sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010

O amigo de Da Matta

  Na mesma coluna de jornal do post anterior sobre Roberto Da Matta, este narra o caso de um amigo, ocorrido na noite das suas Bodas de Ouro - cinquenta anos de casado, hein, gente!
  A estória contada pelo amigo de Da Matta é muito bonita, bem como a utilização das palavras. Coisa de poeta. Preparem os corações e os lenços!
  "Quando fiz as tais Bodas de Ouro... minha mulher estava muito doente. Só o seu corpo permanecia comigo. O seu espírito fugia a cada hora e a cada dia como a luz some quando chega o negrume da noite. Deitei-me ao seu lado no dia das bodas e rememorei a nossa primeira noite de casados [...] Aquele aspirado encontro no qual, finalmente, o amor ia se defrontar livre e abertamente com o sexo e com ele ter um papo cara a cara, uma conversa de homem para mulher, muito mais complicada que as nossas tolas discussões de homem para homem sobre política e futebol. Vi, como num filme, a chegada no apartamento que foi nosso primeiro lar, porque não tinha dinheiro para uma viagem de lua de mel. Chovia muito e o edifício não tinha portaria e elevador, de modo que eu, rapidinho, levei as malas para o quarto, tomado um tanto impudicamente pela cama de casal vestida de linho branco... Um tio querido e sua esposa nos receberam com discrição e cortesia. Mas quando estava para 'subir' - o amor eleva, não é mesmo? - titio me chamou e me obrigou a tomar um cálice de conhaque para 'tirar o nervoso'. Brindamos ao que estava por vir e eu subi resfolegante os degraus que me separavam da tão esperada noite nupcial. Logo abençoamos nossa casa de sexo com amor, tornando-a um lar. Não posso me esquecer da visão encantada de minha esposa com a famosa 'camisola do dia' diante do marido que ia tirando a roupa com aquela impaciência de toda primeira vez. Hoje, vivendo como vivo, eu pediria a Deus apenas uma graça. A de ver minha noiva ao meu lado jovem e linda como naquela noite encantada. Eu não quero voltar a ser jovem, ser jovem é um saco. Eu queria, isso sim, vê-la jovem ao meu lado para poder admirá-la como só os velhos sabem fazer quando se confrontam com a beleza da juventude".
  A estória continua de um modo curioso, pois o amigo conta, uma semana depois, que após umas "bebericadas" teve seu desejo realizado. Da Matta pondera com o amigo sobre a possibilidade de um estado emocional alterado, tanto pela preocupação com a saúde da esposa, quanto pelo próprio álcool ingerido. Mas dá um fechamento bonito às suas considerações ao dizer: "Simbolicamente, acho que foi um trabalho da saudade. A saudade harmoniza ilusão e realidade. Há momentos em que sexo casa com amor". E confessa: "Eu, bêbado que estava, fiquei com os olhos cheios de lágrimas quando falei essas coisas".
  Algumas frases são antológicas... merecendo constar dos tratados amorosos mais sérios, e, no entanto, foram proferidos em uma mesa de botequim - quanta cultura há nesses lugares, hein! Rsss. Uma dessas frases diz respeito à noite de núpcias, "aquele aspirado encontro no qual, finalmente, o amor ia se defrontar livre e abertamente com o sexo e com ele ter um papo cara a cara, uma conversa de homem para mulher". É certo que hoje as coisas já não são tão "românticas" assim, pois normalmente o sexo já está presente quando o amor chega à vida do casal - se chega. Mesmo assim, duas coisas devem ser destacadas. Primeiro, o encontro de amor e sexo é algo maravilhoso, não importa qual dos dois chegar primeiro. Depois, ao contrário do que pensam muitas mulheres, os homens têm muita sensibilidade para experimentar o amor.
  No mais, o texto fala por si só... e minhas considerações são totalmente dispensáveis.

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