terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

E por falar em "sujeito"

   No post anterior, o título do livro comentado tinha a palavra "sujeito". Não por acaso, após a leitura do livro em questão, continuei seguindo o fio da meada e retomei uma leitura brevemente iniciada a algum tempo, mas suspensa por questões técnicas - no caso, uma deficiência teórica em aspectos específicos da doutrina psicanalítica. 
    Diminuída minha ignorância - obviamente, não encerrada, mas pelo menos já "diminuída", como disse - no tocante a "arte" de Herr Freud, pude prosseguir mais tranquilamente minha leitura. Trata-se de um livro pequeno, mas que gostei muito, chamado "O conceito de sujeito", de Luciano Elia, pós-doc pela PUC-Rio e coordenador do mestrado em Psicanálise na Uerj - pelo menos, à época em que o livro foi lançado.
   Como não poderia deixar de ser, o texto começa dialogando com a Filosofia Moderna, "criadora" do conceito de "sujeito", para chegar efetivamente à análise psicanalítica deste "sujeito" - que, aí, já não é mais considerado "conceito".
   Interessante consideração feita pelo autor no que se refere à passagem do Tratamento Catártico à Psicanálise é a seguinte:
   "Ao abandonar a hipnose, Freud decidiu tomar para si a complexa problemática do sujeito. Podemos dizer que na hipnose, tanto quanto na ciência ou na medicina, não há sujeito. O saber sobre o sintoma e suas causas, tal como é comunicado sob hipnose, não será apropriado pelo sujeito mas pelo hipnotizador [...] Ao abandonar a hipnose e instituir a associação livre, portanto, Freud se dirige ao sujeito, supondo que há alguma saber do lado do sujeito, e que os elementos inconscientes (os significantes recalcados nas cadeias do inconsciente) que constituem este saber, ao emergirem na e pelas falhas da fala desse sujeito, estarão, no mesmo ato, supondo o sujeito por eles representado".
   A Linguagem é tratada com bastante clareza. E se destaca a "sutil" diferença entre "campo da linguagem" e "função da fala", que Filosofia da Linguagem insiste em separar, mas que o senso comum teima em identificar.
   Eu não poderia deixar de registrar, entretanto, a aparição de nosso querido Spinoza no texto, quando o autor fala da "transferência".
   O texto diz:
   "A psicanálise estabelece que o modo pelo qual a transferência se formula deve [...] ser chamado amor. Não se trata aqui de entender o amor em sua configuração restrita de amor voltado para a satisfação sexual entre parceiros, que é apenas uma de suas formas, mas como o conjunto de todas as manifestações de afeto. [...] O termo afeto deve aqui ser diferenciado do termo 'sentimento', que já inclui as significações que o sujeito constrói daquilo que o afeta, e que portanto o mascaram e encobrem. Afeto é portanto o que afeta o sujeito por uma via significante, é claro (como ocorre aliás com tudo o que o afeta), mas sem a mediação das significações, e nesse aspecto se aproxima mais do sentido que 'afeto' tem em Spinoza (as paixões e afecções) do que em uma psicologia dos afetos".
   Interessante, também, registrar - o que já fiz em outras oportunidades, aqui no blog - que "afeto", em Spinoza, não se vê bem traduzido por "sentimento". Aliás, como o autor do livro deixa claro, o "sentimento" já teria uma "mediação das significações", o que não pertence ao sentido de "afeto".

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