sexta-feira, 28 de agosto de 2009

"Os filósofos e o amor"

Comecei a ler "Os filósofos e o amor", uma das minhas últimas aquisições. É verdade que é uma leitura meio "heterodoxa"... daquelas que pula de um capítulo a outro, sem nenhuma cerimônia. De qualquer forma, o entendimento do livro não parece perder muito com isso. Lá fui eu, então, da Introdução ao capítulo "As asas de Eros", que fala do amor de Heidegger e Hannah Arendt.
Na Introdução, cita-se Schopenhauer, falando sobre o amor: "Deveríamos nos mostrar surpresos que um objeto que desempenha papel tão notável na vida humana não tenha sido tomado em consideração pelos filósofos". Os autores indicam que essa afirmação é exagerada; mas apontam um certo mistério em que "a Filosofia, nascida na Grécia com a questão do amor... parece ter renegado essa origem... Assim, foi preciso esperar Kierkegaard para que o amor voltasse a ser considerado um modo de compreensão da existência". E completam: "Relegado ao domínio do pathos, dos afetos obscuros, de todo esse magma psicológico que o Sol da razão ilumina, por definição, tão mal, o amor não seria... um objeto para os filósofos".
Interessante os autores citarem, discordando, como eu, o seguinte: "Uma curiosa máxima impôs-se pouco a pouco em Filosofia: não se justifica, nem se esclarece um pensamento pela vida de seu autor... Nada a ver. Uma postura que teria decerto surpreendido os homens da Antiguidade, que mediam o pensamento com a régua da força interior, que ela infundia em quem o elaborava".
Aliás, o livro cita Nietzsche, que também parece indicar não ser possível uma "hermenêutica pura" do pensamento, sem remeter ao pensador, pessoalmente, quando diz: "Sempre escrevi inteiramente com meu corpo e minha vida, e não sei o que são problemas puramente mentais".
Para justificar, então, a abordagem do livro sobre o amor, os autores escreveram: "O pensamento do amor sempre foi escrito com o próprio sangue dos filósofos, com suas dificuldades singulares, suas neuroses, seus êxitos amorosos".
Por enquanto, só o aperitivo da Introdução... depois escrevo sobre "As asas de Eros".

4 comentários:

Maria disse...

Ricardo!!!
Após ser acicatada pelo senhor estive a ler, na net, mais sobre o amor entre o Hei e a Arendt.
Fiquei com mais raiva dele ainda...rs
Olha aí...
http://veja.abril.com.br/131200/p_230.html
O homem merecia tudo, menos o amor dela. Mas o amor tem destas coisas mesmo.

Maria disse...

Encontrei mais alguma coisa. parece que no CCB(Centro cultural de Belém) o mais famoso centro cultural de Lisboa, passou um ciclo sobre nazismo e cultura e alguém (João Paulo Coutrim- jornalista, comentarista de livros e comissário de exposições) foi falar de "nossos" 2.
Aí vai
""O amor vence o nojo"

Tão - ou mais - difícil de compreender é a história de amor entre Hannah Arendt e Martin Heidegger. "Tenho mais perplexidades que respostas", confessa João Paulo Cotrim, que no dia 12 apresenta no CCB uma sessão sobre a correspondência entre o filósofo e a aluna, que viria mais tarde a tornar-se uma estudiosa do totalitarismo e uma teórica daquilo a que chamou "a banalidade do mal" a propósito, precisamente, do nazismo.

"Se esta fosse apenas uma história de amor entre um professor com 35 anos e uma jovem com 18, seria igual a muitas que acontecem todos os dias nas universidades", diz. "A questão é que ela é judia, e ele tem um pensamento filosófico que se aproxima muito do nazismo puro. Ele é nazi antes do nazismo".

Por improvável que isso pareça, "a questão judia só é aflorada uma vez" nas cartas apaixonadas que os dois trocam durante grande parte das suas vidas - numa primeira fase no início da relação, numa segunda quando se reencontram nos anos 50 por iniciativa de Hannah e numa terceira em que a correspondência se torna mais "técnica, já no final da vida [ela, apesar de mais nova, morre um ano antes dele, em 1975]. É ela quem o procura nos anos 50 [já depois da guerra], e a paixão reacende-se quando ele volta a escrever-lhe cartas de amor extraordinárias".

Hannah Arendt sabia - era impossível não o saber - que Heidegger pertencera ao Partido Nazi, e que, enquanto reitor da Universidade de Freiburg, cargo que aceitou em 1933, afastara alunos judeus das suas aulas e recusava-se a falar com colegas judeus. Mas isso não a impediu, até ao fim da vida, de o defender.

"Por paradoxal que pareça, a resposta pode estar mesmo no amor", acredita Cotrim. "Ela pode ter achado que [a ligação ao nazismo] foi um pecadilho, e que ele, como filósofo, devia viver retirado do mundo". A única explicação para entender esta relação é que "ela coloca-o fora da questão do nazismo, vendo-o como um velho filósofo por quem se apaixonou". E, assim, "o amor vence o nojo". "
Arght para Hei.!!!

Ricardo disse...

Maria:
Já procedi à leitura do texto da Veja. Pareceu-me que há uma certa "reatividade" a Heidegger, por parte do jornalista.
A parte da adesão inicial ao nazismo, como possibilidade de passagem da Alemanha a um novo nível cultural, é indubitável. Mas a indicação de que nunca se manifestou, em vida, sobre sua desilusão com o nazismo, carece da complementação de que ele o fez, em entrevista, apenas pedindo que o artigo só fosse publicado após sua morte. Aliás, o próprio trecho da carta dele que é apresentada na matéria mostra sua não adesão ao antissemitismo do Partido Nazista.
De qualquer forma, parece-me, era um amor bastante estranho o dos dois... por vários motivos.
Mesmo não conhecendo o conteúdo completo do livro - que já tentei adquirir, mas não consigo de forma alguma -, eu arriscaria dizer que há um lamentável "desnível" entre o que o amor significava para um e para outro.
Fico com uma leve desconfiança que as belas palavras de Heidegger podiam não corresponder totalmente aos seus mais íntimos sentimentos.

Ricardo disse...

Maria:
Li o artigo "O amor vence o nojo". Parece-me que sempre é feito um resumo muito simplista e "condenante" da posição de Heidegger, no que concerne ao nazismo. Já escrevi minha opinião sobre isso, e não "carrego tanto as tintas" na condenação a Heidegger.
Sobre o nazismo, então, eu não faria críticas tão "violentas" a Heidegger. Entretanto, quanto ao seu "modo de amar", eu sou muito reticente. Se bem que a pessoa mais indicada para falar sobre esse assunto seria a Hannah Arendt.
Em breve, postarei mais alguma coisa sobre esse "amor". Aguarda...