sexta-feira, 10 de maio de 2013

O "vulgo" é algo a ser temido

   Spinoza, como Machiavelli, é um grande cientista social... talvez, por ambos entenderem muito bem a psicologia humana.
   Na Parte IV da Ética, proposição 37, escólio 2, Spinoza fala do Estado - na verdade, o assunto começa um pouco antes, mas a indicação direta e formal acontece aí. E depois continua tratando dessa associação dos homens em comunidade - tudo, sob a perspectiva da força das paixões.
   Na proposição 54, escólio, aparece uma passagem que poderia, facilmente, passar como machiavellina, que corresponde ao controle que se faz sobre a "multidão" - ou o "vulgo", nos termos de   Spinoza. Esse "controle" se faz necessário visto que, como nos diz o holandês, "Terret vulgus, nisi metuat".
   Escreve Spinoza:
   "Como os homens raramente vivem sob o ditame da razão, esses dois afetos, quer dizer, a humildade e o arrependimento [que não são virtudes, para Spinoza], assim como a esperança e o medo, trazem mais vantagens que desvantagens. Portanto, se pecar for inevitável, é preferível que se peque por esse lado. Com efeito, se os homens de ânimo impotente fossem, todos, igualmente soberbos, se não se envergonhassem de nada, nem tivessem medo de coisa alguma, como poderiam ser unidos e estreitados por quaisquer vínculos? O vulgo, se não tem medo, é algo a ser temido. Não é de admirar, por isso, que os profetas, que visavam não a utilidade de uns poucos, mas a utilidade comum, tenham recomendado tanto a humildade, o arrependimento e a reverência. Na verdade, os que estão tomados desses afetos podem ser muito mais facilmente conduzidos que os demais a viver, finalmente, sob a condução da razão, isto é, a serem livres e a desfrutarem de uma vida de beatitude".
   Spinoza mostra uma espécie "benevolente" de manipulação, pelos profetas, sobre o "vulgo". Mas é interessante perceber que essa ideia permanece presente, ainda hoje, com vistas a planos bem menos preocupados com um desfrute de uma vida mais livre por parte destes que são "conduzidos" pela "humildade, arrependimento, reverência, medo e esperança".