sexta-feira, 25 de dezembro de 2020

Racismos (2)

    Dois casos de "racismo" (entre aspas, provocativamente) recentes me chamaram atenção: o primeiro, de João Alberto Silveira Freitas - morto no supermercado Carrefour -; e o segundo, do jogador Gérson, do Flamengo-RJ.

    Gosto pouco de falar de casos muito recentes, por conta das fortes emoções que ainda estão presentes, dificultando uma crítica mais perfeita. Mesmo assim, vamos lá.

   Sinceramente, tenho dúvidas se os casos citados realmente caracterizam "racismo", no sentido em que está sendo discutido na grande mídia.

   Discutirei um caso de cada vez.

    Primeiro caso. Um homem - negro, sim - é espancado brutalmente até a morte. Não sou jurista, mas não tenho dúvidas de que foi um homicídio qualificado. Minha incerteza está no fato de ele ter sido morto POR ser negro. Não questiono que seja possível ter havido racismo até o ponto em que João Alberto foi conduzido para fora da área efetivamente comercial do supermercado. Pelos vídeos divulgados, parece haver um desentendimento entre a vítima e uma funcionária, no interior da loja - o que, reconheço, já pode ter sido fruto de alguma prática racista -; posteriormente, há a observação de João Alberto por outro funcionário; e, por fim, o acompanhamento da vítima por seguranças do supermercado ao longo de um corredor. Volto a reconhecer que, durante esse trajeto, pode ter ocorrido práticas racistas, com ofensas, ameaças, etc. Em determinado ponto, contudo, João Alberto desfere um soco em um dos seguranças. Aí, penso, a coisa muda de figura. Desse evento em diante, imagino que falar de "racismo" pode ser um tanto quanto inadequado. Afinal, ao ser agredido com um soco, o segurança - policial militar de folga - , ensandecido, passa às cenas de barbárie que ficaram registradas em nossa mente, levando à morte de João Alberto.

   Voltemos um pouco. Em momento algum, estou afirmando que não houve racismo, ou seja, uma ação deliberada de tratar um indivíduo de maneira injusta pelo fato de ele ser negro. A única coisa que estou dizendo é que não posso assegurar que o motivo do homicídio foi o fato de o rapaz ser negro, como está sendo seguidamente informado pela grande mídia.

   Obviamente, o segurança/policial tem que ser punido pelo homicídio. Afinal, a agressão sofrida na forma de um soco não poderia justificar um homicídio, principalmente quando se trata de alguém que deveria estar preparado para neutralizar um agressor... menos ainda quando observamos que havia dois seguranças para neutralizar a ameaça na forma de um único indivíduo desarmado.

   A questão do crime de racismo, contudo, tem que ser melhor investigada... para ser punida com justiça, caso efetivamente tenha ocorrido.  

   Resumindo, então: só acho que o assassinato não se deu exata e especificamente por racismo.

   Depois, veremos o segundo caso...

Racismo e o "lugar de fala"

 

       Falemos da questão do "lugar de fala" de uma pessoa que sofre preconceito racial na maioria dos momentos, locais e grupos sociais que frequenta, que certamente não é meu locus. Mas, sinceramente, acho que, como alguém que exercita uma espécie de "imaginação sociológica", tomando a expressão emprestada de Charles Wright Mills, tenho, pelo menos em alguma medida, condições de tratar do tema. Não fosse assim, imaginaria impossível alguém como Friedrich Engels (1820-1895), filho de um industrial, ele mesmo administrando uma das fábricas do pai, ter condições de criticar o capitalismo, a partir de uma visão de exploração da classe operária, o proletariado.

    Aliás, não é exatamente esse o método etnográfico de que se vale um antropólogo que vai pesquisar outra cultura, isto é, em certa medida, experimentar uma condição próxima à dos indivíduos daquele grupo social, impregnando-se dos aspectos culturais daquela sociedade? Decerto que não é tornar-se um deles, mas sim aproximar-se da cultura pesquisada o quanto lhe for possível para poder tratar dos assuntos atinentes àquele grupo.

     

quarta-feira, 23 de dezembro de 2020

Aliás... "negro" ou "preto"?

 

   Já que estamos falando de "racismo", vale a pena enfrentar uma questão paralela ao tema: Qual é o correto, "negro" ou "preto"?

   Há anos, existia uma lógica de que negra era a raça, enquanto preta era a cor. Dessa forma, seria um desrespeito dizer que alguém era "preto", pois se estava comparando um indivíduo a uma coisa. 

    A disputa em torno da linguagem foi se acirrando, a partir do momento em que se entendeu que a estrutura social de dominação era continuada através de um mecanismo linguístico que "normalizava" as discriminações - ainda que não se percebesse esse uso discriminatório. Expressões como "denegrir", "lista negra", dentre muitas outras, passaram a ser criticadas.

    No meio disso tudo, passou-se a discutir a preferência pelo uso de "negro" ou "preto", para se referir ao indivíduo categorizado como da raça negra.

    Até onde sei, não existe consenso. Tanto é que convivemos com o Movimento Negro do Brasil; o "Vidas negras importam" (apesar de também haver a alternativa "Vidas pretas importam"); e até a banda de pagode "Raça Negra"... todas iniciativas de valorização e pertencimento do indivíduo negro/preto na sociedade.

    Embora reconhecendo que as palavras também se inserem num jogo cultural, que não é, ele mesmo, neutro, acho que devemos  perceber sempre o contexto do uso. Não sei o que seria mais preconceituoso, um amigo (branco) dizendo para outro (negro) "Negão, vamos beber uma cerveja?" ou um motorista (branco) dizendo para um frentista (negro) "Loirinho, coloca vinte litros de gasolina pra mim".

Racismos

 

    Vale destacar, antes de tudo, que há pessoas que se revoltam quando se fala em "raças" no que se refere a seres humanos. Estas pessoas indicam que só há uma "raça humana", não fazendo sentido, portanto, a distinção entre caucasoide, negroide ou mongoloide.

     A questão é que, para a Sociologia, o que importa não é a precisão biológica do conceito de "raça", e sim seus efeitos na realidade social.

    Ora, se pessoas são discriminadas em função de alguma característica que possuem, e se esta característica compõe um campo conceitual que se pode chamar de "raça", então, esta ideia merece ser estudada pela Sociologia.

    Para melhorar a precisão daquilo de que estamos falando, vale lembrar que "raça", sociologicamente falando, indica um conjunto de características físicas que são utilizadas para agrupar - como sempre, arbitrária e subjetivamente - determinados indivíduos.

    Não devemos confundir esse conceito com o de "etnia", que se vale mais de aspectos culturais para realização do tal agrupamento. Sem deixar de reconhecer, obviamente, que alguns desses aspectos culturais podem ser tradicionalmente associados a indivíduos com determinados traços físicos que evocam uma determinada raça.

    Assim, para alguém leigo no assunto, duas pessoas de pele de cor preta, com cabelos cacheados e determinadas traços fisionômicos podem ser categorizadas como pertencentes à mesma "raça negra", quando elas se oporiam a esta pretensa "igualdade" entre elas, por pertencerem a etnias diferentes - isto é, por terem referências históricas distintas, bem como costumes, valores, ideias e tradições diversas... até antagônicas, segundo suas concepções individuais.

   Para "apimentar" ainda mais o assunto, devemos nos recordar que, há pouco tempo, levantou-se a hipótese de se estar cometendo xenofobia e "racismo" tratar o coronavírus como "vírus chinês". Mas essa é outra estória.

    Continuemos com nossos "racismos", que já vão se provar mais de um, em breve...

Lá se foi novembro... e, quase, dezembro

 

   A última postagem foi ainda em novembro... e já estamos quase no Natal.

    Esse não foi um ano fácil. Embora meio "congelado", as coisas pareceram passar rápido demais. Acho que a "turbulência" causado pela pandemia acabou me deixando meio alheio à contagem do tempo.

    Mas vamos lá... antes que 2020 passe.

    Esse foi um ano de maior possibilidade - ou seria, necessidade? - de reflexão quanto a alguns temas que me interessam: felicidade, oposição direita e esquerda, desigualdade social, são alguns deles. Não por acaso, estamos às voltas com Filosofia, Política e Sociologia... o de sempre, não é?

    Enquanto o ano não acaba, tentarei escrever um pouquinho sobre eles.

    Vamos começar por algo que envolve desigualdade social... que se reflete no racismo estrutural.

quinta-feira, 19 de novembro de 2020

Faltou...

 

    ... o Dia da Consciência Negra, no dia 20...

Aliás... em novembro...

 

    Em novembro também temos o aniversário do blog - já são 12 anos!!! -, justamente hoje; o meu, dia 21; e... e... o do nosso super filósofo Baruch Spinoza, dia 24.

    Viva novembro!!!!

Dia Mundial da Filosofia

 

    No dia de hoje, 19 de novembro, comemoramos o Dia Mundial da Filosofia. Importante sempre destacar o papel da Filosofia para realização de uma crítica do mundo que nos cerca. Sem que façamos a análise dos significados de tudo aquilo que conhecemos, acabamos por ficar reféns da interpretação dos outros... algo como a "ideologia", segundo o pensamento marxiano.

    Então... Viva a Filosofia!!!!

quinta-feira, 29 de outubro de 2020

Giambattista Vico

 

   Herbert Spencer (1820-1903) é considerado o pai do Darwinismo Social. Este tipo de pensamento marcou profundamente a gênese da Antropologia Social. Na esteira desse discurso, o antropólogo americano Lewis Morgan (1818-1881) escreve, em 1877, Sociedade Antiga, em que descreve os três estágios de evolução das sociedades - selvageria, barbárie e civilização.

    Decerto que podemos lembrar de Auguste Comte (1798-1857), com sua Lei dos Três Estados - Teológico, Metafísico e Positivo -, divulgada no seu Curso de Filosofia Positiva, entre os anos de 1830 e 1842 - anterior, portanto ao A origem das espécies por meio da seleção natural, de Charles Darwin, publicado em 1859. Contudo, eu gostaria de voltar um pouco mais do que isso.

    Volto ao ano de 1725, ou seja, ao século anterior a esse do qual falamos. Encontro, então, La scienza nuova, de Giambattista Vico (1668-1744). Reconheço que ainda não estamos falando de "ciência" nos moldes que esta viria a ser definida posteriormente, com o rigor do método científico - embora a mesma procure argumentar em favor de um entendimento científico da História. De qualquer modo, gostaria de registrar algo sobre esse pensador italiano - com apoio do livro História da Antropologia, de Thomas H. Eriksen e Finn S. Nielsen, que registra:

    Vico propõe um esquema universal de desenvolvimento social segundo o qual todas as sociedades passariam por quatro fases com características própria e bem definidas. O primeiro estágio seria uma "condição bestial" sem moralidade ou arte, sendo seguida de uma "Idade dos Deuses", caracterizada pelo culto à natureza e por estruturas sociais rudimentares. Adviria, então, a "Idade dos Heróis", perpassada por perturbações sociais generalizadas resultantes de uma grande desigualdade social. Por fim, viria a "Idade do Homem", uma era em que as diferenças de classe desaparecem e a igualdade predomina. 

    Interessante perceber a visão antecipatória da proposta de Vico. Mas ainda há mais coisas que merecem destaque, no texto que cita o italiano. Vejamos:

    Vemos aqui, pela primeira vez, uma teoria do desenvolvimento social que não apenas contrapõe barbárie e civilização, mas especifica também alguns estágios de transição. A teoria de Vico serviria de modelo para os evolucionistas posteriores, de Karl Marx a James Frazer. Mas Vico detém um elemento que está ausente em muitos de seus seguidores. As sociedades não necessariamente se desenvolvem linearmente em direção a condições sempre melhores, mas passam por ciclos de degeneração e desenvolvimento. 

        Isso porque Vico indica que aquela tal fase da "Idade do Homem" seria "ameaçada pela corrupção interna e pela degenerescência em direção à 'bestialidade'". Ou seja, adeus "fim da História"!


    

terça-feira, 27 de outubro de 2020

Paulo Freire


   Confesso-me um quase ignorante completo em Paulo Freire (1921-1997)... como em muitas coisas mais. Minha formação em Filosofia se deu como bacharel. Portanto, nenhuma necessidade houve de me debruçar sobre questões pedagógicas e educacionais. Agora, fazendo nova graduação, desta vez, de licenciatura em Sociologia, deparo-me com as disciplinas pedagógicas e... encaro Paulo Freire, entre tantos outros pensadores da educação.

    Vejo as ideias de Rousseau, Piaget, Vygostky, Dewey, Anísio Teixeira e mais um monte de pensadores, e me encanto com alguns dos aspectos apresentados. Mas por que falar especificamente de Paulo Freire, então?

    Inicialmente, gostaria de dizer que o blog não está vetado aos citados, bem como a outros que não fazem parte da lista ínfima acima. Mas... Paulo Freire está em moda no Brasil. Talvez, entre os educadores, ele nunca tenha saído de moda. Contudo, para o público em geral, as referências a ele, penso, são muito vagas. O "estar em moda" a que me refiro diz respeito ao uso - e, talvez, abuso - político que se faz de sua figura.

    Em função deste uso político... ou, melhor dizendo, ideológico que se faz de Paulo Freire é que me decidi a tentar conhecer um pouquinho mais do que está escrito em meu livro de referência da disciplina. Comprei outros livros, mais especificamente sobre ele, os quais, confesso, ainda não tive oportunidade de ler, bem como a Pedagogia do Oprimido - igualmente não lido. Em realidade, registro apenas as primeiras impressões - estas, vindas da internet. Trata-se de um pequeno embate entre um detrator e um defensor de Paulo Freire. Deixarei o link no final deste post, para quem se interessar pela interessante leitura. Contudo, gostaria de registrar algo que me pareceu importante, logo de início: talvez seja necessário falar em "Paulos Freires", no plural. Vamos lá...

    Poderíamos pensar, pelo menos, em três Freires diferentes: (1)  o de antes do Golpe de 1964; (2) o do exílio e (3) o que volta ao país, quando da redemocratização.

    Segundo Hugo Cristo, o defensor de Paulo Freire, este, quando apresentou seu famoso método de alfabetização para adultos, não tinha nada de político, no sentido de fomentador de uma revolução da ordem política vigente. Obviamente, num sentido lato, poderia ser considerada uma ação política, visto que visava permitir o acesso à leitura - ainda que minimamente -, o que dificultaria a manipulação dos atores políticos a quem interessava um povo completamente iletrado. Mas isso é outra estória.

    Aliás, em outro momento, pretendo refletir acerca do  fato de o método de Freire ser realmente autoral ou não. Bem como se já haveria esse ingrediente revolucionário nessa época. Porém, sigamos.

    O segundo Freire seria aquele do exílio. Este, segundo Hugo Cristo, "incorpora formalmente a discussão crítica da condição social do aprendiz". Ou seja, aqui temos, realmente uma caracterização mais politizada do educador Freire. Vale lembrar, então, que a crítica não recai mais sobre o Método Paulo Freire, mas sobre o seu posicionamento político, de viés marxista. 

    Sem entrar no mérito da questão, há que se registrar, como faz Hugo Cristo, que um posicionamento crítico à visão ideológica daqueles que o expulsaram de seu país é até afetivamente justificável. Porém, sigamos, já que o importante, neste post, é a demarcação dos três Freires.

    Por último, teríamos o Freire que retorna ao Brasil em 1980, e se filia ao Partido dos Trabalhadores. Este último teria uma atuação mais institucional, como planejador da educação, já integrado ao novo cenário democrático brasileiro. Portanto, já mais transformador da realidade dada do que propositor de uma revolução marxista no Brasil.

    Como introdução à reflexão sobre Paulo Freire, acho que valeu.

   O link da embate sobre Paulo Freire - embora devam existir outros - é: https://medium.com/@hugocristo/o-fracasso-da-pedagogia-de-paulo-freire-qual-delas-a0171dc9e254

     

quarta-feira, 14 de outubro de 2020

O caso Carol Solberg (2)

 

   Vale ressaltar o que disse o presidente do STJD do Vôlei, Otacílio Soares de Araújo: "Ela está lá para falar do que ocorreu dentro da quadra, e não sobre a política brasileira ou mundial".

   Ainda bem que a atleta vai poder continuar jogando, depois da punição considerada branda.

O caso Carol Solberg


   Como alguns devem se lembrar, a atleta do vôlei de praia Carol Solberg, no mês passado, após conquistar o terceiro lugar em uma competição, gritou "Fora, Bolsonaro".

   O Superior Tribunal de Justiça Desportiva do Voleibol, ontem, a condenou com uma multa, convertida em advertência apenas. Segundo o entendimento do tribunal, Carol teria descumprido um determinado artigo do Regulamento do Circuito de Vôlei de Praia. Este artigo indicava, de modo resumido, que nenhum atleta pode se valer de meios de comunicação para expressar uma opinião crítica que possa vir a prejudicar a competição ou seus parceiros.

   Não vou entrar no mérito do regulamento, nem mesmo da punição. Gostaria de refletir acerca de duas outras coisas: o opinar de Carol e um pedido de sua defesa, durante o julgamento.

   Primeiro, em relação ao ato de emitir um juízo político, por parte da atleta.

   Em princípio, sou a favor da plena liberdade de expressão. Penso que isso implique, inclusive, aceitar opiniões antidemocráticas; que defendam coisas que achamos desumanas - como o nazismo, por exemplo. Uma opinião é a externalização do que é pensado. Nesse sentido, acho que ela deve ser respeitada como um ponto de vista, entre outros tantos existentes. Respeito, contudo, não quer dizer concordância e adoção daquele ponto de vista como motivador de uma ação. Além disso, quem emite uma opinião deve assumir sua responsabilidade pelo que foi dito, incorrendo até em crime, dependendo do que for afirmado.

   Mas minha concordância ampla com o ato de opinar - e, obviamente, com o responsabilizar-se pelo que foi dito - exige uma reflexão a mais: as figuras públicas precisam de um cuidado a mais quando se posicionam de forma aberta. Isso porque muitas pessoas, pela simples fama daquele que profere a opinião, aderem irrefletidamente à mesma, como se a opinião do "famoso" tivesse um peso maior do que aquela de quem estudou o assunto e contradiz o que foi afirmado. Portanto, uma manifestação pública de uma figura amplamente conhecida, mesmo que fora da sua área de atuação, tem um peso diferente da de outras pessoas - inclusive daquelas que teriam mais "confiabilidade" no assunto. 

   Sob essa perspectiva, acho que tanto a manifestação de Carol - fosse, também, a favor do presidente -, quanto a de juízes, atores e outros, deveria ser bem avaliada pelos seus emissores. Digo isso, principalmente, porque a reverberação dessas opiniões pode criar tantos antagonismos na sociedade, que acabam por fazer mais mal do que bem.

   Quanto ao segundo ponto que levantei - aquele que diz respeito a uma solicitação específica da defesa de Carol -, gostaria de registrar que penso ser algo incoerente. Trata-se do pedido de que o julgamento não fosse político, mas exclusivamente técnico. Isso porque houve a preocupação de que a citação depreciativa ao presidente da República pudesse pesar contra a atleta - até porque uma das patrocinadoras e a própria organizadora têm a ver com o governo federal.  

   Dá até para entender o pedido da defesa, não fosse o caso de a origem da causa ter sido, justamente, nossa atleta ter deixado de lado exclusivamente o aspecto técnico da competição, para se imiscuir justamente no plano político. 

   Fica aí a reflexão, para quem quiser pensar junto comigo. 

    

quinta-feira, 8 de outubro de 2020

Covid-19 (2)

 

    Não são novidades... mas vale à pena relembrar:

- em 31/12/2019, a China notificou a OMS sobre o aparecimento de um tipo estranho de pneumonia em seu domínio territorial;

- em 11/01/2020, oficialmente, ocorre o primeiro óbito causado pelo, já então identificado, coronavírus ;

- ... doença se espalha pelo mundo; número de mortes aumenta dia a dia; OMS declara estágio de pandemia; governos locais assumem diferentes estratégias distintas; número de mortes aumenta dia a dia; número de mortes aumenta dia a dia; número de mortes aumenta dia a dia...

- em 28/09/2020, chega-se à incrível marca de UM MILHÃO de mortos em todo o mundo - com o Brasil registrando algo em torno de 141 mil óbitos desse total

    Hoje, 8 de outubro de 2020, recorro aos noticiários e vejo que o Brasil apresenta aproximadamente 148 mil pessoas que faleceram com causa atribuída ao coronavírus. 

    Não sou estatístico, nem infectologista, por isso, na falta de dados sobre os mortos no mundo, farei uma simples regra de três, extrapolando o dado de 5% a mais de mortos no Brasil, nestes dez dias, para obter os números mundiais, que ficariam, então, em torno de 1 milhão e 50 mil falecimentos por conta do coronavírus.

    Obviamente, a morte de cada pessoa dessas é uma dor enorme para a família e para aqueles que conviviam com o falecido. Isso, não há como negar. Por outro lado, também não há como desprezar o fato de que, uma vez perdida aquela vida, há que se tirar algum ensinamento disso. As políticas públicas devem trabalhar com esses dados, não para transformar uma pessoa em um número, mas, pelo contrário, para transformar números (de pessoas falecidas) em pessoas (que possam ser cuidadas e salvas pela adoção de estratégias sanitárias eficientes).

    Contabilizando já quase 150 mil óbitos no Brasil, obviamente, não há que se falar em "gripezinha"; contudo, acho que estamos muito longe de poder falar em "apocalipse". Senão vejamos...

    Notícia recente foi a de que o Nobel de Medicina de 2020, dividido entre os cientistas Harvey J. Alter, Michael Houghton e Charles M. Rice, pela descoberta do vírus da Hepatite C, que, segundo reportagens de jornais, mata 400 mil pessoas por ano, no mundo todo. Ora, em três anos de Hepatite C, perdemos mais pessoas que nesses nove meses de Covid-19. Sim, são escalas diferentes. Mas essa comparação bem superficial, mesmo reconhecendo a diferença de quase quatro vezes mais tempo na contabilização de falecimentos acumulados, indica que há várias mazelas que não resolvemos e que, somadas ano após ano, formam o que se deseja atribuir ao estado atual da Covid-19 como sendo o "apocalipse".

    Outra comparação comum que tem sido feita é entre a Covid-19 e a Gripe Espanhola. Esta última esteve presente no mundo entre janeiro de 1918 e dezembro de 1920. Os relatos da época mostram estratégias relativamente parecidas com as propostas atualmente, como o distanciamento social; uso de máscaras; etc. 

    Se avançarmos nessa comparação, em que pese a diferença de arsenal técnico-científico que temos entre as duas épocas, vamos perceber que os números de óbitos atribuídos a uma e outra são bem favoráveis, do ponto de vista de enfrentamento da doença e manutenção da vida, ao Covid-19.

       Diante dos 7,8 bilhões de habitantes do planeta Terra nos dias atuais, com 1.050.000 mortos, temos uma razão de 0,01% da população atual levada pelo Covid-19. Enquanto que os números, controversos, da Gripe Espanhola, falam em algo entre 2,5 a 6% da população mundial da época morta por esta doença.

    Vale ressaltar que os números da Gripe Espanhola são fruto de reanálises periódicas, variando entre 17 milhões e 100 milhões de mortos, pelo mundo, naqueles três anos de ação da doença.

    De novo, ainda que não se possa falar em "gripezinha", também não dá para fechar o discurso em torno de "apocalipse"... mesmo fazendo a ressalva de que estamos comparando algo finalizado (a Gripe Espanhola) com outra coisa em curso (o Covid-19).

    Depois, continuamos...



Covid-19

     Faz muito tempo que já não registro minhas ideias e o resultado de leituras por aqui. Ainda bem, para mim, que não fui vítima - letal, pelo menos - da pandemia que assolou nosso mundão. Então, mesmo com um tremendo atraso, ponho-me a fazer uma breve consideração sobre este momento.

    Infelizmente, a Covid-19 entrou para o rol das questões que são politizadas... ou melhor, partidarizadas. Como já deve estar claro para quem me lê, sou um entusiasta da Política (essa com "p" maiúsculo), mas tenho muitas reticências em relação à "política partidária". 

    Decerto que precisamos da política partidária para fazer Política. Mas não podemos confundir conquista e manutenção de poder, objetivo principal da primeira, com organização e administração da sociedade, a ser viabilizada pela última.

    Mas, vamos lá...

    Volto à ideia de que a pandemia passou a servir às disputas de poder, mais do que à administração da sociedade. Dados técnicos são lidos, por um e outro lado da disputa, com o viés que lhes interessa. Além disso, uma novidade, como a representada pelo coronavírus, passa a cristalizar "conhecimentos" tão seguros, sem que se perceba que estes podem ser - como diversas vezes foram - desmentidos na semana seguinte.

    A própria Organização Mundial da Saúde foi reinterpretando dados; ampliando saberes e se reposicionando, quanto às instruções, ao longo desse processo. E... os defensores e detratores de um determinado lado, aproveitavam esses redirecionamentos para se apegar à sua opinião acrítica e/ou atacar a do adversário.

    Fato é que, em vez de nos unirmos contra um adversário comum, o vírus, ficamos tentando tirar partido dos cadáveres que se somavam dia a dia, numa disputa estéril pelo poder. Como se ganhar a batalha, conquistando terra arrasada, valesse mais do que manter nosso solo pujante, para, vencido o inimigo comum, disputarmos o poder dignamente nesse ambiente salutar.

       Sem entrar em questões como "gripezinha" ou "apocalipse", que são narrativas, e não análises do fato real, gostaria de registrar alguns números... o que farei em outros posts.

    Mas... foi dado o pontapé inicial.

    E... grande abraço a quem me lê.

sexta-feira, 28 de fevereiro de 2020

Mary Whiton Calkins


   O mês de março, em que se comemora o Dia Internacional da Mulher, ainda não começou. Contudo, já iniciarei minhas homenagens a essas nossas companheiras de humanidade. E isso será feito através da senhora que dá título ao post. 
    A americana Mary Whiton Calkins (1863-1930) começou seus estudos em casa. Concluída a educação formal na high school, ingressou na universidade - a Smith College -, graduando-se em 1884, com ênfase nos clássicos e em Filosofia. Conseguiu ser tutora no Departamento de Grego de Wellesley College - uma universidade só para mulheres. Um dos professores do Departamento de Filosofia, percebendo a qualidade de Mary como professora, convidou-a para lecionar a disciplina de Psicologia, que era nova em seu departamento. Ela aceitou, com a condição de que pudesse cursar Psicologia por um ano. Analisou os programas das universidades de Michigan, Yale, Clark e Harvard - escolhendo esta última instituição. Contudo, inicialmente, Harvard não a aceitou, visto que não admitia mulheres em seus cursos. Depois de insistência de seu pai e de carta de Wellesley College, ela pôde ingressar, mas não como estudante regular - embora tivesse acesso a palestras. Ela decidiu, então, assistir às aulas no Harvard Annex - precursora da Radcliffe College -, onde ensinava Josiah Royce. Royce e, ninguém menos que, William James - que dava aulas em Harvard - pressionaram o reitor da universidade, que acabou cedendo. Mas, ainda que pudesse assistir às aulas, junto aos homens, não lhe foi dado o direito de ser uma "estudante registrada".
    Em 1891, Mary Calkins retornou ao Wellesley College como instrutora de Psicologia, no Departamento de Filosofia - conforme proposto inicialmente -, e começou a planejar completar sua formação em Psicologia. Acabou estudando com Hugo Münsterberg, que viera de Freiburg para Harvard, e tendo vários artigos publicados.
   Um dos estudos orientados por Münsterberg constituiu sua tese de doutorado. Harvard, contudo, negou-lhe o doutoramento, ainda que todos os seus professores tivessem recomendado a concessão. William James descreveu sua performance como "o exame mais brilhante para o Ph.D que nós já tivemos em Harvard".
   Em 1895, retornou a Wellesley como professora associada de Psicologia. Dois anos depois, tornou-se professora de Psicologia e Filosofia.
   Entre as inúmeras conquistas de Mary, talvez a mais relevante seja o fato de ela ter sido eleita presidente da American Psychological Association, em 1905, e da American Philosophical Association, em 1918 - a primeira mulher a obter esta posição em ambas as instituições.
   Acho que minhas homenagens às mulheres começaram bem.

terça-feira, 11 de fevereiro de 2020

Martin Miller


   Martin Miller é um guitarrista alemão. Sinceramente, não o conheço por suas músicas autorais. Na verdade, fiquei impressionado com suas apresentações como cover, no YouTube. Ele faz seleções de músicas que chama de "The ultimate ... medley", onde os "..." fazem referência ao grupo escolhido. E, aí, temos Pink Floyd, Queen, Police, Genesis, etc. 
   Adorei ao que assisti. Há uma banda bem competente que o acompanha nas execuções.
   Para quem se interessar...
   Esse é do Pink Floyd.

Lázaro


  Para a Igreja Católica, Lázaro, nascido em Betânia, é um santo. Viveu na mesma época que Jesus. Sua estória com o Messias aparece na Bíblia, no Evangelho de João. Após quatro dias de sepultado, Jesus traz à vida novamente Lázaro.
   Ocorre que o mesmo Jesus, desta vez, de acordo com o Evangelho de Lucas, usa uma parábola tratando de um homem rico e de um mendigo. O nome deste último é Lázaro - nada tendo a ver com o santo mencionado acima. Seu corpo seria coberto de feridas, por conta da lepra.
   O nome Lázaro, referindo-se a este último, foi utilizado para gerar a palavra portuguesa "lazarento", adjetivo que tem o significado de "leproso", mas que, em sentido figurado, diz respeito à alguém repulsivo e insuportável - ainda que não apenas pelo seu aspecto físico, mas também por conta de seu mau comportamento.
   O mesmo nome acabou produzindo, desta vez em italiano, a palavra "lazzarone", que significa "vagabundo, vadio"... e tem por plural "lazzaroni".
   Foi justamente esse plural que me chamou atenção... afinal, virou um sobrenome. E, aqui no Brasil, por exemplo, tivemos o técnico Sebastião Lazaroni (com um "z" apenas). Que "escolha" meio ruim para um sobrenome.
   Mas... vida que segue...

sexta-feira, 31 de janeiro de 2020

Começando com uma fofoca...


   O livro 50 clássicos da Filosofia, de Tom Butler-Bowdon, publicado pela Benvirá, em 2019, parece bastante interessante. 
   Há comentários sobre livros e autores considerados clássicos, no sentido mais especial do termo, isto é, aqueles que colocam questões que sobrevivem ao tempo - embora este possa vir a ser curto, como é o caso de A soberania do bem, de Iris Murdoch.
   Mas vamos à fofoca.
   Junto com o comentário de cada obra clássica, aparece também uma pequena biografia sobre o autor. No caso de Aristóteles, veja o que está dito: "Casou-se com Pítia, uma de suas colegas na academia de Platão, mas teve um filho, Nicômaco, com sua amante, a escrava Herpília".
   Será que é isso mesmo? Vamos consultar a Wikipédia primeiro. Lá está dito:
While in Lesbos, Aristotle married Pythias, either Hermias's adoptive daughter or niece. She bore him a daughter, whom they also named Pythias.
   E, depois:
While in Athens, his wife Pythias died and Aristotle became involved with Herpyllis of Stagira, who bore him a son whom he named after his father, Nicomachus
   Bem... parece que essa estória de "amante" não é muito procedente... pelo menos, no que se refere a Herpília, já que:
According to the Suda, he also had an erômenos, Palaephatus of Abydus

    Diógenes Laércio, em Vidas e doutrinas dos filósofos ilustres, não parece dar tanta relevância às fofocas. Sobre o primeiro casamento de Aristóteles, ele explica que "Hermias se ligou a Aristóteles por laços de parentesco, dando-lhe a filha ou a neta em casamento", que seria Pítia. Contudo, Diógenes Laércio cita também uma estorinha, contada por Aristipo, segundo a qual, na verdade, Aristóteles teria se casado com uma concubina de Hermias, com a autorização deste. 
   Sobre o segundo casamento, nada se diz de modo tão explícito. Mas há a informação de que, em seu testamento, Aristóteles fala dos "ossos de Pítias" - indicando que ela já estaria morta - e dos cuidados com Herpilis e as crianças, citando logo a seguir que uma delas é uma menina, cujo nome não é referenciado, e outra é um menino, Nicômacos, segundo indica Diógenes Laércio.

Só para lembrar...


   Já estamos praticamente em fevereiro. Então, lembremos...
   Em outubro... mais um ano de falecimento da mãe...
 Em novembro... aniversário de Spinoza, meu aniversário, aniversário do blog, Dia Mundial da Filosofia...
   Em dezembro... Feliz Natal, aniversário da filhota, Feliz Ano Novo...
   Viva 2020!!!!

Vivo... ainda


   Apesar de não escrever desde setembro... estou vivo. Não por coincidência, a parada ocorreu quando iniciei uma obra no apartamento. Aliás, não uma obra, mas uma verdadeira reconstrução. Só ficaram as paredes de pé - menos uma. Do teto ao piso, tudo foi modificado. Dá para entender que não sobrava muito tempo para escrever, não é?
   Mas... voltei.