terça-feira, 27 de novembro de 2012

O sujeito

   Qualquer manual de Filosofia registra que a "subjetividade" é uma categoria que pertence à Modernidade. Insiste-se em dizer que, não diz respeito à Filosofia Clássica tratar do "sujeito"; que o "indivíduo" era absorvido pelas considerações da polis, etc. e tal. Tudo lido e absorvido por um bom aluno - no caso, eu - fica a seguinte pergunta heterodoxa: É mesmo assim?
   Outra informação dos manuais parece contradizer essa: quando se trata das filosofias helenistas, diz-se claramente que, esgotado o modelo da polis, essas filosofias fizeram o homem olhar para dentro de si, buscando sua liberdade em seu interior, e não mais no meio social, exterior a ele mesmo. Ora, essa dimensão interior já não tinha ares de "sujeito", de "eu"?
   É certo que se admite, em alguma medida, que Santo Agostinho, ao propor o seu próprio cogito, teria abordado a questão da subjetividade. Isto também está nos manuais.
   Depois, lemos - ainda nos mesmos manuais - que Montaigne inclui o "eu" na sua filosofia, inaugurando um modelo - inclusive de escrita, com os Ensaios. 
   Mas eu pergunto, ainda que ouvindo ecos das respostas que me foram dadas sobre o "anacronismo de lançar categorias posteriores sobre pensamentos anteriores": É possível ler Ética a Nicômaco, ignorando a dimensão da subjetividade que há ali? Será essa uma leitura completamente honesta?
   É lógico que ir contra uma "verdade estabelecida" é meio complicado. Para isso, há que se ter cuidado, passeando pelos textos  e revirando-os, a fim de verificar se a tese contrária a da "tradição" tem algum fundamento factual.
   Em certa medida é o que tenho feito, estabelecendo uma certa prioridade a esse assunto em minha pesquisa atual. É verdade que estou "contaminado" com a "falta de ingenuidade" de quem já leu Freud - o que pode ser considerado um problema para os "puristas" da Filosofia. Mas eu não quero simplesmente "enfiar" o sujeito freudiano na Filosofia; quero, sim, entender o sujeito, considerando também a possibilidade de utilizar ferramentas disponíveis fora do mundo considerado estritamente filosófico.
    Mas não quero começar por aí. Quero iniciar identificando na Antiguidade a presença da subjetividade... e não simplesmente do indivíduo ou da pessoa.
   No livro A Consciência - do Corpo ao Sujeito, de André Simha, em um trecho onde ele trata da "questão moderna do sujeito", há uma passagem que diz "Não se deve subestimar, porém, a riqueza das análises psicológicas produzidas pela filosofia do agir ético dos filósofos antigos (Platão, Aristóteles, os estoicos particularmente)". Embora ele diga, logo em seguida, que há uma perspectiva diferente sobre esse assunto, naquela época: "Mas essas análises dependem de uma antropologia filosófica determinada pela situação cósmica e política da alma".
   Obviamente, há que ser consideradas as circunstâncias filosóficas - e mesmo culturais - de cada tempo, mas que há, pelo menos, "indícios" de que, ainda que em gérmen, o conceito de "sujeito" já me parece pertencer à Filosofia Ocidental há muito, isso parece.
   Três livros que parecem ajudar a pesquisa são Breve História da Alma, de Luca Vanzago; A fragmentação da cultura e o fim do sujeito, de Rogério M. de Almeida, e Metamorfoses do sujeito, de Edouard Delruelle. Os dois primeiros são publicados no Brasil, pela Edições Loyola; enquanto o último português, do Instituto Piaget.
   Quem quiser colaborar com a questão...

15 comentários:

Anônimo disse...

Os outros dois livros, ainda não os li. Li, porém, "A fragmentação da cultura e o fim do sujeito", de Rogério Miranda de Almeida, e vi, de fato, que o autor deste blog, Ricardo, pode achar nesta obra um suporte para corroborar a tese de que a questão da subjetividade e do sujeito já se acha, de certa forma, na antiguidade e na Idade Média.

Anônimo disse...

Excelente obra, "A fragmentação da cultura e o fim do sujeito", do filósofo e teólogo Rogério Miranda de Almeida. Lendo este livro, adquiri outra ideia da pós-modernidade e da questão da subjetividade, conforme fala o Ricardo no seu blog. Recomendo vivamente esta obra.

Ricardo disse...

Aos "dois" anônimos:
Agradeço à confirmação de que fiz uma boa escolha de leitura. Agora é só efetivamente iniciá-la.
Abração.

Bruno de Oliveira disse...

Oh, Ricardo. Eu vi numa palestra - essa aqui, ó: http://vimeo.com/10348233 - o professor citando Foucault como um estudioso desse tema da subjetividade na antiguidade. Não sei quais são os livros específicos em que isso seria abordado, porém, pois nunca li Foucault. Mas talvez seja uma boa fonte para se procurar.

Anônimo disse...

Para o filósofo, teólogo e escritor, Rogério Miranda de Almeida, autor de "A fragmentação da cultura e o fim do sujeito", a questão do sujeito se acha colocada, através da escrita e da significação, em todas as fases do pensamento ocidental. E isso desde os pré-socráticos e, principalmente, a partir da filosofia de Nietzsche. É o que ele tenta esclarecer ao longo de seu último livro, acima citado.

Ricardo disse...

Oi, Bruno.
Só conheço diretamente as duas primeiras "fases" de Foucault - a Arqueologia e a Genealogia. Sei, entretanto, que ele tratou da questão do cuidado de si, em seus últimos escritos. Certamente, é aí que se encontra a questão da subjetividade... se bem que há, já antes, a questão da "construção externa" do sujeito, através das técnicas de vigilância e atuação sobre o corpo. Mas as duas primeiras fases avaliam somente um recorte de tempo menos afastado, lá pela Modernidade. Então, no que se refere à Antiguidade, só pode estar realmente na última fase.
Valeu pela lembrança.
Grande abraço.

Ricardo disse...

Nosso amigo "anônimo" só me inspira mais desejo de começar a ler logo o livro do Rogério de Almeida.
Abração.

Anônimo disse...

Alô, Ricardo.

Se você está curioso para ler o livro de Rogério Miranda de Almeida ("A fragmentação da cultura e o fim do sujeito", edições Loyola, 2012), ele fala também de Foucault, embora de maneira não sistemática, no Capítulo IV da obra, capítulo este que se intitula: "Moderno-Pósmoderno". Leia-o. É realmente um livro rico e instigante.

Anônimo disse...

Eu também recomendo a leitura deste livro, "A fragmentação da cultura e o fim do sujeito", de Rogério Miranda de Almeida. No meu entender, esta obra conseguiu ir no cerne da questão da subjetividade, do sujeito e da cultura. Vale a pena de ser lida pela sua riqueza de análise e pela beleza de escrita.

Anônimo disse...

Este livro de Rogério Miranda de Almeida, "A fragmentação da cultura e o fim do sujeito", é a obra de que, há anos, o Brasil estava carecendo. Agora saímos todos enriquecidos com esta análise sutil e cheia de erudição em torno não somente da cultura ocidental, mas também da subjetividade e, particularmente, do fim do sujeito. É o livro que eu recomendo a todos.

Anônimo disse...

Rogério Miranda de Almeida, autor de "A fragmentação da cultura e o fim do sujeito", tem uma página na internet com a apresentação de sua biografia, seus escritos e suas ideias. Não deixem de curti-la.

Anônimo disse...

Eu curti a página de Rogério Miranda de Almeida, rica de informações e de conteúdo. Uma verdadeira reflexão. Curta você também que ainda não curtiu.

Anônimo disse...

Que maravilha! É através de blogs como este, "Spinoza e amigos", que tomamos conhecimento de um filósofo, teólogo e escritor do porte de Rogério Miranda de Almeida. Já li e reli dois de seus livros: "Eros e Tânatos: A vida, a morte, o desejo", e o último: "A fragmentação da cultura e o fim do sujeito".

Anônimo disse...

Eu também, como uma fã número um do escritor Rogério Miranda de Almeida, li não somente seus dois últimos livros, mas também "Nietzsche e o paradoxo" e "Nietzsche e Freud: Eterno retorno e compulsão à repetição". Recomendo-os a todos. Imperdíveis! Parabéns ao blog Spinoza e Amigos.

Anônimo disse...

Os comentadores deste blog, "Spinoza e amigos", fazem bem em destacar o último livro de Rogério Miranda de Almeida, "A fragmentação da cultura e o fim do sujeito", porque, como o título já sugere, é uma excelente fonte de reflexão e de conhecimento da história da cultura do Ocidente.