vez que vemos uma das vítimas do terror, como o último cadáver de uma criança judia ou palestina sacrificada naquela guerra especialmente insensata, pensamos de novo nos tempos em que só os soldados morriam nas guerras, e ainda era possível ser um espectador, mesmo distraído como a dona de casa de Waterloo, da história".
Ou seja, o saudosismo vale até para as guerras... Quem diria, hein?