quarta-feira, 4 de setembro de 2019

Fernando Savater


   O espanhol Fernando Savater é um grande divulgador da Filosofia. São dele, livros como Ética para meu filho, Política para meu filho, Os sete pecados capitais, Os Dez Mandamentos para o século XXI e mais alguns. Já li alguns desses. Agora, leio um que não conhecia, A importância da escolha. O original é de 2003, mas a tradução foi publicada no Brasil em 2004. Eu o descobri em uma feira de livros usados.
   Savater começa o livro dizendo que o tema do livro, pode ser colocado "ingenuamente" através da seguinte pergunta: "Em que consiste a liberdade?"... na linha investigativa básica da Filosofia: "O que é X?". Logo em seguida, explica que "logo que formulada, ela se mistura com outras - como acontece sempre com as verdadeiras questões filosóficas - que dificultam e retardam uma resposta direta: a liberdade existe realmente? [...] Sou capaz de liberdade ou sou liberdade, e por isso sou capaz de ser humano? E tantas, tantas outras: perguntas em demasia".
    O livro é bem interessante... até por conta da linguagem que Savater usa. Depois valerá uma exploração maior do seu conteúdo. Por enquanto, contudo, só quero registrar uma passagem. Lia eu:
   "[...] é preciso compreender que os dois extremos da balança axiológica, o Bem e o Mal, de nada servem à razão ou ao coração se os utilizamos em termos absolutos: só têm sentido a utilidade conceitual quando funcionam em relação a algo [...]"
   No que li isso, marquei logo a passagem como a posição de Spinoza. Eis que... logo depois, Savater escreve:
   "Isso significa que, no lugar de Bem e Mal, preferiremos dizer 'bom para...' e 'mau para...', como nos ensinou nosso pai Spinoza."
    Nem preciso dizer da minha felicidade... falar em "nosso pai Spinoza" reforça o peso do nosso querido holandês.

quinta-feira, 22 de agosto de 2019

A "novela" História do Brasil


   Sei que a História tem uma "dialética" própria, que supera a ação individual. Mas, é fato, que ela se materializa justamente através das ações dos indivíduos. Sempre achei, então, que valeria à pena estudar essa dinâmica processual, mas incluindo as idiossincrasias daqueles que "realizam" - ou que "se fazem realizar através da" - História. No mínimo, o enredo da "novela" de cada personagem histórico estabeleceria um link bem conveniente para entender o processo. 
   Estou dando uma lida em algumas partes do livro Se liga nessa História do Brasil, de Walter Solla e Ary Neto, publicado pela Editora Planeta do Brasil, agora em 2019. 
   Vou contar uma parte que adorei, falando da Revolução de 1930. 
   Estuda-se na escola que a Revolução de 1930 tem lugar por conta da quebra da política do Café com Leite, pelo presidente Washington Luís (representante do "Café" paulista), que, para as eleições seguintes, apoiou outro do seu "time", Júlio Prestes. Este saiu vitorioso das urnas, na eleição de março de 1930. A chapa adversária era formada pelo gaúcho Getúlio Vargas e pelo paraibano João Pessoa, fazendo pesadas críticas ao governo de Washington. Em julho de 1930, João Pessoa é morto a tiros. Os "paulistas" levam a culpa. A pressão aumenta. Em outubro, Washington Luís é preso. E em novembro de 1930, Getúlio Vargas assume a presidência.
   Tudo certinho. Mas... quem matou João Pessoa? E... por que motivo?
   Agora entra a "novela", descrita no livro que citei.
   "João Pessoa queria aumentar a fiscalização em algumas regiões da Paraíba para aumentar a arrecadação de impostos. O coronel Zé Pereira, da cidade de Princesa, não queria pagar mais imposto. João Pessoa então retrucou: 'Vai pagar [...]'. [José] Dantas [o atirador], e a turma do Zé Pereira, queriam pagar para ver. João Pessoa, furioso, contratou espiões e os colocou no encalço de Dantas. [...] E foi aí que ele teve acesso a cartas de amor eróticas que Dantas trocava com sua amante Anayde. O governador da Paraíba, num golpe baixo, publicou essas cartas num jornal. Para defender a honra de sua amada, Dantas [...] meteu tiro [em João Pessoa]". 
   Caraaaambaa... estória de folhetim... Mas a novela não acaba por aí... 
   "Algumas semanas depois, a namorada, consumida de vergonha, se matou". 
     Viiiiixiiii... novela mexicana total...
   

sexta-feira, 16 de agosto de 2019

As "eupatheiai" estoicas


   A Internet Encyclopedia of Philosophy, em seu verbete "Stoic Philosophy of Mind" - mais especificamente, no item "b. Passion and Eupatheia" - segue a linha que apresentamos no post anterior, quando indica que:
    "It is a mistake to assume that if the Stoics reject passion that they seek a life void of any emotion [...]. A better reading of Stoicism is that the goal is not absence of emotion, but a well-disposed emotional life. [...] This view is supported by the Stoic doctrine of the eupatheiai. Calling positive emotions 'good-passions' may have been an attempt to rectify the misrepresentation of their school as being void of emotion. [...] [I]n the eupatheiai the force of the impulse is appropriate to the value of the object, the impulse is consistent with rational behavior, and finally the belief or judgement regarding the nature of the object is true". 
   Portanto, a desvalorização generalizada das "paixões", que é a interpretação corrente do Estoicismo, parece que deve ser reconsiderada. Afinal, se existem as paixões "ruins", também existem as "boas paixões" (eupatheiai), que, segundo os estoicos, precisariam ser valorizadas.

A 'apatia' estoica


   Os estoicos se referem ao "sábio" como alguém que atingiu a "tranquilidade" e a "liberdade" da escravidão das paixões.
   Contudo, esse empreendimento de superar as "paixões" causa muita confusão e leva a uma concepção enganosa de que os estoicos seriam sem emoção, procurando reprimir seus sentimentos.
   Mas, conforme explica Diógenes Laércio, o próprio Zenão indica que:
  "O homem sábio é 'desapaixonado' [apathê], porque ele não é vulnerável a elas".
   Donald Robertson, em Stoicism and the art of happiness, explica:
   "Zeno meant that the wise man was not enslaved by his feelings of fear or desire, but we're explicitly told here [na continuação da passagem aí de cima] that's not the same as being 'hard-hearted' and 'insensitive', which is the false impression many people have today of Stoicism".
   E em outra passagem, Robertson reforça essa "falsa impressão", ao dizer:
   "However, these endeavours to overcome the 'passions' have caused much confusion and led to the widespread misconception that the Stoics are somehow 'unemotional' or seek to repress their feelings".
   Vou explorar um pouco mais este assunto nos próximos posts. Isso, principalmente, porque me lembro de, no mestrado, ter feito um trabalho que se referia à possibilidade de Spinoza ser um "neo-estoico". Demarquei bem a diferença entre o pensamento do nosso filósofo daquele dos estoicos. Mas tenho achado que a barreira é uma zona mais cinzenta do que percebi à época.

sexta-feira, 2 de agosto de 2019

Evanescence


   Adorei a música "Bring me to life", do Evanescence, desde a primeira vez que a ouvi... nem sei há quantos anos. 
  A batida forte, as guitarras pesadas, uma voz cavernosa de tempos em tempos, mas, principalmente, a maravilhosa voz de Amy Lee. 
  Vale a pena assistir ao vídeo antigo: https://www.youtube.com/watch?v=kI01QzkNT7M
    Mas não há como negar que a versão acústica, bem mais suave, ficou maravilhosa, também. 

Algumas visões pessimistas da felicidade


   "Ser imbecil, egoísta e ter boa saúde: eis as três condições necessárias para ser feliz. Mas, se a primeira lhe faltar, tudo está perdido" (Flaubert, carta a Louise Collet - 13/08/1846)

   "Se a Providência quisesse que fôssemos felizes, não nos teria dado a inteligência" (Kant, Fundamentos da Metafísica dos Costumes - 1785)

    "O conceito de felicidade é tão indeterminado que, apesar do desejo que todo homem tem de ser feliz, ninguém jamais pode dizer em termos precisos e coerentes o que verdadeiramente deseja e quer. [...] Quer a riqueza? Quantas preocupações, quanta inveja [...] ele pode, com isso atrair sobre sua cabeça! Quer muito conhecimentos e saber? Talvez isso só lhe proporcione um olhar mais lúcido sobre males que ele doravante enxergará de maneira mais aterrorizante, ao passo que antes se esquivavam à sua visão, e que no entanto são inevitáveis [...] O problema que consiste em determinar de maneira segura e geral qual ação pode favorecer a felicidade de um ser razoável é um problema totalmente insolúvel" (idem)

   

Ainda divagando sobre "determinado" Spinoza


   Louis Althusser  dizia, em Ler O Capital, que "[Spinoza] é o único ancestral direto de Marx".
  No artigo Is it simple to be Spinozist in Philosophy? (https://www.radicalphilosophyarchive.com/article/is-it-simple-to-be-a-spinozist-in-philosophy), a autora Katja Diefenbach, apresenta de modo interessante a visão de Althusser sobre Spinoza, no que concerne a sua relação com o marxismo. 
  Vejamos a parte em que o filósofo franco-argelino "critica" Marx por ele não ter captado um ponto importante da teoria spinozana:
      "At strategic points in Reading Capital, Louis Althusser introduces Spinoza's idea of an immanent cause as the decisive concept that is absent from Marx's discourse. For the Althusser of 1965, Spinoza's model of causality is the great missing link in Marx'se thought, a philosophical omission and lacuna of symptomatic force. It explains the whole detour that Marx was forced to take through Hegel's system of thought. Because Marx was neither aware of the concept of immanent causality in Spinoza nor produced it himself, the idea of the effectivity of structure is foun only in practical state in the complexity with which Marx depicts the social reproduction of economic relations in Capital".
   

Spinoza, o bom jogador (2)


   Aliás, continuei dando uma olhada e descobri um artigo russo - já traduzido para o Português, obviamente... caso contrário, eu não leria - sobre nosso querido filósofo. 
   Olhei rapidamente. Volto a ele depois. Por alto, dá para perceber umas coisinhas questionáveis. Mas... se alguém quiser dar uma lida, aí vai o endereço:

   É sempre bom ver nosso "bom jogador" entrando em campo. Rsss

Spinoza, o bom jogador


   Todo bom jogador é disputado pelas grandes equipes. Messi, Cristiano Ronaldo, Neymar (???) e outros estão sempre na mira dos dirigentes de clube para serem contratados.
   Não é que nosso querido Spinoza também vive algo assim. Rsss. 
   Estava dando uma espiada na Introdução da versão eletrônica da Contribuição para a Crítica da Economia Política (1852), de Marx, quando vi que o holandês possui seu nome citado no texto... com um hyperlink.
    A passagem é essa:
a) Produção e Consumo
A produção é também imediatamente consumo. Duplo consumo, subjetivo e objetivo: o indivíduo que, ao produzir, está desenvolvendo as suas capacidades, está também dispendendo-as, isto é, consome-as no ato da produção, tal como na procriação natural se consomem forças vitais. Em segundo lugar: consumo dos meios de produção utilizados, os quais se desgastam e se dissolvem em parte (como na combustão, por exemplo) nos seus elementos naturais; do mesmo modo, as matérias-primas utilizadas perdem a sua forma e a sua constituição naturais: são consumidas. Portanto, em todos os seus momentos, o próprio ato da produção é também um ato de consumo. Aliás, os economistas admitem-no. Chamam consumo produtivo à produção que corresponde diretamente ao consumo e ao consumo que coincide imediatamente com a produção. Esta identidade da produção e do consumo remete para a proposição de Espinoza: determina tio est nega tio.

   Há um errinho, ali, obviamente: "determinatio est negatio". Mas, sigamos. Fiquei curioso para onde apontava o hyperlink. Fui ver e...
era para o Dicionário Político do site www.marxists.org. Vejam o que consta lá:
logotipo
  Spinoza, Baruch
foto(1633-1677): Filosofo originário de uma família de comerciantes judeus de Amsterdam, a cidade burguesa mais desenvolvida da época. Foi excluído da comunidade em consequência das duvidas que emitiu, com referencia à autenticidade dos textos sagrados Retirou-se para as vizinhanças da cidade de Haia e, depois, da própria cidade, afim de se dedicar à meditação, ganhando a vida como polidor de lentes para microscópios. Publicou, em 1670, o seu Tratado teológico-político, no qual desenvolveu seu racionalismo religioso e seu liberalismo politico. Suas outras obras só foram publicadas após sua morte. Spinoza foi o cérebro mais livre em filosofia no século XVII. Deve ser considerado como um dos antepassados do materialismo dialético. Sua obra principal é a Ética, publicada em suas obras póstumas (1677): Sua filosofia exerceu influência revolucionária, tanto na França do século XVIII como na Alemanha em fins do século XVIII e princípios do século XIX. Sobre Spinoza, consultar Karl MarxA Sagrada Família. Spinoza escreveu: Ética, 1677; Tratado político-teológico, 1670, etc

    Achei bem estranha a afirmação de que Spinoza "Deve ser considerado como um dos antepassados do materialismo dialético". De onde se tirou isso? Para mim, da vontade de todo grande time ter o craque. Rssss

quinta-feira, 1 de agosto de 2019

Lembrança das férias de julho



                          Spinoza... e eu, em Amsterdã. Rsss

quarta-feira, 31 de julho de 2019

Feuerbach


    Ludwig Feuerbach (1804-1872) é um filósofo mais conhecido pela influência gerada sobre Karl Marx. Por enquanto, não pretendo mudar essa imagem. 
   No entanto, dando uma olhadinha rápida em Teses provisórias para a reforma da Filosofia (1842), que, confesso, nunca tinha lido, encontrei referências tão diretas a Spinoza, que me interessei. Uma delas, por exemplo, diz:
   "Spinoza é o verdadeiro criador da moderna filosofia especulativa; Schelling é o seu restaurador e Hegel levou-a ao pleno cumprimento".
   Não sei se, para Spinoza, é bom negócio estar citado ao lado de Hegel, nem ser dado como o "criador da moderna filosofia especulativa". 
   Talvez, pior ainda, seja  julgar que "A filosofia da identidade [que aparentemente ele atribui a Hegel] distinguiu-se da filosofia spinozista tão só por ter insuflado à coisa morta e idolente da Substância o espírito do idealismo", porque, afinal, para Spinoza, a Substância não é uma "coisa morta"... muito pelo contrário.
   De qualquer modo, queria registrar uma citação que julgo interessante de Feuerbach, que diz:
   "A verdadeira filosofia consiste não em fazer livros, mas homens".




sábado, 29 de junho de 2019

Mais fã de Clapton


   Hoje assisti ao documentário "Eric Clapton: vida em 12 compassos". Foi tão emocionante que cheguei a chorar. 
   Comecei a gostar do guitarrista inglês em 1981. Desde então, comprei tudo que ele produziu. No começo, em vinil e fitas cassete... que, depois, tiveram que migrar para os CDs. Ficava feliz de adquirir o que só era produzido no exterior, para poder acompanhar toda a obra de Clapton.  
   Sempre soube que o guitarrista tivera problemas com as drogas e o álcool, mas não que ainda tinha enquanto eu o admirava tanto. É óbvio que esses problemas eram muito maiores na vida dele no que na minha, visto que aquilo que eu admirava era a qualidade musical do grande guitarrista. 
   Esse documentário foi... absolutamente incrível. Clapton foi absolutamente transparente diante da produção. Contou TUDO! Há, inclusive, imagens de Clapton consumindo cocaína e dele completamente fora de si. Imagens muito impactantes... de verdade.
   O filme narra, em idas e vindas, o abandono de Clapton, desde sua tenra infância, pela mãe; a rejeição inicial e o posterior casamento com Pattie - esposa do seu melhor amigo, George Harrison, ex-Beatles -; a morte do seu querido filho, Conor, com apenas quatro anos; e seu casamento com a parceira "ideal", segundo ele mesmo, com quem teve três filhas. 
    Fiquei mais fã de Clapton pela beleza de sua história de superação, mas também pela coragem de contar tudo.
   Vale à pena assistir.

quinta-feira, 27 de junho de 2019

Telegram lavando a Lava Jato (2)


   Ainda observando o que acontece nesse caso do vazamento dos diálogos - adulterados ou não - entre o ex-juiz Sérgio Moro e o procurador Deltan Dallagnol, escutamos as opiniões de juristas sobre o caso. Opiniões, registre-se, que incriminam e que isentam de culpa o atual ministro da Justiça e Segurança Pública.
   Penso que não dá para deixar de considerar o aspecto ético da questão. Eu não gostaria de saber, por exemplo, que o juiz de um caso se alinhou com o advogado do réu para orientá-lo sobre a melhor forma de fazer a defesa de seu cliente, do mesmo modo que não ficaria satisfeito de tomar conhecimento que esse mesmo tipo de atitude ocorreu para facilitar o trabalho dos promotores do caso. Ponto!
   Por outro lado, duas coisas me fazem refletir.
  Alguém que defende a utilização dos diálogos para demonstrar que houve uma ilegalidade na atuação do juiz - o que lhe parece algo absurdo - não pensa que está se valendo de outra ilegalidade, que é a prova obtida sem autorização da Justiça, para anular aquela primeira?
   Concordo que, no caso do juiz, se espere "neutralidade", enquanto, do ponto de vista do advogado, é claro que há um posicionamento esperado. De qualquer modo, estamos tratando de uma ilegalidade para "corrigir" a outra. E, aí, poderíamos pensar também que o promotor estava, ele também com um posicionamento claro de acusação, tentando se articular, da melhor forma possível, para tentar punir a possível ilegalidade cometida pelo réu. 
   Outra coisa que me incomoda um pouco é a questão de se pleitear a anulação de todo o julgamento, com base na possível parcialidade do primeiro juiz. Ora, se o processo já foi apreciado por instâncias superiores, que ratificaram a decisão anterior, acho que se deve avaliar sobre a tal anulação com mais cuidado. Isso porque o que está sendo questionada é a parcialidade do julgador, e não, por exemplo, a consideração de uma prova falsa para embasar a decisão. Então, se o primeiro juiz foi parcial ao julgar, mas o processo - materialmente falando - contém todos os elementos que justificam uma condenação, e a instância superior, ao analisar exclusivamente o que consta do processo, também condena o réu, não me parece haver motivo algum para anulação do processo como um todo.
   Aliás, o ministro João Otávio Noronha, presidente do Superior Tribunal de Justiça, que é um crítico da Operação Lava Jato, comentou, em entrevista ao site UOL, diz que "O STJ julgou com o que tinha nos autos. E o que tinha nos autos foi produzido tanto pela defesa quanto pelo Ministério Público. [...] Portanto, o STJ não incorreu em nenhum erro". Lembrando, inclusive, que a 5ª Turma do STJ reduziu a pena do ex-presidente Lula de 12 anos e 1 mês para 8 anos, 10 meses e 20 dias.
   Mas... continuemos vendo o que vai ocorrer.

Rindo com a História do Brasil


    Está sendo muito divertido ler Breve História Bem-humorada do Brasil, de Ricardo Mioto. Decerto que o fato de ser escrito por um jornalista, e não por um historiador, pode render críticas por parte de alguns. Mesmo assim, acho que vale à pena ler o livro. O estilo leve e bem-humorado aumenta o interesse pelos temas. Acho que isso é o que merece relevo. Afinal, caso se decida pesquisar mais seriamente sobre determinado assunto, pode-se recorrer a um livro mais "ortodoxo" de História do Brasil.
   No livro em questão, eu aprendi, por exemplo, que o famoso jornalista Carlos Lacerda, um dos maiores críticos do ex-presidente Getúlio Vargas - em alguma medida, responsável pelo suicídio do mesmo, em 1954 -, se chamava Carlos Frederico Werneck de Lacerda. Até aí, tudo bem. A curiosidade é que esse grande direitista, filiado à União Democrática Nacional, tinha esse nome como homenagem à dupla Karl Marx e Friedrich Engels, os maiores "esquerdistas" da História.
   Para que se perceba o teor de humor do texto, vou citar um trechinho sobre o atentado sofrido por Carlos Lacerda, na Rua Tonelero, em Copacabana.
   "Um guarda municipal que estava por ali consegue anotar a placa do veículo.
      Com a placa do seu carro aparecendo na imprensa, o taxista [...] se apresenta voluntariamente em uma delegacia. Ele diz que havia levado dois passageiros até a rua Tonelero. (Que tipo de pessoa vai tentar matar alguém e... pega um táxi?)
      [...] a polícia chega aos nomes da dupla. Um era [...] chamado Climério Euribes, mas se você se chamasse Climério Euribes também teria certa vontade de sair matando gente e se vingando do mundo, não?
       O outro era um mestre de obras que estava fazendo um frila de pistoleiro. Sabe como é, a vida na obra tava difícil, os boleto tudo para pagar. 
      Era apenas a segunda vez que o mestre de obras estava trabalhando de pistoleiro [...]. Na primeira, tinha matado o cara errado... Na segunda, [...] repetiu a proeza [...]. Só quem já contratou pistoleiro sabe a dificuldade que é achar um bom".
    Estou rindo até agora. 
    Para quem quiser comprar, a capa do livro é essa...

   

terça-feira, 18 de junho de 2019

Spinoza, segundo Robert C. Solomon


  Adoro o livro A passion for wisdom - a very brief History of Philosophy, de Robert C. Solomon e Kathleen M. Higgins. Meu exemplar é todo rabiscado. Mas voltei a ele para dar uma refrescada em alguns personagens da História da Filosofia, aproveitando o modo agradável com que Solomon e Higgins os apresentam.
   Obviamente, vou citar o registro de Solomon a respeito de... Spinoza. Rsss. Achei bem interessante uma determinada observação dele sobre o filósofo holandês:
   "Spinoza's claims about substance, however, have far more important implications that cannot be understood in terms of metaphysical technicalities alone.
     In Spinoza's vision, there is no ultimate distinction between different individuals. [...] This means that our sense of isolation from and opposition to one another is illusion, and it also means that our sense of distance from God is mistaken. [...] Furthermore, since the One Substance has always existed and will always exist,  our own immortality is assured".
    Aliás, como sabemos, a Ética é toda construída em favor da felicidade, enquanto aumento da nossa potência de existir e agir.
   Como dizem Solomon e Higgins:
   "The book [Ética] is, in keeping with its title, a heartfelt proposal for a better way to live"... a despeito de toda sua poderosa construção metafísica.
   
 

Telegram lavando a Lava Jato


   Assunto tremendamente em alta no momento é a questão da apresentação da interceptação de mensagens trocadas entre membros do Judiciário e do Ministério Público Federal - notadamente o então juiz Sérgio Moro, hoje ministro, e o procurador Deltan Dallagnol -, através do aplicativo Telegram, no período em que o processo do ex-presidente Lula evoluía.
   A partir da divulgação dos diálogos, pelo site The Intercept, gerou-se uma confusão bastante grande de opiniões. Legisladores consultados viram uma possível ilegalidade na conversa entre acusador e juiz, visto que haveria um concerto entre ambos, principalmente para possibilitar uma melhor estratégia de obtenção de provas para condenação dos implicados em casos de corrupção investigados pela Operação Lava Jato. Moro e Dallagnol, ainda sem confirmar a veracidade dos diálogos, insistem que não há nada de ilegal em conversarem durante o processo. O procurador demonstra a imparcialidade do juiz mostrando que houve diversos momentos em que o Judiciário negou pedidos do MPF. Quem está alinhado com eles registra que, em casos tão grandiosos quanto este, há que atacar pesadamente os infratores, mesmo que isso implique uma "flexibilização" nas regras ortodoxas de atuação.
   Há defensores de um lado e de outro. Particularmente, gostei da análise de Rogério Arantes, professor da USP, doutor em Ciência Política, publicada na revista Época, de 17/06/19. Gostaria de destacar apenas dois parágrafos do excelente texto.
   "O que distingue a Lava Jato [...] é que ela teve o êxito de promover uma nova forma de triangulação no interior do sistema de Justiça Criminal e de perfilar todas as instâncias jurídicas na mesma direção. Entretanto, parece cada vez mais claro que a operação foi desenhada para alcançar um determinado alvo, e nisso reside sua principal fragilidade e extravagância [...]. Ao se colocar um objetivo predefinido, a Lava Jato tornou-se uma operação tecnicamente política. Aqui se trata, na verdade, da clássica separação entre Justiça e política, que pode ser pensada a partir da relação entre meios e fins. Política é ação com relação a resultados, e os meios são escolhidos de acordo com os objetivos que se quer alcançar. Assim é que a política se legitima pelos fins que alcança, e os meios podem ser até controversos sob a ótica da moral comum, como nos ensinou o pai da política moderna, Maquiavel. A Justiça, por sua vez, legitima-se pelos meios que adota para a tomada da decisão. Mais importante que o resultado é o devido respeito ao processo legal. Da Justiça se pode dizer, em suma, que se legitima pelo procedimento".
   É uma discussão que deve ir longe, porque todos - pelo menos os que não estão implicados na Lava Jato - querem que a corrupção seja, na medida do possível, extinta nos órgãos superiores de decisão no Brasil. Contudo, para o bem do nosso Estado de Direito, não se quer abrir mão da legalidade dos procedimentos pelas diversas instituições. 
   Ainda Rogério Abrantes apresenta estas duas posições, quando diz:
   "na prática [...], esse mesmo modelo [a Polícia investiga, o Ministério Público acusa e o Judiciário julga] sempre fora acusado de ser a causa da impunidade. A interação entre essas instituições, historicamente marcada pela desconfiança recíproca e pelas críticas de incompetência e morosidade de lado a lado, comprometeria a eficácia de suas ações"; e
   "Quem prega mãos limpas não pode sujar as suas, mesmo que em nome de excepcionais objetivos".
   Vamos acompanhar os próximos passos para saber o que vai acontecer.

terça-feira, 21 de maio de 2019

José Padilha


   José Padilha é o criador da série O Mecanismo, que já vai para a segunda temporada na Netflix. A revista Veja nº 52 publicou uma matéria sobre o lançamento e uma pequena entrevista com o próprio Padilha. Sabemos que o produtor Padilha pertence ao campo ideológico da esquerda, contra o atual presidente Bolsonaro. Por isso mesmo, achei relevantes duas das respostas da pequena entrevista. Nelas, Padilha declara:
   "Quem elegeu Bolsonaro foi a esquerda. Antes das eleições, eu disse que três nomes estavam na disputa: Bolsonaro, Haddad e Ciro Gomes. Só Bolsonaro e Ciro, que não tinham ligações com a Lava-Jato, tinham chances. Mas a esquerda decidiu apoiar Haddad" e
   "O impeachment foi uma enorme farsa, um golpe. Mas quem deu o golpe? Foi o vice-presidente em que todos os eleitores do PT votaram. Foi um golpe interno de quem estava no poder. Uma quadrilha se fracionou em duas. Não foi a direita que derrubou o governo: foi o MDB que estava associado ao PT. Dilma foi uma tragédia para o Brasil. Se ela foi vítima, é porque se aliou ao Temer. Quem dorme com cobra acorda picado".
   Antes de fazer um pequeno comentário sobre essas declarações, quero dizer que não concordo integralmente com Padilha. Mas... vamos lá.
   Falou-se muito, na época da eleição, do erro estratégico do PT em tentar "forçar" a candidatura de Lula, mesmo que alguns, dentro do próprio partido, reconhecessem a pequena probabilidade do TSE acatar a inscrição do ex-presidente. Contudo, quando os números do "sucessor" Haddad começaram a crescer, esse possível engano foi sendo descaracterizado como tal. Quando o segundo turno se desenhou, Ciro Gomes passou a ser pressionado para dar amplo apoio ao candidato do PT - mas não o fez. A "culpa" pela vitória de Bolsonaro, então, caiu no seu colo. Interessante, então, observar que esta culpabilidade migrou, pelo menos segundo a percepção de alguns, para a esquerda, por conta do apoio a Haddad - muito em função do protagonismo do PT junto às esquerdas.
   O segundo comentário diz respeito ao reconhecimento de que o "golpe" - deixei entre aspas para deixar a discussão sobre a real natureza do impeachment em aberto - não foi dado pela direita, mas que foi algo interno. Mesmo relatando sua revisão pessoal com a figura do, hoje ministro, Sérgio Moro - de admirável combatente contra a corrupção a alguém associado à "esgotosfera da milícia no Rio" -, Padilha não bate na tecla dos petistas ortodoxos, que culpam o ex-juiz por favorecer a direita - de modo planejado desde então. Se houve "golpe" - e, para ele, houve -, este foi interno, com certa participação do próprio PT, por escolher mal seus companheiros.
   O último comentário é mais uma observação sobre a contundência de uma das afirmações de José Padilha, quando este diz que "uma quadrilha se fracionou em duas". Nem falo nada...

quinta-feira, 16 de maio de 2019

"A guerrilha no palácio"


   A revista Veja desta semana traz como matéria de capa a presença, ainda que não física, do "ideólogo" Olavo de Carvalho no governo do presidente Bolsonaro.
   Sem a ingenuidade de quem lê a matéria como completamente neutra, no sentido ideológico, faço algumas reflexões. 
   A primeira delas - e é justamente o que me chama mais atenção - é sobre a personalidade de Olavo de Carvalho. Antes de fazer a graduação de Filosofia, já tinha interesse pelo assunto. Além da leitura óbvia de Marilena Chauí e Danilo Marcondes - livros introdutórios de qualidade, utilizados até hoje -, tive a oportunidade de assistir às aulas do professor Olavo de Carvalho, gravadas em vídeo. Polêmico, atacava os "erros" de gigantes, como Kant, por exemplo. As palavras eram até "duras", mas havia uma argumentação... ainda que esta pudesse ser rebatida por especialistas. 
   Portanto, o lado polemista do professor Olavo, eu já conhecia. O que não me foi apresentado foi um vocabulário cheio de palavrões. Sinceramente, isso me decepcionou muito. Nem estou entrando no mérito dos conteúdos combatidos, mas é inimaginável, para mim, ver um "filósofo" usando como argumento palavrões.
   A segunda observação diz respeito a uma curiosidade apenas. Quando Bolsonaro estava disputando a eleição, muito se falava na possibilidade de volta da ditadura militar, visto que havia um claro alinhamento do corpo das Forças Armadas com o candidato. Eis que, agora, os militares podem estar sendo brandos demais... segundo o pensamento de Olavo e seus admiradores. 
   A matéria diz:
  "o guru [Olavo de Carvalho] e seguidores acham que os militares são excessivamente dóceis com os esquerdistas infiltrados nas universidades, nas escolas, na Igreja, na produção cultural, na imprensa e até mesmo nas Forças Armadas".
   Os possíveis "usurpadores do poder, pela via antidemocrática", que seriam os militares, se transformaram em mantenedores do diálogo democrático. Afinal, para eles "Olavo é uma força do extremismo político" - ainda segundo a matéria -, sendo necessária a diminuição de sua participação no governo, a fim de que possa haver uma unificação nacional do povo em torno de um projeto de país.
   Vamos aguardar que essa confusão "interna" acabe da melhor maneira possível para o Brasil

quarta-feira, 8 de maio de 2019

O socialismo como "bom"


   Um dos maiores problemas que há quando se fala em "socialismo" é, numa atitude que poderíamos chamar de ingênua, por ser pouco refletida, dizer que aquilo que o diferencia do capitalismo é que ele pretende o bem das pessoas. Isso lança sobre o capitalismo a pecha de ser aquele que não se importa com o bem das pessoas, admitindo o mal... para não dizer mesmo, desejando-o.
   Noberto Bobbio, por exemplo, no livro Escritos sobre Marx: dialética, estado, sociedade civil, indica:
   "Podemos dizer que uma teoria do socialismo sempre existiu, porque sempre existiram no homem aspirações a uma sociedade melhor, fundada sobre a igualdade dos homens, isto é, sobre o princípio fundamental em que se inspira toda doutrina comunista, de que as desigualdades sociais devem ser eliminadas".
   Isso é uma espécie de juízo de valor que iguala "socialismo" ao  que é "bom". O outro lado, portanto, representando o que é mau.
    Essa é uma visão de senso comum. Fala-se, por vezes, até em um "socialismo/comunismo" reinante entre os grupos cristãos primitivos. Ora, uma coisa é uma coesão social ditada por uma visão mais comunitarista, algo do tipo "solidariedade orgânica", como proposto por Durkheim; outra, é chamar isso de "socialismo/comunismo" - principalmente, se estamos tratando desses temas dentro das Ciências Socias.
   Ainda no mesmo texto, Bobbio diz que: "o socialismo geralmente foi sustentado com razões que podemos dizer sentimentais". Portanto, temos que ter cuidado quando queremos categorizar, com essas "razões sentimentais", algo dentro do campo científico.
   O livro de que tenho falado, escrito por Saturnino Braga, também vai na mesma linha, quando diz:
   "Sim, antes de tudo, o socialismo é uma ética: ninguém é socialista senão por um impulso que fala de justiça, de igualdade, de respeito e valorização do trabalho, de solidariedade e mesmo de fraternidade entre os seres humanos".
   Logo a seguir, explica que:
   "a ética é a meditação, o debate filosófico sobre o bem e o mal, sobre o que é bom para todos, o que faz o bem universal, o que é certo e o que é errado na convivência com os outros [...]; é o conjunto de normas e convicções que constitui a base moral de uma sociedade humana".
   Embora essa parte final do texto - que, lembremos, não é de um filósofo - acabe por identificar "ética" e "moral", o que não parecia ser a intenção inicial, que aparentemente chamava de "ética" a "meditação e debate" sobre o "conjunto de normas", isto, sim,  a moral, percebe-se que o "socialismo" aparece como vinculado ao que é moralmente "bom". Sobrará ao seu adversário realizar, assim, o que é mau. 
    É importante reconhecer que se, como eu mesmo já disse em outros posts, o ímpeto inicial de Marx realmente pareça ter um caráter humanista, não dá para negar que o homem médio, mesmo imaginando ser o capitalismo o melhor modelo de sociedade, também pode ser um humanista, preocupado com o bem-estar dos seus companheiros.

terça-feira, 7 de maio de 2019

O preço da eleição


   Ainda no mesmo livro do post anterior - no mesmo trecho, aliás -, Saturnino Braga fala sobre os serviços dos especialistas em ciência da psicologia eleitoral.
   Diz ele:
  "Tais serviços profissionais, prestados via de regra por toda uma equipe, custam somas vultosas que só os candidatos endinheirados podem pagar. E somas ainda muito maiores custa a cobertura noticiosa que os candidatos conseguem ter nos meios de comunicação, e que constitui outro fator absolutamente decisivo de êxito. A tal ponto que se pode hoje afirmar que o dinheiro é o fator mais importante numa decisão eleitoral de uma democracia moderna."
   Ou seja, por trás da lógica da manipulação "afetiva" dos profissionais em psicologia eleitoral, há o interesse de grandes grupos econômicos.

O voto


   Estava lendo um livrinho de Roberto Saturnino Braga, Entre séculos - textos políticos, publicado pela Contraponto, e me deparei com algo que já discutimos aqui, sobre a questão da racionalidade do voto.
   O texto expressa uma opinião que já defendi. Diz o seguinte:
"... a decisão do voto não é um ato puramente racional do eleitor esclarecido; é influenciada por um conjunto de impressões, emoções e sentimentos que os candidatos vão suscitando em seu espírito no curso da campanha. E a ciência da psicologia eleitoral formou profissionais especialistas na apresentação de candidatos cujos serviços produzem efetivamente resultados na cabeça do eleitor, principalmente no seu coração".

quinta-feira, 7 de março de 2019

Empatia e Simpatia


   Outro dia, numa discussão sobre os termos "empatia" e "simpatia", esbarrei no idioma grego. Lembrava de "sym+patheia"... e o seu equivalente latino, "cum+passione". Aliás, dizer que "simpatia" é a mesma coisa que "compaixão", embora etimologicamente correto, parece muito estranho. Mas... sigamos.
   O problema era "empatia". Qual era a etimologia da palavra? Não lembrava desse "em". A palavra mais perto que lembrei foi "enkrateia". Mas não conseguia relacionar o tal "em" a nada.
   Lembrando que os significados, em Português, são: 
   
   Simpatia - sentimento de afinidade por outra pessoa.
   Empatia - capacidade de experimentar emoções similares às de outra pessoa numa determinada situação. 
   
   Vamos à etimologia, agora:

   Sym+patheia - algo como estar com o mesmo pathos. Estar com um sentimento comum ao do outro. Nesse sentido, o termo parece muito mais próximo ao de "empatia". Ou seja, o "compaixão", que seria "sentir com", isto é, "sentir o que o outro sente" se aproxima bastante do "empatia" dicionarizado em Português.

  Mas o mistério etimológico estava em "empatia". Um dicionário online sugere: "com origem no termo em grego empatheia [...], a empatia pressupõe uma comunicação afetiva com outra pessoa".
   Passemos ao dicionário de grego para procurar empatheia... e surge uma surpresa incrível: "animosidade, malquerença, rancor".
   Aliás, só para constar, em sympatheia lemos "simpatia, compaixão".
    Como essa "capacidade de experimentar emoções similares às de outra pessoa" pode ser o equivalente a "animosidade, malquerença, rancor"?
   Investigando um pouco mais, encontramos no Aurélio a chave da questão. "Empatia [Do ingl. empathy... a partir do ingl. em- (< lat. in) + ingl. -pathy...]" 
   Obviamente, a ideia grega de pathos está presente na palavra inglesa "empathy", mas esta última não está diretamente ligada à "empatheia".


Session ou Saison


   O título do post diz respeito a cervejas. Embora os nomes sejam parecidos, designam dois tipos bem distintos.
   Juliana Simon, do site "Siga o copo" explica que a Session IPA é uma cerveja com menor teor alcoólico, mas com aquele amargor característico da IPA tradicional.
   (Ver https://sigaocopo.blogosfera.uol.com.br/2017/11/08/session-ipa-e-aposta-para-quem-procura-cerveja-leve-mas-nada-sem-graca/ )
   O blog "Bebida Express" explica que o estilo "Saison" surgiu na Bélgica. Seu nome tem a ver com a fabricação ser sazonal, sendo produzida quando as temperaturas subiam na região de origem. Também é uma cerveja do tipo Ale. O sabor é frutado, com amargor moderado. 
   ( Ver http://www.bebidaexpressblog.com.br/cerveja/conheca-mais-sobre-a-cerveja-do-estilo-saison-ou-farmhouse-ale )


   







quinta-feira, 28 de fevereiro de 2019

O que é ser de esquerda, hoje?


   Essa me parece uma pergunta bem interessante de ser feita atualmente. Não só por que ela demonstra a preocupação de estabelecer quais são os pontos principais pelos quais se luta, mas também para identificar exatamente ao que se opõe - a "direita".
   Esta última parte - relativa ao lado oposto - é importante, visto que ouvimos falar muito, principalmente aqui no Brasil, que a esquerda se opõe ao "fascismo"... ideia bem problemática, caso tratemos deste último conceito de modo estrito.
   Estou lendo - meio indo e voltando - o livro O que é ser esquerda, hoje?, organizado por Francisco Inácio de Almeida e publicado por uma parceria entre a Fundação Astrojildo Pereira e a Editora Contraponto. São mais de quarenta textos reunidos sobre o assunto. A diversidade dos autores faz do livro algo interessantíssimo. Escrevem, para citar apenas alguns, Roberto Freire, Luíza Erundina, José de Souza Martins, Ruy Fausto, Cristovam Buarque, Ferreira Gullar, Renato Janine Ribeiro, Sérgio Besserman, Leandro Konder e Fernando Gabeira. Só por esses nomes, já dá vontade de entrar na discussão.
   Este será apenas o primeiro de uma série de posts sobre o assunto.
  A primeira coisa que me chamou atenção foi que vários autores tratam desse "ser de esquerda hoje" como se houvesse apenas uma "nova esquerda". Achei interessante que, em oposição a essa ideia, Ruy Fausto, em "Identidades da esquerda", diz que a esquerda brasileira oscila entre três (ou quatro) posições. Ele explica que "Apesar da catástrofe que representou o caminho revolucionário da Rússia, da China, de Cuba [...], os nossos radicais continuam pregando a solução violenta", ou seja, "continuam professando um projeto revolucionário".
   Realmente, ainda vejo pessoas com esse espírito.
   E... continuo depois.

segunda-feira, 25 de fevereiro de 2019

Greta Van Fleet


   Cada vez que ouço a banda que dá título ao post fico mais impressionado com a semelhança com nosso querido Led Zeppelin.
   Quem quiser conferir um show relativamente recente, de 2018, acesse https://www.youtube.com/watch?v=WgPVKIIGymQ 
   Muuuuuito bom!!!!

A garota dinamarquesa


   Confesso que, com muito atraso, assisti ao filme A garota dinamarquesa. Não posso deixar de registrar que a estória, baseada em fatos reais, me impressionou bastante... e por vários motivos.
   O primeiro deles se refere à força do sentimento de não pertencimento ao próprio corpo da personagem principal. Penso que isso, no início do século XX, devesse ser um fardo ainda maior do que percebemos hoje. 
   Em seguida, impressionaram-me os diagnósticos e tratamentos disponíveis para o caso, à época. Coisa de causar terror. 
   Passando pela observação da dificuldade da emoção da esposa da personagem principal, submetida à dupla sensação de amor e culpa, fico refletindo sobre a novidade da cirurgia a que seria submetido o protagonista da história.
   Para quem não lembra bem, trata-se da história de Einer Wegener, casado com Gerda. Ambos eram pintores. Em determinado momento do casamento, Gerda precisa de uma modelo e usa o marido, em vestes femininas. Isso parece despertar em Einer um sentimento de prazer. E, depois, de inconformismo com sua condição masculina. Depois de algumas tentativas de "tratamento", Einer assume sua feminilidade, na pessoa de Lili Elbe. A nova condição tumultua o casamento. Mas, com apoio da (ex-)esposa, Wegener aceita submeter-se a uma cirurgia inédita de mudança de sexo, sob direção do Dr. Kurt Warnekros. Seriam três cirurgias, em sequência, a fim de capacitar Lili, inclusive, a ter filhos. Pelo menos, era o desejo dela. Após a última, ocorre uma infecção que acaba por matar a nova senhora.
   Um avanço para a época, a meu ver, foi o fato de, após a primeira sequência de cirurgias, o rei dinamarquês ter concedido a Lili a anulação de seu casamento com Gerda Wegener; bem como a mudança de seu nome, inclusive com a obtenção de uma nova certidão de nascimento e de um novo passaporte - em ambos constando como sexo o feminino.


sábado, 23 de fevereiro de 2019

O PT e a esquerda no Brasil (2)


   Ampliando um pouco o horizonte da discussão da relação da Esquerda com o PT, gostaria de aproveitar ainda a matéria já citada da revista Isto É, quando ela apresenta a opinião de alguns participantes deste campo ideológico, deixando claro o descontentamento com o partido de Lula:
   - "É a velhice da estrela. Não podemos correr o risco de cometermos o mesmo erro" (Cristovam Buarque - senador);
   - "O PT deve um momento de silêncio ao Brasil. Ao não perceber que perdeu a hegemonia no campo da esquerda, o PT obriga o eleitorado a lhe dizer isso" (Paulo Delgado - fundador do PT); e
   - "O PT não está fazendo oposição a nada. Está indo com chicanas jurídicas, com prisioneiro que acha que pode fazer ou desfazer o que quer no País. Não está preocupado com a democracia" (Roberto Freire - presidente do PPS).
    
    A declaração de Freire me parece a mais forte. E explorarei posteriormente um pouco mais sua percepção em outro post.

Ciro Gomes e o PT (2)


   Depois daquela entrevista de Ciro Gomes à Folha de S. Paulo, foi publicada uma matéria de capa na revista Isto É, em 18/11/18, com o seguinte título "Uma nova esquerda - A banição do PT - liderada por Ciro Gomes, a oposição tenta se reinventar, exclui o Partido dos Trabalhadores das negociações e o relega ao isolamento político".
   No texto, fala-se da reunião do PDT ao PSB, à Rede e mesmo ao PCdoB, para a formação desta "nova esquerda". E ressalta:
   "O pedetista [Ciro Gomes] faz questão de ressaltar que o isolamento do PT não é o objetivo do grupo. É uma consequência. 'Nossa tarefa não é de se contrapor ao PT. Mas achamos que a hegemonia pouco crítica do PT já deu. Passou da conta e fez muito mal ao Brasil. Não existiria Bolsonaro sem o antipetismo, que foi introduzido por ele".
   

Ciro Gomes e o PT

   
   Antes de tratar da esquerda como um todo, gostaria de explorar ainda um pouco mais da figura de Ciro Gomes, na sua relação com o PT. Para tanto, utilizarei a entrevista de Ciro à Folha de S. Paulo, dada em 31 de outubro de 2018, de que já falei em post anterior.
   Destaquei apenas algumas frases do candidato do PDT. Estas, de início, podem deixar transparecer uma crítica pontual, pertinente apenas às eleições de 2018. 
   1) "O PT elegeu Bolsonaro";
   2) "O lulopetismo virou um caudilhismo corrupto e corruptor que criou uma força antagônica que é a maior força política no Brasil hoje. E o Bolsonaro estava no lugar certo, na hora certa. Só o petismo fanático vai chamar os 60% do povo brasileiro de fascista";
  3) "Só essa cúpula exacerbada do PT é que já começou a campanha de agressão";
   4) "É muito engraçado o petismo ululante. É igual o bolsominion, rigorosamente a mesma coisa".
   
   Mas há um fechamento que parece mostrar que a questão é um pouco maior do que essa espécie de mágoa eleitoral com o PT, porque já trata de um realinhamento das esquerdas para o futuro.
   O jornalista Gustavo Uribe pergunta:
   - A postura do senhor não inviabiliza uma reaglutinação das siglas de esquerda?
   E Ciro responde:
   - Não quero participar dessa aglutinação de esquerda. Isso sempre foi sinônimo oportunista de hegemonia petista. Quero fundar um novo campo, onde para ser de esquerda não tem de tapar o nariz com ladroeira, corrupção, falta de escrúpulo, oportunismo. Isso não é esquerda. É o velho caudilhismo populista sul-americano.

   Pode-se notar que há críticas que ultrapassam o momento presente, referindo-se ao passado do PT - corrupção, oportunismo e populismo -, e demonstrando que o "novo campo" seria formado sem as práticas que Ciro reputa como desabonadoras da hegemonia petista no controle da esquerda no modelo tradicional.

    

quinta-feira, 21 de fevereiro de 2019

O PT e a esquerda no Brasil


   Ficou claro, já após o primeiro turno da mais recente eleição presidencial brasileira, que o PT tinha perdido alguns de seus amigos mais próximos.
   Talvez, a baixa mais importante tenha sido a do candidato do PDT, Ciro Gomes, terceiro colocado naquela ocasião.
   Para quem não lembra, esperava-se apoio declarado imediato do candidato do PDT à chapa de Haddad (PT) e Manuela D'Ávila (PCdo B) para o segundo turno. Afinal, como adversário desta estava Jair Bolsonaro (PSL), representando a "direita". Mas... Ciro não se manifestou de pronto, e ainda se ausentou do país naquele momento crucial da disputa. Em seu retorno, não fez um pronunciamento - avidamente aguardado pelos petistas -, limitando-se a dizer que explicaria, após o segundo turno, sua posição de aparente "neutralidade", digamos assim - embora ele mesmo tenha rejeitado este status.
   Passada a eleição, com vitória do candidato de direita, Ciro deu uma entrevista reveladora à Folha de S. Paulo.
   Para começar, disse que não traiu o PT, porque não tinha empenhado a palavra em apoiá-lo. Contudo, mais complicado foi dizer "Não declarei voto ao Haddad porque não quero mais fazer campanha com o PT".
   Poder-se-ia dizer que o extremamente autêntico - às vezes, até demais - candidato tivesse como motivação principal a mágoa em relação ao PT na condução da indicação da candidatura à Presidência. Primeiro porque o PT insistiu em lançar Lula como candidato - mesmo este estando preso -, em detrimento de reunir a esquerda e indicar o próprio Ciro. Depois, porque o PT tentou minar a candidatura de Ciro, assim que ele rejeitou o convite para compor, como vice, a chapa de Lula, "convencendo" o PSB a não apoiar a candidatura própria de Ciro à Presidência.
    Fato é que, mesmo após o fim das eleições, Ciro se manteve afastado do PT. Por isso, ao se desenhar uma nova oposição de esquerda, a ser liderada pelo próprio Ciro, o maior partido deste campo político foi afastado da composição. 
   Mas será que apenas Ciro decidiu se afastar do PT? E seria isso motivado apenas por esta eleição de 2018?
   Depois continuamos...

quinta-feira, 14 de fevereiro de 2019

Ideologia (2)


   Antes de tratar do conceito de "ideologia" como o percebemos rotineiramente hoje em dia, gostaria de registrar que sempre penso em algum termo que possa exprimir melhor a essência do mesmo. Gosto de "idealidade", sugerido, sem grande explicação, por Emmanuel Renault, em seu Vocabulário de Karl Marx, justamente no verbete "Ideologia". 
   Vejamos seu texto no verbete em questão, com grifos meus.
   "Ao conceber a ideologia como 'a linguagem da vida real', o objetivo de Marx é explicar as IDEALIDADES por seu contexto histórico [...]. O conceito de ideologia é, com efeito: a) o do condicionamento das IDEALIDADES por interesses materiais; b) o da dimensão política da consciência e da teoria (as idealidades aparecem como meio de garantir a dominação de uma classe sobre outra [...]". 
   Há uma sequência, com mais dois significados, para, depois, ser apresentado um resumo: "Logo, a ideologia pode ser identificada às ideias dominantes no sentido das ideias dominantes numa determinada época, no sentido das ideias que produzem uma dominação e no sentido das ideias que justificam uma dominação".
   Ou seja, "ideologia" estaria associado a um conjunto de ideias... que poderíamos traduzir melhor como "idealidade". Pelo menos, é o que penso.

Ideologia


   Sempre me incomodou muito o conceito de "Ideologia"... mas de uma maneira distinta daquela que alguns teóricos sentem. 
   Meu incômodo é essencialmente etimológico. 
   O que é Biologia? Simplificadamente, é a ciência que tem por objeto os seres vivos (bios). O que é Psicologia? Resumidamente, é a ciência que tem por objeto a mente/alma (psyche). E por aí vai...
   Temos sempre um objeto que é estudado e explicado por um discurso (logos), o que poderia ser pensado como um saber organizado ou uma "ciência". 
   Então, o que seria Ideologia? Seria a ciência das ideias. 
   Mas é isso? Lógico que não é assim que percebemos o conceito de "ideologia" hoje... porém, já foi.
   Anthony Giddens dá a seguinte explicação:
  "O conceito de ideologia foi usado pela primeira vez na França ao final do século XVIII para descrever uma suposta ciência das ideias e do conhecimento - uma ideia-logia. Nesse sentido, a ideologia deveria ser uma disciplina próxima da Psicologia [...]. Nas décadas de 1930 e 1940, Karl Mannheim tentou recuperar essa ideia em sua Sociologia do Conhecimento, que associava modos particulares de pensamento às suas bases sociais".
   A versão "neutra" do conceito de "ideologia" não se tornou o mais aceito. Ficamos, então, com a categoria marxiana de "ideologia"... motivo para outro post.
   

quinta-feira, 10 de janeiro de 2019

Cervejas "comerciais"


   Os que gostam das cervejas "comerciais" - aquelas que incluem o milho - normalmente falam que apreciam só as do tipo pilsen. Mas... há que registrar que pilsen é um tipo de cerveja que pertence à família Lager (a outra família é a Ale), mas também seria "puro malte". 
   As cervejas "comerciais" com que estamos acostumados são, na verdade, do tipo "Standard American Lager".
"Cervejas do estilo American Lager são leves em cor e corpo, têm baixo amargor e costumam ser neutras, refrescantes e bem carbonatadas. O sabor é sutil (ou seja, nenhum ingrediente pode dominar os demais). Há um dulçor residual de malte e adjuntos e outras fontes de açúcar podem ser utilizadas."

Puro malte é necessariamente melhor?!?!


   Até alguns anos atrás, o brasileiro bebia só Antarctica, Brahma, Skol, Itaipava... e algumas populares menos conhecidas. De uns tempos para cá, cervejas mais elaboradas - primeiro importadas, depois produzidas artesanalmente por aqui - passaram a encher nossos copos. 
   Uma questão que surgiu logo foi a da pureza. Ficamos sabendo que nossas cervejas "comerciais" eram produzidas com milho e arroz - os chamados "cereais não maltados" -, em vez de somente malte, ou cevada maltada. Logo surgiu a ideia da superioridade das cervejas "puro malte"... endossada pelos "beerchatos". Mas será que isso é necessariamente verdadeiro?
   O mestre cervejeiro da Ambev há quatorze anos, Luciano Horn, explica que "o milho entra na receita para acrescentar leveza e refrescância".
    Acrescentando mais uma informação: a Wäls, cervejaria artesanal mineira, produziu uma India Pale Ale com xarope de milho, batizada Hopcorn IPA, a qual foi medalhista na Copa do Mundo das cervejas de 2017.
   Uma pergunta surge naturalmente: é o milho que "estraga" as cervejas "comerciais"?
   Depois deste último comentário sobre a Hopcorn IPA, acho que não podemos responder culpabilizando o pobre do milho. Talvez, seja uma combinação perversa - para o milho -, que inclui a qualidade dos outros componentes ou, até mesmo, um uso excessivo - e abusivo - da quantidade deste cereal.
  Portanto, não há que dizer que as puro malte são NECESSARIAMENTE melhores... afinal, mesmo os cervejeiros "antimilho" gostam de misturas, como as Witbier (com coentro e limão, por exemplo), as Weiss (de trigo) ou aquelas com aveia, etc.
   

Para que se vota em alguém? (4)


   Seguindo...
   3) Votar em pequenos partidos pode influenciar as políticas levadas a cabo?
   Segundo o Luís, apenas marginalmente. 
   Nesse ponto, concordamos integralmente. Aliás, isso passa por outra questão muito discutida no âmbito da reforma política, que são os chamados partidos "nanicos". No Brasil, havia grandes vantagens em ter um partido funcionando. Quanto mais representativos, mais dinheiro os partidos recebiam do Fundo Partidário. Até aí, tudo bem. Só que mesmo aqueles que tinham pouquíssimas vagas - ou até nenhuma - recebiam uma quota mínima. 
   Além disso, ainda há a possibilidade das coligações, o que acaba por permitir que os pequenos partidos negociem seus tempos gratuitos nos meios de comunicação com os partidos maiores. 
   Aliás, a questão da coligação é algo que me causa arrepios, pelo menos no modo como ela é realizada por aqui.
   Sigamos para uma questão que deixei propositalmente por último, porque acho bem delicada.
   1) Ao votar, escolho a política que vai ser seguida?
   Segundo Luís, "não". Isto porque o mandato não é imperativo. Ou seja, o candidato pode defender uma coisa antes da eleição, mas, após a eleito, votar em outra.
   Concordo que esse seja um problema real. Cheguei a dizer que talvez fosse interessante podermos utilizar o mecanismo do recall para os agentes políticos que praticassem essa espécie de "estelionato eleitoral". Também já sugeri que o enfraquecimento dos partidos acaba facilitando esse tipo de comportamento. Isto porque, devo lembrar, votar contra instruções do partido pode caracterizar o que se chama de "infidelidade partidária", que pode causar punição ao político filiado. Reforçando, então. Caso os partidos tivessem mais peso real, a candidatura chancelada por um deles garantiria uma série de compromissos com valores compartilhados por todos seus filiados, bem como pelos seus eleitores.
   Mas há algo que precisa ser dito também. A representação política é diferente de uma representação civil. Quando eu registro uma procuração para um amigo me representar em algum ato civil - a venda de um imóvel, por exemplo -, o objeto da representação é bem definido. No exemplo dado, meu amigo não poderia vender meu carro, visto que a representação concedida não alcançava este objeto. Só que a representação política não funciona assim. Não se concede uma procuração com objeto fixado. A representação concedida alcança objetos que já fazem parte do programa do partido, isto é, que já são conhecidos de antemão, mas também decisões sobre assuntos que sequer são considerados no momento da eleição. Isto é, pode ser apresentado um projeto de lei visando regular algum tipo de assunto que interesse à sociedade como um todo, mas que não foi pensado inicialmente por nós, eleitores. Nosso político eleito para o Legislativo precisará apresentar seu voto. Dependendo do assunto, ele poderá desconhecer totalmente nosso desejo. Novamente, ressalto que um partido forte poderia consultar suas bases, a fim de revelar o desejo dos seus eleitores. Mas não é isso que acontece sempre. E, quanto mais técnica for a questão, menor será o grau de consulta.
   Portanto, há que se reconhecer que a representação política guarda esta peculiaridade, e lidar com ela. Mas... reconheço que há problemas com isso, principalmente quando as matérias estão bem definidas no programa partidário ou foram suficientemente apresentadas no momento da campanha à eleição.
   Mas vou deixar uma provocação aqui, que diz respeito àquela famosa "herança maldita", de que tanto ouvimos falar. 
   Vamos supor que, numa avaliação prévia, o partido e o candidato digam que não aumentarão os impostos se ganharem a eleição para um cargo no Executivo. Ao conquistar o cargo, o eleito percebe que houve uma "contabilidade criativa" do governo anterior e que as contas não estão tão saneadas quanto se apregoava. Sua equipe faz as contas e verifica que... tem que aumentar os impostos. E agora? Manter a promessa ou não?
   Está aí mais material para nossa discussão.