quarta-feira, 20 de maio de 2015

Todos... menos alguns


   Sempre que alguém quer aprofundar seu conhecimento de Aristóteles, e me pede alguma sugestão de leitura, indico Introdução a Aristóteles, de Giovanni Reale, publicado pela Contraponto Editora.
   O livro em questão tem uma visão bastante geral. Contém uma biografia do Estagirita e depois vai se desdobrando em capítulos que tratam das áreas de pensamento a que ele se dedicou - quase tudo, como bem sabemos. Vemos desfilar diante de nós uma análise da Metafísica, da Ética a Nicômaco, da Política, da Poética  e do Organon, para sermos apresentados a uma história das interpretações do pensamento peripatético e, por fim, a uma lista comentada da bibliografia existente.
   Acho o livro importante porque apresenta, em um só volume, uma grande quantidade de conceitos aristotélicos de forma suficientemente clara.
    Contudo... neste final de semana, enquanto aguardava minha esposa comprar roupas para minha filha - o que demoooooora muito -, fui passear em uma livraria e decidi comprar um outro livro introdutório ao pensamento peripatético. Além de sempre haver algo novo a aprender, podia ser válido como sugestão para os amigos interessados em Filosofia. O título do livro é Aristóteles para todos - uma introdução simples a um pensamento complexo, de Mortimer J. Adler. 
   Como tenho certa desconfiança das propostas que tentam explicar Filosofia "para todos", decidi dar uma espiada no currículo do autor. O senhor Mortimer era filósofo, professor e pesquisador nos Estados Unidos, até falecer em 2001. "Ah... assim posso continuar a investigar o livro!", pensei. Afinal, estamos cheios de jornalistas escrevendo livros de Filosofia. Reconheço que, dependendo do caso específico, a leitura pode até fluir melhor para um curioso, mas sempre me inclino a valorizar mais alguém da área utilizando a pena para registrar suas impressões sobre assuntos filosóficos.
   Fui ao Prefácio e soube que o primeiro título pensado por Mortimer foi Aristóteles para crianças. Se este fosse o título, confesso que dificilmente teria a curiosidade de abrir o livro. Mas o autor diz ter compreendido que tal título não representaria "com exatidão a plateia a que essa exposição simples e fácil da obra de Aristóteles se destina. A plateia, acreditava, eram todos - de qualquer idade, a partir dos doze ou quatorze anos". Ah... melhor assim: não era apenas para crianças, mas para qualquer um a partir da adolescência! Aí, veio uma parte curiosa, onde Mortimer explica melhor quem é seu público alvo: "Quando digo 'todos', quero dizer todos menos os filósofos profissionais, em outras palavras, todas as pessoas de experiência e inteligência comuns, que não foram maculadas pela sofisticação e pela especialização do pensamento acadêmico".
   Ooooopa! Pera lá! Senti-me discriminado com esse "maculado". Isso é bullying! Rsss. Brincadeiras à parte, entendi o recado de Adler... embora ache que isso possa ser mais uma estratégia mercadológica para divulgação do livro entre o público apenas  superficialmente interessado pelo mundo filosófico, que poderia se assustar com algo do tipo "este livro atende ao público em geral, mas também aos estudantes universitários e, mesmo, aos filósofos  e pesquisadores na área de Filosofia". Tal apresentação poderia intimidar o curioso, fazendo-o pensar num nível de aprofundamento além das suas próprias expectativas.
    Sinceramente, tendo a não concordar com a ideia de que alguém, simplesmente por ter cursado uma faculdade de Filosofia, deixe de poder usufruir uma leitura mais leve sobre o assunto. Talvez Adler tenha razão no que concerne a um pesquisador especializado em Aristóteles. Este já está tão impregnado com os debates aprofundados sobre as nuances do pensador grego que até se arrepia ao abrir um livro e se deparar com "Aristóteles nasceu em Estagira, na Macedônia, no ano de 384 a.C. ..."
   Por enquanto, o livro ficará de lado, aguardando sua vez na fila sabática. Mas depois eu falarei mais dele.

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