terça-feira, 18 de junho de 2019

Telegram lavando a Lava Jato


   Assunto tremendamente em alta no momento é a questão da apresentação da interceptação de mensagens trocadas entre membros do Judiciário e do Ministério Público Federal - notadamente o então juiz Sérgio Moro, hoje ministro, e o procurador Deltan Dallagnol -, através do aplicativo Telegram, no período em que o processo do ex-presidente Lula evoluía.
   A partir da divulgação dos diálogos, pelo site The Intercept, gerou-se uma confusão bastante grande de opiniões. Legisladores consultados viram uma possível ilegalidade na conversa entre acusador e juiz, visto que haveria um concerto entre ambos, principalmente para possibilitar uma melhor estratégia de obtenção de provas para condenação dos implicados em casos de corrupção investigados pela Operação Lava Jato. Moro e Dallagnol, ainda sem confirmar a veracidade dos diálogos, insistem que não há nada de ilegal em conversarem durante o processo. O procurador demonstra a imparcialidade do juiz mostrando que houve diversos momentos em que o Judiciário negou pedidos do MPF. Quem está alinhado com eles registra que, em casos tão grandiosos quanto este, há que atacar pesadamente os infratores, mesmo que isso implique uma "flexibilização" nas regras ortodoxas de atuação.
   Há defensores de um lado e de outro. Particularmente, gostei da análise de Rogério Arantes, professor da USP, doutor em Ciência Política, publicada na revista Época, de 17/06/19. Gostaria de destacar apenas dois parágrafos do excelente texto.
   "O que distingue a Lava Jato [...] é que ela teve o êxito de promover uma nova forma de triangulação no interior do sistema de Justiça Criminal e de perfilar todas as instâncias jurídicas na mesma direção. Entretanto, parece cada vez mais claro que a operação foi desenhada para alcançar um determinado alvo, e nisso reside sua principal fragilidade e extravagância [...]. Ao se colocar um objetivo predefinido, a Lava Jato tornou-se uma operação tecnicamente política. Aqui se trata, na verdade, da clássica separação entre Justiça e política, que pode ser pensada a partir da relação entre meios e fins. Política é ação com relação a resultados, e os meios são escolhidos de acordo com os objetivos que se quer alcançar. Assim é que a política se legitima pelos fins que alcança, e os meios podem ser até controversos sob a ótica da moral comum, como nos ensinou o pai da política moderna, Maquiavel. A Justiça, por sua vez, legitima-se pelos meios que adota para a tomada da decisão. Mais importante que o resultado é o devido respeito ao processo legal. Da Justiça se pode dizer, em suma, que se legitima pelo procedimento".
   É uma discussão que deve ir longe, porque todos - pelo menos os que não estão implicados na Lava Jato - querem que a corrupção seja, na medida do possível, extinta nos órgãos superiores de decisão no Brasil. Contudo, para o bem do nosso Estado de Direito, não se quer abrir mão da legalidade dos procedimentos pelas diversas instituições. 
   Ainda Rogério Abrantes apresenta estas duas posições, quando diz:
   "na prática [...], esse mesmo modelo [a Polícia investiga, o Ministério Público acusa e o Judiciário julga] sempre fora acusado de ser a causa da impunidade. A interação entre essas instituições, historicamente marcada pela desconfiança recíproca e pelas críticas de incompetência e morosidade de lado a lado, comprometeria a eficácia de suas ações"; e
   "Quem prega mãos limpas não pode sujar as suas, mesmo que em nome de excepcionais objetivos".
   Vamos acompanhar os próximos passos para saber o que vai acontecer.

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