quinta-feira, 28 de março de 2013

Blogs do Além (2)

   Quando eu escrevi sobre o "Blogs do Além", ano passado, reclamei que ainda não havia um blog escrito pelo "espírito" desencarnado - melhor dizer "mente" desencarnada - de Spinoza.
   Atendendo a pedidos dos fãs, acho eu, o "medium" Vitor incorporou o holandês e fez um blog dele.
   Achei o "Blog do Espinosa" mais fraco que muitos outros produzidos pelo Vitor, mas vale a pena conferir. O endereço é http://www.blogsdoalem.com.br/espinoza/

Subliminar

   Quem é o autor do seguinte trecho?
   "Se quisermos ter um entendimento válido de quem somos e, portanto, de como reagiremos a certas situações, temos de entender os motivos de nossas decisões e comportamentos; e, ainda mais fundamental, precisamos entender nossos sentimentos e suas origens. De onde eles vêm?"
   Ok... Poderia ser de muita gente boa! Reconheço. Mas tem bem a cara do nosso querido Spinoza, não é?!
   Entretanto, o trecho é do capítulo nove, "Sentimentos", do livro Subliminar - Como o inconsciente influencia nossas vidas, de Leonard Mlodinow (mesmo autor de O Andar do Bêbado), lançado pela Editora Zahar, agora, em 2013.
   Eu comprei o livro, fundamentalmente, por causa desse capítulo, mas parece ser um trabalho bastante interessante.
   Depois, eu comento mais.

Nietzsche e a "segunda natureza"

   Meu entendimento sobre a proposta spinozana de nos libertarmos da "escravidão de nossas paixões" é de que ele entende que devemos nos modificar o suficiente para que determinados sentimentos que nos submetem, e que, portanto, nos fazem agir de uma forma que não é saudável para nós mesmos, percam esta força. De certo modo, o que acontece é que se desenvolve em nós uma alteração na nossa própria "natureza" - ou, como diria a ética aristotélica, no nosso "caráter".
   Curiosamente, esse meu modo de entender a proposta spinozana não é declarada tão explicitamente assim pelo holandês, mas aparece "com todas as letras" na Segunda consideração intempestiva (1874), de Nietzsche.
   O bigodudo escreve:
   "Pois porque somos o resultado de gerações anteriores, também somos o resultado de suas aberrações, paixões e erros, mesmo de seus crimes; não é possível se libertar totalmente desta cadeia. Se condenamos aquelas aberrações e nos consideramos desobrigados com relação a elas, então o fato de provirmos delas não é afetado. O melhor que podemos fazer é confrontar a natureza herdada e hereditária com o nosso conhecimento, combater através de uma nova disciplina rigorosa o que foi trazido de muito longe e o que foi herdado, implantando um novo hábito, um novo instinto, uma segunda natureza, de modo que a primeira natureza se debilite".
   É interessante perceber que a proposta nietzscheana vai além do "novo hábito" aristotélico, criando até mesmo um "novo instinto" - algo mais fundamental, mais primário - e uma nova natureza. Se não fosse um antiessencialista, Nietzsche teria escrito "uma segunda essência".
   Muitas vezes penso que, se Nietzsche continuasse estudando Spinoza, ele seria um bom spinozano! Rsss.

Atualizando nossa lista de amigos

   Eu sempre procurei receber bem nossos novos "amigos dos amigos". Entretanto, desde que nos tornamos 78, não fazia uma recepção formal aos que cá chegavam.
   Assumo minha total culpa por esse lamentável fato. A única "desculpa" a apresentar é que a própria atualização do blog tem sido "espasmódica" - dá-se um espasmo... quero dizer, uma atualização agora, e depois ficamos muito tempo sem outra. Com essas passagens rápidas, a intenção de acolher os novos amigos ficava sempre deixada para depois.
   Não posso, entretanto, deixar de fazê-lo agora. Não só pelo fato de que já somos 84, mas também porque recebemos a visita de alguém que já foi várias vezes citado por aqui, o professor Paulo Ghiraldelli Jr., que muito admiro.
   Então, reforçando meu pedido de desculpas, agradeço a todos pela carinhosa adesão ao grupo de "amigos dos amigos" de Spinoza. 
Ficarei orgulhoso se, sentindo-se totalmente à vontade neste nosso espaço, os novos amigos Marcello Bax, Valdemar Habitzreuter, Diogo Borges e Ângela - além do próprio professor Ghiraldelli, obviamente - quiserem registrar aqui seus pontos de vista sob o que foi postado... ou até sobre o que não foi.
   Espero, verdadeiramente, que possam encontrar alguma reflexão interessante no meio desse "caos semiorganizado" que é este blog.
   Grande abraço a todos. Sejam bem vindos.
    

Jacob Burckhardt (3)

   Desculpem-me da insistência no Sr. Burckhardt, mas eu não poderia perder a oportunidade de assinalar uma última coisa em relação a ele, que só aumenta minha simpatia.
   Ainda da Introdução de Peter Burke:
   "Ao contrário de muitos historiadores praticantes, Burckhardt não era filosoficamente iletrado. A despeito de alegar-se inepto para a especulação e o pensamento abstrato, estava bastante familiarizado com as ideias de Hegel e Schopenhauer, bem como com as do jovem Nietzsche, com quem costumava sair a passear e discutir ideias".
    Essa passagem demonstra que o pensador maduro Burckhardt conseguia "trafegar" pelos caminhos da Filosofia. Certamente isso é muito interessante, mas o que me chamou mais atenção foi outra passagem da Introdução, que narra uma opinião mais "juvenil" do historiador suiço.
   "Ainda estudante da Universidade de Berlim, expressou por escrito seu pesar pelo fato de que a filosofia da história fosse ensinada por seguidores de Hegel, 'a quem sou incapaz de entender'".
   Senti-me feliz por compartilhar, com alguém tão importante para a História do pensamento humano, essa "incapacidade de entender Hegel".
   Ufa... Que alívio! Não sou só eu. Rsss

Jacob Burckhardt (2)

   Somente lendo sobre Burckhardt - ainda na Introdução, escrita por Peter Burke, ao A cultura do Renascimento na Itália - é que entendi completamente porque nossa "amiga dos amigos" Maria é tão apaixonada por História.
    Vejamos o que Burke conta:
    "Sua [de Burckhardt] postura estava tão distante do positivismo quanto de Hegel. Enquanto os positivistas viam a história como uma ciência e a atividade do historiador como uma coleta de 'fatos' retirados dos documentos e o relato 'objetivo', segundo eles, do que 'efetivamente' acontecera, Burckhardt via a história como uma arte. Para ele, esta era uma modalidade da literatura imaginativa, aparentada à poesia".
   Conhecendo a paixão de nossa amiga pela poesia, e sabendo que um historiador como Burckhardt consegue aproximar História e Poesia, compreendi tudo.

terça-feira, 26 de março de 2013

O Português da argentina

Por conta de uma "rivalidade" que existe entre Brasil e Argentina - não sei se proveniente do futebol, tendo contaminado o resto; ou se proveniente de todo o resto, tendo contaminado o futebol -, muitos brasileiros se sentiram humilhados com a escolha de um papa argentino. O apelo ao número de católicos - nem tão católicos assim, admitamos! - brasileiros em comparação ao de argentinos parecia ser suficiente para determinar a escolha de um papa do Brasil, como primeiro representante das Américas no trono de Pedro, em vez de um "hermano".
   Sinceramente, a escolha de um argentino não mudou em nada a minha vida. Particularmente, até acho esse papa muito simpático. É certo que isso não basta para ser o líder de uma religião culturalmente tão importante para o Ocidente como é o cristianismo... mas já é um bom começo.
   O que me espantou, entretanto, foi outra notícia relacionada à Argentina: "Argentina leva prêmio de língua portuguesa".
   Espera aí! Assim é demais! Mas o pior é ser verdade.
   O fato é que a argentina Martina Mizraje, de 17 anos, estudante do St. Francis College, em São Paulo ganhou o prêmio da Cambridge International Examinations por conta da nota máxima em prova de proficiência em língua portuguesa. 
   Se o concurso fosse só para estrangeiros, eu até aceitaria tranquilamente uma moça argentina receber o prêmio, mas o que chama atenção é que ela enfrentou brasileiros e portugueses. Ou seja, uma argentina sabe mais Português do que nós brasileiros - que, realmente às vezes, maltratamos nossa língua mãe -, mas também mais do que os próprios "donos" do idioma.
   Só falta, agora, a Argentina ganhar a Copa de 2014, aqui dentro do Brasil!

quarta-feira, 13 de março de 2013

Jacob Burckhardt

     Uma leitura leva à outra.   
  Lendo as considerações nietzscheanas a respeito da História, chega-se ao nome de Jacob Burckhardt (1818-1897), historiador - e pensador da História -, que conviveu com Nietzsche.
   Aliás, a Introdução escrita por Peter Burke ao famosíssimo livro A cultura do Renascimento na Itália, publicado no Brasil pela Companhia das Letras, em 2009, registra que: "O professor [Burckhardt] impressionou até mesmo um jovem aluno de 24 anos, Nietzsche, que, segundo ele próprio escreveu, somente ao ouvir Burckhardt falar sobre 'Os grandes homens na história' sentiu, pela primeira vez na vida, prazer em assistir a uma aula". 
   Vindo de Nietzsche, isso não é pouca coisa, não!!!


Esquecimento e Recalque

   A Segunda Consideração Intempestiva - Da utilidade e desvantagens da História para a vida, de Nietzsche, faz uma crítica da cultura de seu tempo, a partir do que o bigodudo chama de "historische krankheit" (doença histórica).
   Segundo o filósofo alemão, o "excesso de história", ou seja, supervalorição do conhecimento histórico acaba por "sufocar" a criatividade do vivente, que fica como que impotente em presença da grande carga que o passado e a tradição lhe impõem.
   Sem poder agir, o homem se imobiliza... e o critério nietzscheano para determinar se a História está sendo vantajosa, que é a vida, perde vigor, estabelecendo a "condenação" momentânea da "Historie".
    O texto é muito rico. A História, nele, não é um monolito, criticado tresloucadamente. Haverá espécies de História, cada uma delas tendo suas utilidades e desvantagens.
   De qualquer forma, esse não é um post sobre a Segunda Intempestiva como um todo, mas apenas sobre uma pequena passagem que diz respeito ao conceito nietzscheano de "Esquecimento". Só a partir dessa atividade é que o vivente se livraria do peso do passado, o qual impedia suas ações. Trata-se, portanto, de uma necessidade de um "espaço a-histórico", mesmo sendo reconhecido que o homem é um ser histórico.
   O comentador Günter Figal, no livro Nietzsche - Uma introdução filosófica, publicado no Brasil pela Mauad-X, escreve: "'todo vivente', diz Nietzsche, 'só pode tornar-se saudável, forte e frutífero no interior de um horizonte'; O QUE NÃO CONSEGUE SUBJUGAR PRECISA SER ESQUECIDO, e, então, ele não 'está mais aí'".
   Quem não lembra do conceito de "Recalque" freudiano, lendo isso?