quarta-feira, 18 de novembro de 2009

O "anticristo da internet" (final) ou...

... ou "Uma autocrítica do blog".
Andrew Keen avança em sua avaliação sobre a profusão de opiniões individuais na rede, indicando que "a mídia mainstream é razoavelmente eficiente e, sem dúvida, mais eficiente que a nova mídia, em encontrar e polir talentos... Sempre existiram pessoas talentosas. Mas a maioria das pessoas não o é. Isso não significa que elas sejam más..., apenas... não têm nada de interessante a dizer. O desafio da mídia é encontrar as pessoas talentosas e lapidar seu talento, para poder torná-lo vendável... Nesse novo mundo, os que aparecerão serão os autopromotores, que com frequência veiculam ideias bastante banais".
Por último, o autor reconhece que sua ideia não é tão inovadora, dizendo: "Confesso que não é um argumento muito original. Já tinha sido desenvolvido pela Escola de Frankfurt. Porém, vivemos um momento em que essa discussão se tornou particularmente aguda. Nesse sentido, muitas vezes brinco dizendo que o meu livro é uma espécie de 'Adorno for dummies' ('Adorno para leigos')".
Conforme eu já tinha escrito no post anterior, a vantagem da chamada "Web 2.0" é dar "voz" a quem não conseguiria obtê-la através dos canais comerciais usuais. Entretanto, é claro que não se pode garantir a qualidade, nem a originalidade dessa "voz". Além disso, ainda temos o problema de um divulgador muito "simpático", mas sem conteúdo, concorrer com um criativo pensador, mas sem empatia com seu público, ou cujo alcance seja pequeno demais.
Logicamente, poderemos pensar num processo de "seleção natural" desses espaços midiáticos, onde pereceriam os menos "capazes" e sobreviveriam os outros. Mas, talvez, a chave da questão esteja justamente em que a maior "adequação" ao ambiente - da internet, neste caso - não se dê pela criatividade e qualidade do conteúdo, mas pelo maior "apelo midiático". Neste caso, estaríamos ganhando grandes autopromotores e marketeiros, mas poderíamos estar perdendo grandes talentos nas diversas áreas que se apresentam nesse mundo "virtual".
E a autocrítica deste blog? Vem agora!
Obviamente, não estou divulgando um conteúdo inovador. Provavelmente, estaria entre aqueles que não conseguiriam um espaço na mídia "ortodoxa".
Por outro lado, acho que acerto principalmente por trazer a este espaço, de modo resumido, pensamentos veiculados em diversos meios - jornais, revistas, livros, filmes, televisão -, disponibilizando-os e fazendo uma crítica do que foi absorvido.
O grupo que lê e comenta os posts se reúne aqui como se trocasse opiniões num encontro ao vivo, com a vantagem de não nos obrigarmos em termos espaciais e temporais determinados. E, penso, tem havido espaço para todos que têm interesse em registrar o que acham de cada assunto.
Portanto, mais do que um blog com ideias criativas e brilhantes, acho que o "Spinoza e amigos" faz jus ao seu nome, compondo um grupo de "bons amigos".
Obrigado aos bons amigos de Spinoza!

6 comentários:

Anônimo disse...

Achei um pouco estranha a comparação entre Adorno e Andrew, já que Adorno era marxista, e assim sendo, acredito que ele seria um grande crítico daquilo que é “vendável”, ou seja, de tudo aquilo que é transformado em mercadoria. Quando, o que eu entendi do ponto de vista do Andrew, seria preferível os talentos “lapidados” pelo mercado do que aqueles escritores insossos, mas independentes. Logo, não há uma incongruência aí? O que me pareceu, pelo que você está trazendo do autor, que não há nada mais distante de um pensamento marxista do que o aparente conservadorismo do Andrew Keen.
Outra coisa: será que realmente os “bons talentos” (um conceito demasiadamente vago e relativo) estão na mídia mainstream e os não bons fora dela, ou, será que a mídia mainstream possui muitos dos “talentos vendáveis” e os demais - que podem ser bons talentos mas que não vendáveis - estão em outros veículos, como a internet?
E, só para finalizar, sou muito mais Ricardo Garcia do que um Diogo Mainardi.
Um abraço.

Ricardo disse...

Amigo Existenz:
Começo pelo fim... Rsss.
A última frase do seu comentário deixou-me extremamente satisfeito. Sei que ela tem grande motivação pessoal, afinal, tivemos boas conversas "presenciais", onde sua simpatia e a do seu irmão sempre se fizeram presentes. Essa situação continuou em nossa "correspondência" - aliás, ainda devo a resposta da última carta.
Agora, além de me sentir em dívida sobre os conhecimentos que me faltam para trocarmos informações, você ainda me deixa com uma dívida dobrada pela sua gentileza. Isso ficou "impagável"! Rsss.
Então, antes de tudo, agradeço muito sua opinião, que tem muito de gentileza em relação à nossa amizade.
Sobre o comentário, especificamente, agora.
Obviamente, Adorno e Andrew estão em lados "econômicos" diferentes. Este último, inclusive, foi empresário, dono de empresa no Vale do Silício, nos EUA.
Entretanto, acho que o ponto chave aqui é a "disseminação do banal", do "não-realmente criativo". Além disso, outro aspecto que tanto Adorno quanto Andrew parecem não aprovar é essa "invasão torrencial" de "obras de arte" (aqui, com o sentido de qualquer produção criativa).
O aspecto de "lapidar o vendável" - embora apele para um aspecto "mercadológico", com o qual realmente Adorno não concordaria -, penso, ter uma certa justificativa, segundo a visão de Andrew. Guardado na memória que ele vive uma outra realidade - capitalista no caso de Andrew, e marxista, no caso de Adorno -, imagino que não se está discutindo a capacidade criativa de um tal "artista", mas se constata que mesmo com muita qualidade, ele tem que se "impor" ao mercado e que, esta "imposição" se daria melhor através da "filtragem" de um "descobridor de talentos" do que de um espectador acrítico.
No texto que li, o cantor Bob Dylan foi citado como exemplo. Ele estava lá - já com muito talento e criatividade - cantando num barzinho qualquer, quando um descobridor de talentos o ouviu. Juntanto "virtu" e "fortuna" - conforme diria Maquiavel -, ou "competência" e "oportunidade" - conforme as técnicas administrativas mais modernas -, Dylan foi "burilado" e se tornou megafamoso.
É lógico que deve haver "caça talentos" vendo o You Tube, também... e mesmo lendo blogs. Sob este ponto de vista, só mudaram os meios de descobrir os talentos. Mas a ideia principal é que não tem talento e se "impõe" à massa acrítica que toma o "duvidoso" por certo... talvez apenas porque esse "duvidoso" frequenta um blog "bonitinho".
Por último, concordo sobre os "bons, mas não vendáveis" poderem estar nos blogs, enquanto "ruins, mas vendáveis" podem estar na mídia "oficial". Mas eu citei essa minha posição, inclusive quando falei do blog com conteúdo, mas sem apelo midiático, em confronto com o blog "performático", mas quase sem conteúdo.
Grande abraço. Muito obrigado pelo elogio. E saiba que aprecio muito seus textos e posições críticas. A "alavanca" reflexiva que suas opiniões criam gera um cenário muito empolgante nesse nosso espaço blogueiro.

Ricardo disse...

Corrigindo um trecho no texto anterior, na parte onde falo dos "caça talentos" no You Tube.
"Mas a ideia principal é que PODEMOS TER ALGUÉM que não tem talento..."

Anônimo disse...

Olá Ricardo.
Concordo com seus argumentos sobre as proximidades entre o Andrew e o Adorno. No entanto, será que você também não perceberia aí uma proximidade entre o Andrew e o Ortega y Gasset? O “Rebelião das Massas” me pareceu ser bastante próximo desse tipo de pensar as “massas”, até provavelmente mais próximo do que em Adorno. Bom, fica aí somente uma reflexão para o futuro.
A respeito do aspecto de "lapidar o vendável" dos talentos eu já teria uma visão um pouco diferente, mas concordo que o principal nesse caso é considerar o sistema em que vivemos. Para mim, se “lapidar o talento” não é necessariamente aperfeiçoar o talento de alguém (como foi feito com Bob Dylan), e sim, mais do que qualquer coisa, criar toda uma imagem, dar todo um suporte (que só o dinheiro pode pagar) para “lançar” um João Ninguém da noite para o dia como uma “grande revelação” e ser bem sucedido em empurrar alguém assim para consumo das massas. Se você for perceber, os músicos americanos que são empurrados para os adolescentes hoje em dia, a coisa que eles menos têm é talento, já que boa parte do que vemos em clips, entrevistas, aparições em premiações e shows influentes na TV, e mesmo no que ouvimos nos discos é basicamente produzido por produtores, empresários, personal stylish e especialistas em marketing pessoal de forma inteiramente artificial. E isso só é possível pois está envolvida nessa “transformação” uma quantidade maciça de dinheiro (que, obviamente, precisará trazer retorno em um futuro próximo), criando, assim, uma “celebridade”, do que antes era alguém apenas bonitinho (da maneira “senso comum” de sê-lo), mas que mal sabia cantar, se vestia tão bem ou tão mal quanto qualquer um, nunca nem chegou perto de ganhar prêmio de nada, e nunca escreveu uma letra de música na vida. E o aspecto mais interessante desse fenômeno é que logo esse ex-João Ninguém que hoje é uma grande celebridade, onipresente na grande mídia (seja a “especializada” como no MTV Music Awards, revista Rolling Stones, Billbourd, ou a “não especializada”, como no David Letterman, CNN, revista Times,...), será logo (muitas vezes, em termos de meses) - depois de ser usado também por todas essas mídias para garantir sua audiência, e assim o gordo dinheiro trazido pelos seus patrocinadores - completamente esquecido por todos, e voltará para o mar do esquecimento pois “não é mais vendável” (no entanto, nesse tempo, já foram pagos todos os gastos que se teve com ele e muito mais...). Isso é, de fato, transformar pessoas em mercadorias. Além disso, a massa acrítica que consome esses cantores, será a mesma massa acrítica que utiliza a internet para isso, só que de uma forma que foge ao controle dos poderosos envolvidos na promoção do artista. Logo, podemos nos dar conta que a massa é igualmente acrítica, na internet ou em qualquer outra mídia, e isso é o suficiente delas, mas do que consumirem talentos, consumirem imagens, “simulacros” fabricados por uma “industria cultural” (termo, justamente, vindo do próprio Adorno), e fazerem isso de forma cada vez mais compulsiva e fugaz. E isso, com certeza, não vale só para um público adolescente ou mesmo para o mundo da música mesmo que esse seja o caso mais patente desse tipo de fenômeno (o mercado editorial e cinematográfico, só para citar duas outras, são outras “figurinhas carimbadas”).
Um abraço.

Ricardo disse...

Amigo, Existenz:
Só li pequenos trechos do "Rebelião das Massas", do Gasset. Mas sei que tenho que fazê-lo. Se você vê um encontro maior das ideias de Keen com Gasset, imagino que esteja correto. Fica a dica para uma leitura desse livro do Gasset com esse viés... e uma retomada, quem sabe, da discussão, a posteriori.
Sobre a sua consideração sobre o "lapidar o talento" - que funcionaria como "melhorar" o que já tem valor intrínseco - em comparação com a "transformação em talento" - embora você não tenha usado exatamente essa terminologia, permito-me pegar a essência de sua ideia -, eu a acho perfeita.
Muito do que vemos hoje é um "transformar em talento", mas "transformar", no sentido de fazer uma coisa que não tem talento, em algo que "pretensamente" tem. São cantores e grupos de "um CD só", que se esgotam no próprio movimento de serem eternizados. Eles devem achar ótimo, pensando que "emplacaram" na mídia. Entretanto, seus empresários estão só "chupando a laranja", deixando-os de lado quando virarem "bagaço".
Talvez, com a velocidade da net, seja ainda mais fácil lançar essas "bolhas de sabão", que acabarão por explodir sozinhas.
Mesmo concordando com tudo o que disse do defeito ser a massa acrítica que consome esses "produtos" - inclusive humanos -, volto a defender meu ponto de vista - nem sei se é mais o mesmo do Keen. Rsss - de que a net "potencializa" o lançamento dessas "bolhas de sabão" e dá muita força à coisa que só se mantém pelo poder da repetição. Por exemplo, você já percebeu que há, na revista Época, uma seção para os vídeos mais assistidos na net, e que ocorre o mesmo em programas de auditório? Ou seja, basta orquestrar bem um movimento de "consulta" na net e depois esperar que a mídia faça a propaganda, não do produto, mas da propaganda que já foi feita do produto.
Gostei muito da referência aos termos "simulacro" e "indústria cultural". Aliás, esse último foi absorvido pelo senso comum sem sequer se dar conta do conteúdo crítico que existe nele.

Anônimo disse...

Concordo plenamente com suas observações.