Aqui em casa houve uma tempestade, um terremoto, um furacão no quesito "saúde". Mas, ao que parece, estamos em período de bonança, agora. Para comemorar o retorno à tranquilidade, vamos de post novo.
Esses dias estive vendo algumas vídeo-aulas. A primeira delas foi do sempre polêmico Olavo de Carvalho - que, aliás, deixou de escrever para o Jornal do Brasil não sei por quê. O título prometia: Husserl. Fiquei imaginando que veria uma super-aula sobre a Fenomenologia de Husserl... mas me decepcionei bastante. Metade do tempo é dedicado a Husserl, mas parece que o Olavo pretendia mesmo era falar mal do ateísmo de Richard Dawkins - o que não dá para entender, já que um assunto não tem nada a ver com outro. É bem verdade que Dawkins não teria muitos argumentos contra um filósofo "profissional", já que suas teses, no campo filosófico, são "requentadas". De qualquer forma, a defesa que faz de sua "intuição" científica, aplicada ao campo filosófico, é interessante e, parece-me, mereceria um tratamento mais respeitoso por parte do inteligente Olavo de Carvalho. Nesse ponto, infelizmente, acho que sua crença católica atrapalha um pouco sua abordagem do problema.
No contraponto dessa vídeo-aula, assisti aos dois DVDs do professor Paulo Ghiraldelli Jr., da coleção "Filósofos essenciais". Tudo é diferente. Em vez da filmagem de um curso ministrado, como no DVD de Olavo de Carvalho, o vídeo do professor Ghiraldelli Jr. apresenta uma espécie de entrevista deste a uma jornalista. As perguntas são formuladas para que se atinja um objetivo específico, previamente elaborado pelo professor. O tom de Ghiraldelli Jr. é muito mais "suave" que o de Olavo e, embora com conteúdo mais básico, acho que os objetivos de Ghiraldelli Jr. são mais bem alcançados que os de Olavo... até porque, especificamente nesta aula sobre Husserl, parece que o pensamento do filósofo alemão é secundário em relação à polêmica sobre o ateísmo de Dawkins.
O primeiro DVD "Filósofos essenciais" trata de Sócrates, Platão, Aristóteles, Epicuro e Santo Agostinho; enquanto o segundo apresenta Descartes, Kant, Schopenhauer, Marx, Nietzsche e Wittgenstein. Apesar da qualidade de ambos, gostei mais do segundo. Duas críticas seriam que o pensamento de Kant é muito levado para o aspecto moral - apagando um pouco o brilho de suas considerações epistemológicas - e que Marx é considerado um filósofo que voltou para a "estante" após a ruína da União Soviética - sem se comentar o seu "retorno", quando da atual crise americana... não sei se o vídeo teria sido produzido antes desse acontecimento.
De qualquer forma, as explicações são bem encaminhadas pelo repertório de perguntas da jornalista. Mesmo com a minha crítica à apresentação de Marx, o conteúdo é muito bom. Ghiraldelli Jr. responde à pergunta sobre o que teria perdido o sentido no pensamento de Marx e sobre o que ainda seria pertinente. Sobre o que seria sem sentido, Ghiraldelli Jr. fala sobre imaginar que seria possível um controle absoluto do mercado pelo Estado. Destaca, inclusive, que a perda de liberdade do mercado corresponde a uma perda de liberdade política por parte do povo; ou seja, não se conseguiu uma democracia nos moldes marxistas de pensar. Com toda lucidez, entretanto, o professor indica que a aplicação de um sistema filosófico teórico à prática política de um país pode apresentar "defeitos" que não estavam originalmente no modelo teórico e que Marx teria sido um dos poucos filósofos a ter instituída uma práxis da sua teoria... arriscando-se mais do que outros pensadores meramente especulativos.
Já sobre o que ainda é "atual", Ghiraldelli Jr. fala da "reificação" do ser-humano, diante do comando do mercado e das mercadorias. Ele dá um exemplo interessante, principalmente para o mundo feminino. Diz que a mulher vê uma calça linda na vitrine de uma loja; entra; experimenta o modelo e constata que seu manequim não se adequa à calça. Indica Ghiraldelli que a calça dá uma ordem à moça: "Vá; faça uma dieta e volte aqui!". Ele explica que as coisas "falam" conosco, tornando-nos as verdadeiras "coisas" na relação. Somos, então, manobrados pelo mercado... o que Marx já teria constatado no incipiente capitalismo que se desenhava em sua época.
Nietzsche também é bem apresentado, bem como a "filtragem" de suas ideias por sua irmã, e o pensamento de Wittgenstein é comentado em relação aos seus dois períodos, de forma bem ilustrada. Destaca, inclusive, Ghiraldelli Jr. que, quanto ao austríaco, não há necessidade de se "dividir" seu pensamento em fases, pois ele mesmo já o faz para nós.
Vale a pena conferir as vídeo-aulas de Ghiraldelli, que são vendidas nas bancas de jornais, pela simpatia com que ele nos apresenta os pensadores em questão.