sexta-feira, 13 de abril de 2012

"Torna-te o que tu és"

   Essa é a famosa frase de Píndaro, poeta grego que viveu na passagem do século VI para o V aC. A frase, com pequenas variações, é muito usada como forma de encorajamento. Algo do tipo: tenha a coragem de fazer o que deve ser feito por você mesmo! Vá em frente!
   Apesar de não fazê-lo no sentido citado acima, eu mesmo já comentei a frase aqui no blog... pelo menos, penso que sim. Rsss.
   O que me faz escrever, hoje, entretanto, é registrar o quanto, muitas vezes, perdemos as circunstâncias em que se diz algo, deixando de compreender o real sentido da sentença. Em alguma medida, penso que isso acontece com essa frase de Píndaro.
   Senão vejamos. Completemos, inicialmente, a frase escrita nas Píticas II: "Torna-te o que tu és, compreendendo".
   Depois, expliquemos que "compreendendo", no grego de Píndaro, diz respeito ao verbo "manthanein", e não "didaskein". Há grande diferença entre um e outro. O primeiro designa a apreensão de um saber técnico, que tem como fonte exclusivamente o exterior, e que pode ser compreendido por um homem qualquer que seja sua natureza. Já o segundo, do qual Píndaro faz uso, evoca a apreensão de algo que, embora sendo fruto de uma paideia, isto é, de uma educação formadora, só pode repercutir em homens de determinada natureza, uma natureza nobre.
   Píndaro é defensor da ideia de que a nobreza de caráter é uma questão de sangue. Segue-o nesta ideia outro poeta, seu contemporâneo, Teógnis, quando afirma que "Nunca, ensinando, farás de um vilão um homem de bem". E não o farás, diria eu, porque as virtudes não pertencem ao gênero do que pode ser apreendido pelo ensino que diz respeito ao didaskein, mas tão somente por aquele ensino que amadurecerá conteúdos do próprio homem de bem, o qual diria respeito ao manthanein.
(Fonte: VERGNIÉRES, Solange. Ética e Política em Aristóteles - physis, ethos, nomos. São Paulo: Paulus, 2008)

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